26. birthday, Dahl

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AVISO: Menção à tentativa se suicídio.

Mais uma vez, o show era furada. Øystein ligou para o dono da casa de festas para confirmar se haveria e o cara disse que não fazia ideia do que ele estava falando, essa não foi a primeira vez nem a última que isso aconteceu. Eu via a inocência nos olhos de Pelle ao acreditar toda vez que Aarseth falava que haveria um show, enquanto isso eu não aguentava mais aquela positividade que não levava a lugar nenhum.

Estar naquela casa era como estar de volta no hospital psiquiátrico, o tempo parecia não passar ao mesmo tempo que passava rápido demais, durante a noite aqueles sentimentos agoniantes voltavam à minha mente e eu me sentia sozinha mesmo estando com várias pessoas próximas a mim.

A diferença era que nas primeiras semanas eu não sabia quem eu era. Tudo aconteceu depois de um acidente, me disseram que me joguei de um tronco de uma árvore, mas na minha memória eu havia batido o carro do meu pai numa árvore propositalmente. Passei quase duas semanas em coma até acordar e não saber quem eu era, as memórias voltavam aos poucos em pequenos flashes e dor de cabeça, aquele período pareceu um sonho estranho e quanto mais eu tento me lembrar, tudo parece mais confuso ainda.

A passagem do tempo ainda era tão confusa para mim que, em um dia que acordei à tarde, encontrei Jan na sala de estar tomando um café, tudo que ele me falou foi: "Ah, feliz aniversário Alex".

E tudo que eu consegui responder foi: "Já é julho?". Já era dia 2 de julho de 1989, eu estava fazendo 20 anos, logo logo faria um ano que eu estava na Noruega. Era estranho pensar que quando me juntei a banda, eu havia feito 19 anos havia pouco tempo.

A casa estava vazia, nenhum sinal de Pelle ou Øystein, sequer fiz questão de perguntar para Jan. Comi algo antes de voltar para meu quarto, os dias sem ensaio eram tediosos e longos, mesmo que fosse meu aniversário, não havia nada de especial, mas fiquei atenta ao caso do telefone tocar, mesmo que eu soubesse que raramente iria acontecer, Melina só me ligaria se conseguisse ir até a casa de uma amiga e meus pais decidiram que nunca mais falariam comigo.

A esperança de que lembrassem se esvaiu quando o sol finalmente se pôs, nem Irene havia tocado na minha porta, será que o único a se lembrar era Jan?

Tudo que me restava era tomar meus remédios, ver algo na TV e dormir novamente. Eram 22h30 da noite, o sol se pôs particularmente cedo naquele dia para um dia de verão - 10 minutos antes do horário atual, estava passando um filme de terror qualquer na televisão, me deitei na sofá para assistir e não percebi que acabei adormecendo até sentir uma mão gelada me balançar suavemente.

Acordei assustada, parecia que eu havia dormido por horas, mas o relógio entregava que se passaram apenas 20 minutos, olhei para o dono da mão, o cabelo loiro quase angelical iluminado pela TV entregou quem era, Pelle se sentou no espaço que sobrava entre meu corpo e a ponta do sofá.

"Está cansada?", sua voz soou suave por cima do barulho da TV, ele passou seus dedos pelo meu rosto, tirando algumas mechas da frente do meu rosto, senti meu coração se acalmar enquanto eu olhava no fundo dos seus olhos. Como alguém tão angelical poderia ser tão diabólico?

"Não... Eu só cochilei", tentei me sentar, mas o jeito que ele estava sentado me impedia. Estava tudo tão calmo que se quer parecia a mesma casa.  "Por onde esteve?".

"Vamos sair", ele ignorou minha pergunta. Se levantou e esticou a mão para me ajudar a levantar, caminhei até meu guarda-roupa e ele se sentou na minha cama. "Aquele seu vestido preto é bonito".

"Para onde vamos?", perguntei olhando para as minhas roupas.

"Vamos jantar", minhas orelhas levantaram, ele estava me chamando para um encontro? Procurei pelo vestido e pedi para que ele saísse do quarto. Tentei o meu melhor para parecer mais bonita, até mesmo passei um pouco de maquiagem. Saí alguns minutos depois, ele estava sentado no sofá e sorriu ao me ver.

A ideia de ter um encontro era excitante, eu havia estado em poucos encontros, quase nenhum para falar a verdade, meu coração rodopiava com a ideia, queria poder ligar para Melina e falar "ele me chamou para um encontro!" e falar com ela por horas sobre isso. Minha animação sumiu quando descemos do prédio e Jørn e Øystein nos esperavam na frente do carro de Stubberud, era claro. Eu dei um sorriso ao perceber a minha ingenuidade e eles levaram como um elogio.

"Bom, vocês ainda não me disseram para onde vamos", eu falei durante o trajeto, eles se entreolharam e riram.

"Você vai gostar", Jørn disse enquanto dirigia.

E eles estavam certos, eu gostei. Era um restaurante ao céu aberto cheio de árvores enroladas em pisca-piscas, a nossa mesa era grande e tinha muitas pessoas, até mesmo Jon que estava morando em Sarpsborg estava lá, fiquei feliz deles todos lembrarem de mim, tudo que eu podia fazer era sorrir.

"Passamos o dia fora para tentar achar um lugar e arrumar isso", Pelle falou para mim. "Mas... Anh... Tem algo faltando", olhei para ele confusa, ele me pediu para que eu fosse me sentar que logo logo voltaria.

Recebi parabéns e abraços, mesmo que não tivesse sido chamada para um encontro nem tivesse recebido parabéns dos meus pais, estava feliz. Mas algo que eu não esperava aconteceu, senti um toque no meu ombro, quando me virei para ver quem era, comecei a chorar. Melina me abraçou e sussurrou um Feliz Aniversário no meu ouvido, eu a abracei como se ela fosse sumir caso a soltasse.

"Como fugiu deles?", perguntei.

"Eu sou maior de idade agora, lembra?", Melina havia feito 18 em abril, na minha cabeça ela ainda tinha 14 anos.

Não percebi quando comecei a chorar, eu só estava em prantos a abraçando enquanto ela acariciava meu cabelo, era tão bom sentir o conforto do abraço dela novamente. O resto da noite foi melhor do que eu esperei, bebíamos e dançávamos, o bolo era grande, era branco com "aniversário, Dahl" escrito em vermelho nele.

"Faz um pedido Lexy!", Melina me disse antes que eu apagasse as velas.

Quero ser feliz assim sempre.

Jørn me encontrou fumando num canto quando a festa já estava acabando, acendi seu cigarro antes dele falar algo. "Está gostando?".

"Pra caralho, essa foi a melhor festa de aniversário que já tive", eu ri. "Achei que tivessem esquecido".

"Foi meio impossível esquecer, Pelle nos lembrava disso a cada 10 minutos na ultima semana, a ideia disso tudo foi dele", me mexi meio desconfortável ao lembrar que eu achei que Pelle me levaria à um encontro. "Aconteceu algo?", Jørn parece ter percebido, eu ri.

"Anh, não fale isso para ele, tá bom?", dei uma tragada no meu cigarro antes de falar. "Achei que ele me levaria à um encontro ou algo assim", eu ri novamente da minha própria tolice, Jørn olhou para algum ponto no horizonte.

"Você sabe que ele gosta de você, não é?", eu não tinha certeza. "Talvez você devesse o chamar para sair, Pelle é muito tímido para isso".

"E se ele recusar?".

"Então eu digo que ele está sendo idiota", eu ri. "Alex, você é bonita e legal. Não é igual todas aquelas groupies que tentam se aproximar apenas para ter uma noite conosco e depois espalhar para os amigos", eu o ouvia atentamente. "Pelle gosta muito de você, se ele recusar isso, provavelmente estará com medo de estragar tudo com você".

"Obrigada, Jørn", eu o abracei.

QUARTZ EYES, per ohlin (PT-BR)Onde histórias criam vida. Descubra agora