July

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"Feels like a lifetime
Just trying to get by while we're dying inside
I've done a lot of things wrong
Loving you being one, but I can't move on."
— July, Noah Cyrus.
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Quando volto para o salão, uma música envolvente ecooa dos alto-falantes. Procuro Sophie com os olhos e enxergo o rabo de cavalo loiro pulando no meio da pista de dança.

—ASTY!!! Vem dançar! — agarra meu pulso e me gira. Merda, estou ainda mais tonta agora.

— Soph, eu quero ir embora — digo me aproximando do ouvido dela.

— O que? Desculpa querida não te ouvi — ela grita, sinalizando com os dedos.

— Eu quero ir para casa! — digo mais alto e dessa vez ela parece entender porque torce os lábios e revira os olhos, mas mesmo assim me segue para longe de todos os corpos suados pulando.

Eu sou realmente grata por tê-la. Nós podemos ser diferentes, ela pode querer me dar lição de moral mais do que eu gostaria mas Sophie é uma amiga fiel. Muitas garotas que conheço simplesmente deixariam a amiga ir embora, pegar um táxi ou andar até o metrô sozinhas. Só para poder continuar com a própria diversão.

Quando cheguei à Roma não conhecia ninguém, meu pais se mudaram para Portugal para poder me visitar com mais frequência, — praticamente uma vez à cada dois meses — mas senti que tinha que fazer isso sozinha. Passei a vida inteira debaixo das asas deles. Por um lado era bom, a parte da proteção e tudo mais, só que isso também significa ser controlada.

Por mais estressante ou solitário que possa parecer, foi como suspirar depois de muito tempo prendendo a respiração. Depois de algum tempo aqui, encontrei Sophie, Marina e Beatrice e elas se tornaram a minha família.

— Entããoo...? — ela começa mas acho que percebe que algo está errado porque simula fechar a boca em zíper. E então só seguimos em silêncio por alguns metros até encontrarmos um táxi.

Quando chegamos em casa Trice e Mari não estão pela sala e tudo está escuro. Subimos e nos separamos, cada uma para o seu quarto. Mal acabei de voltar do banheiro e estou esfregando um lencinho demaquilante nos olhos quando Sophie bate uma vez e entra. Ela nunca espera autorização, às vezes me pergunto se ela sabe que esse é o objetivo de bater antes. Acho que ela pensa que é só para avisar que já vai entrar de qualquer forma.

— E aí? Vai me contar o que rolou? — ela senta na minha cama com as pernas cruzadas e agarra uma das minhas almofadas.

— Eu fodi com tudo Soph, de verdade — deito a cabeça em suas coxas e ela começa um carinho acolhedor.

Cafuné.
Lembro da palavra em português. Adoro isso, o fato de nenhum outro idioma ter uma palavra para descrever esse carinho como nós temos.

Conto tudo à ela, com o máximo de detalhes que consigo lembrar com minha mente enevoada de bêbada. Sophie, entretanto, parece bem — "alegrinha" é seu estado rotineiro — ela tem uma alta resistência à álcool e sempre cuida de nós quando é necessário.

— Você está brincando comigo? Pode me dizer, em nome de Deus, como Victoria estar no meio das pernas de outra é culpa sua? — Sophie exclama indignada.

— E-Eu... — penso por um momento mas também não sei o que dizer. — Não é sobre isso que eu estava falando S. Eu beijei Damiano. Na frente dela.

— Pois eu acho que fez bem. Ela seguiu em frente, você mostrou que também seguiu.

— Que parte de "Eu não segui em frente, ainda estou dolorosamente apaixonada" você não entendeu? — Sophie suspira e parece organizar mentalmente o que vai falar.

— Olha, pessoas emocionalmente saudáveis diriam que usar uma pessoa, ou várias, para esquecer alguém é errado. Mas por experiência própria: Se existe método melhor, eu ainda não encontrei!

Quando eu rolo os olhos ela continua:
— É sério! Já ouviu Supercut da Lorde? — Sophie sempre tem uma referência de cultura pop para introduzir aleatoriamente na conversa — É uma teoria cientificamente comprovada. — duvido bastante, mas guardo o comentário para mim mesma — Quando a gente termina, na cabeça fica passando um filminho. Só dos nossos melhores momentos com a pessoa. Quando na verdade, o relacionamento foi muito mais que isso. Ás vezes teve até mais momentos ruins do que bons, mas não enxergamos isso.

Mordo o lábio inferior e reflito por um instante. Até que faz sentido. O cafuné dela começa a me dar sono e bocejo para fugir de ter que responder algo.

— Você quer dormir aqui? — pergunto jogando o lenço na lixeira e pegando um cobertor. Minha cama é grande o suficiente para duas pessoas dormirem confortavelmente.

— Deus me livre, você se mexe a noite toda — eu dou risada e Sophie se levanta em um pulo, me abraça apertado e me deseja uma boa noite.

Minha amiga mal bateu a porta quando meu celular começa a vibrar. O nome na tela diz "Vic" com um coração do lado. Tenho que trocar isso. São três da manhã, estou morrendo de curiosidade mas não atendo.

Conheço Victoria, sei que se eu não atender ela vai mandar uma mensagem que vai me dar uma pista sobre o que ela quer conversar. E eu preciso ter uma noção e me preparar antes para uma conversa com ela.

E logo as mensagens chegam

Astrid?
Achei q tinha te avisado sobre Damiano.
Quer dizer, ele não é para você, sabe?
Eu conheço ele e te conheço, vc só acabaria se machucando.
Vc é... emocional demais, ele vai te quebrar.
Esquece ele tá?

Minha primeira reação foi raiva. É a segunda vez em uma semana que ela se refere à mim como se fosse a pessoa mais frágil do mundo. Por muito, muito tempo guardei meus sentimentos para mim mesma. E posso dizer que sempre fui muito boa nisso. Se gostava de alguém, se não gostava de alguém, se estava triste, desapontada ou frustrada ninguém sabia.

Com algumas pessoas me sentia mais confortável e baixava a guarda. Então sim, Victoria me viu chorar. Coisa que geralmente só me permito fazer quando estou sozinha na segurança do meu quarto. Porque confio nela. Ou confiava.

Não estou pensando direito. De novo. Desbloqueio o celular e começo a digitar raivosamente.

A minha vida n é mais da sua conta, Victoria
Na verdade, segundo vc, nunca foi né?
Eu que confundi as coisas

As palavras doem em mim, mas tenho que me acostumar com a ideia que se torna cada vez mais real, ela nunca foi minha.

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"Parece uma eternidade
Tentar continuar enquanto estamos
morrendo por dentro
Eu fiz várias coisas erradas
Amar você foi uma delas,
mas eu não consigo seguir em frente"

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