Capitulo Cinco

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- Olha quem vem para a cidade... O circo! - ouvi a voz do meu pai da cozinha. Não podia ser. Meu coração ficou acelerado, minhas pernas balançaram e minha garganta ficou seca.
- Como é papai? Quando eles vêm?
- Antes do natal, você se lembra, Michael?
- Sim! Claro que lembro, e nós vamos de novo esse ano, não é?
- Não está grandinho demais para isso?
- Qual é pai, vai dizer que circo é para crianças? - ele negou rindo.
Corri pro meu quarto e comecei a arrumar minhas coisas.
Não sabia por quanto tempo iam ficar na vila, então tinha que estar preparado. Iria falar com algum adulto, explicar minha situação e tudo. Se eles me aceitassem, iria contar a meus pais.
Coloquei minha bolsa escondida na carroça, para meu pai não desconfiar.

- Pegou o casaco, Sarah?
- Peguei, vamos mãe?! - entramos todos na carroça e fomos.
Estava realmente muito ansioso. Criava as expectativas de que ela poderia estar lá. Mas tinha que acordar, podia ser outro circo, ela poderia não estar lá, ou simplesmente não se lembrar.
Será que ela também ficou pensando em mim depois? Decidi parar de pensar nisso, só ia encher minha cabeça de coisas.

- RESPEITÁVEL PÚBLICO... - a mesma voz disse ao microfone. Mais velho, mas sabia que aquele era o mágico Covalski, eu lembrava dele! Meus olhos eram atentos a tudo. Um sonho de infância estava bem na minha frente outra vez, e estava muito feliz. Mas querendo ou não, era ela quem eu queria ver.
Passou-se o mágico, os palhaços, malabaristas, equilibristas e domador. As apresentações estavam diferentes e mais bem elaboradas do que antes. Logo vieram as bailarinas. Meus olhos brilhavam e eu tentava olhar no rosto de cada uma. A dança era calma e bonita, cheia de rodopios e pulos. Nada de identificar Katherine, mas eu sabia que ela estava ali, eu tinha certeza. Ela só não estava reconhecível depois de dez anos.

O espetáculo acabou. Sarah adorou tudo, era muito nova e não lembrava direito. Todos foram indo embora e papai foi para loja com mamãe e Sarah. Informei de que ia dar uma volta antes de ir trabalhar.

- Quem é você?
- Que susto! - pulei para trás. Achei que fosse ela mesma, mas era uma meninazinha. Ela tinha o cabelo preso e a reconheci, era uma bailarina.
- Desculpe - ela disse envergonhada.
- Você conhece a Katherine?
- E você a conhece? - ela levantou a sobrancelha.
- Pode me levar até ela?
- Não sei, não devo falar com estranhos, muito menos levá-los para dentro dos trailers.
- Então vá chamá-la, preciso muito falar com ela.
- E você a conhece, por um acaso? - ela colocou a mão na cintura.
- Eu preciso falar com ela, você pode fazer esse favor? - perguntei doce, ela sorriu e foi correndo.

Katherine //
Ouvi passos rápidos e batidinhas fracas na porta de meu trailer.
- Wanda! Cuidado pra não cair!
- Katherine, tem um moço querendo falar com você lá fora.
- Um moço?
- É, ele disse que era pra eu te chamar aqui.
- Você está falando com estranhos, Wanda? Não acredito! O que a gente de ensinou? Ele deve estar de brincadeira, vem, vou te levar pro quarto - disse tentando colocá-la no colo.
- Não! - ela afastou minhas mãos. - Ele disse o seu nome, ele te conhece, ele sabe quem é você.
- Sério?
- Vem, vou te levar até lá. - ela pegou na minha mão e foi andando. Será que poderia ser?
Katherine off//

De longe pude ver seu cabelo ao vento. Seus olhos brilhantes. Suas pernas definidas. Seu andar elegante na ponta do pé. A pequena menina vinha ao lado, puxando-a pela mão.
- Esse é o moço que diz te conhecer, agora eu vou jantar. - ela disse e saiu correndo.
- Oi! - disse tímido.
- Oi, er...
- Michael! - completei. Espera ai, ela não me reconheceu?
- Isso, Michael ... - ela colocou uma mecha pra trás da orelha e arregalou os olhos - Ai meu deus, Michael?
- Eu mesmo.
- Michael Michael? Aquele menininho que queria vir com a gente? - concordei com a cabeça. - Nossa! Você cresceu! Ficou maior do que eu!
- Passaram-se dez anos, Katherine.
- Poxa, dez anos... - ela olhou pensativa pro chão. - Então, quantos anos tem agora?
- Dezoito, e você vinte e dois.
- Isso mesmo... Já desistiu do sonho bobo de criança? - meu pequeno sorriso que estava ali sumiu. Olhando de perto, aqueles olhos nem brilhavam tanto assim.
- Bom, primeiro que não é bobo e nem de criança. Conhecer o mundo não tem nada de criança nele... - não sei se fui um pouco grosseiro. - Mas eu comecei a ter outras prioridades, e resolvi trabalhar, mas sempre juntando dinheiro para sair da vila.
- Então ainda quer viajar com o circo?
- Achei que fosse lembrar da sua promessa. - ela fez cara de confusa na hora. Ela abriu a boca e a fechou para falar algumas vezes, mas não saiu nada. - Você me prometeu voltar pra me buscar quando fosse maior, porque ai eu teria idade para escolher sair de casa.
- Ah, Michael, foi uma palavra boba de criança.
- Promessa é promessa, não importa quem a faça. Você deu uma palavra.
- Michael, você tem dezoito anos, não vou me responsabilizar.
- Eu não pedi isso.
- Hey! Quem é esse rapaz?
- Ninguém, Covalski, ele já estava indo embora.
- Não, eu não estou indo embora. Sou Michael, Michael Wolksh.
- Prazer, Michael, sou Covalski, só Covalski. O que faz aqui?
- Bom, meu sonho sempre foi viajar pelo mundo e desde criança que quero viajar com o circo.
- Então você quer entrar para a família? - concordei. - Então verei o que posso fazer por você, meu rapaz.
- Não! Ele tem dezoito anos! Não pode abandonar a família dele aqui, e além disso, nosso circo já tem muita gente, e ele não sabe fazer nada, é inesperiente e...
- Katherine, não precisa me dizer tudo isso, eu sei bem sobre essas coisas, se você se lembra, alguém que também não sabia nada e era jovem entrou no nosso circo. - ela abaixou a cabeça. Mas eu sabia que não se tratava dela.
- Obrigada Covalski, você não tem noção do quanto isso é importante para mim.
- Venha, vamos conhecer o pessoal.
- Covalski! Ele é um estranho! E se ele não for legal ou qualquer coisa?
- Katherine, eu sei o que estou fazendo.
Andamos um pouco e a cada pessoa que passávamos, ele dizia quem eu era e conheci várias pessoas. Todas muito simpáticas, sorridentes e coloridas.
- Venha jantar conosco para todos te conhecerem melhor. Você fala da sua vida, família, passado, presente e futuro, e amanhã te digo se você entra ou não.
- Certo. Venho que horas?
- Quando acabar a próxima apresentação.
- Certo, eu vou pro centro e volto para o jantar. Obrigada.
- Por nada, meu rapaz.
- Tchau, Katherine - disse dando um beijo na bochecha dela.
- O que é isso menino? - ela me empurrou de leve e eu sorri pra ela, brincando. Mas por dentro, estava muito triste. A mulher dos meus sonhos, da minha vida, estava me rejeitando. Ela não queria que eu entrasse.

- Pai? Mãe? Sarah?
- Oi Michael! - escutei eles responderem.
- Preciso conversar com vocês. - Sentamos os quatro nos fundos da loja, fechamos a porta por enquanto.
- Diga filho, você está me deixando nervosa! - minha mãe disse.
- Bom, todos vocês sabem e sempre souberam que eu sempre quis conhecer o mundo.
- Michael Wolksh, lá vem você de novo com essa história? Você está com dezoito anos e tem uma loja para tomar conta, não tem tempo de estar se preocupando com sonhos bobos! - meu pai falou grosso antes de eu começar.
- Não importa para mim uma palavra do que o senhor disse. Eu conheci um pessoal do circo e vou jantar com eles hoje à noite, se eles me aceitarem, partirei em cinco dias quando eles forem embora. Tenho um dinheiro que guardo há muito tempo, dinheiro suficiente para algum tempo. Também já comecei a arrumar minhas malas e tenho tudo organizado.
- Michael, meu filho, você está dizendo que vai nos deixar?
- Mãe, eu nunca vou deixar vocês, vocês vão estar sempre no meu coração, eu amo vocês três.
- Então por que vai embora? - Sarah estava com os olhos vermelhos e braços cruzados. Ela ia chorar e estava com raiva.
- Porque existem coisas maiores lá fora e eu quero vê-las.
- Você vai trocar sua família por "coisas"? - meu pai continuava grosso.
- Nunca trocarei vocês por nada, só quero viver meu sonho, ganhar o meu dinheiro fazendo algo que eu gostasse de fato.
E aquele silêncio se instalou. Meu pai se levantou e arrancou o colar com a chave do meu pescoço e saiu. Abriu a loja e ficou atrás do balcão. Minha mãe correu para o depósito chorando e minha irmã me olhava com raiva. Dei um beijo no topo de sua cabeça e me levantei, andando até a carroça.
Fui para casa, tomei um banho, coloquei a melhor roupa e terminei de arrumar uma segunda bolsa, colocando dentro da carroça. Despedi-me de todos os animais, do poço, da casa e da plantação. Tudo isso aqui foi minha história e sentiria falta de tudo.
Entrei na carroça e rumei à cidade.

Continua...

A Bela BailarinaOnde histórias criam vida. Descubra agora