Me tornei a princesa da Lua!

Capítulo 1 - Encontro com a Morte

Eu morri. 

O som dos ossos do meu pescoço quebrando foram o aspecto mais desesperador. Em resumo, dor e desespero de início. No fim, apenas silêncio e escuridão. Quando estava prestes a morrer todas as minhas células, cada partícula do meu corpo sabia que era o fim, era possível sentir. Foi tudo muito rápido: a queda, a dor, a vida. Minha vida foi extremamente curta, apenas 21 anos sem muitas realizações, pouco dinheiro e um diploma no bolso. Porém nada mais importava.

Em meio ao silêncio e escuridão eu sentia a minha existência pairar lentamente em uma imensidão de "nada". Aos poucos meus sentimentos e sentidos foram sumindo, assim como as preocupações e os pensamentos. Ausente de pensamentos, minha mente e minha existência estavam vazias. Acredito que o chamamos de "paz" era o que tomava a minha existência naquele exato momento. 

Não sei quanto tempo permaneci nesse estado, pois nem mesmo o tempo existia nesse lugar. Lentamente passei a sentir algo me atraindo. Aos poucos minha existência era puxada por uma força. Passei a sentir novamente. Era como se eu estivesse deitada em um chão frio. Demorou um pouco e pude finalmente sentir e enxergar ao meu redor.

Eu podia me ver mas não havia nada a minha volta. Não havia luz, mas eu enxergava nitidamente a mim mesma. Não havia chão, mas eu estava deitada em alguma superfície. Me levantei. De repente eu vi. Parada a minha frente estava a Morte.

"Olá!" eu disse. Eu já não tinha sentimentos, portanto ao me deparar com o ilustre ser do qual todos tememos em vida eu não esbocei nenhuma reação. A Morte não tinha olhos, boca, nariz nem orelhas. Tinha a forma de um ser humano, porém era isento de qualquer aspecto da humanidade. A verdadeira representação do fim e do início, essa era a Morte.

"Cara alma que aqui jaz, solicitei uma audiência com singela existência para tratar de bonificações por atos realizados em vida. Poderás escolher por dois caminhos. A escolha deve ser única e  irrefutável. Será dita apenas uma vez, não podendo ser revogada ou alterada." me disse a Morte.

"Atos realizados em vida? Poderia me dizer quais foram?"

"Cara alma que aqui jaz, cuja bondade amparou e contribuiu para o desenvolvimento da fé e esperança em jovens humanos. Os céus resolveram bonificá-la por mudar o destino de humanos fadados ao fracasso e desespero. Os atos realizados em vida já foram esquecidos assim como qualquer outro aspecto mundano. Cabe a ti apenas aceitar de boa vontade o que os céus tem a lhe oferecer".

Assim que a morte terminou de falar percebi que aos poucos as memórias de minha vida estavam sumindo. Eu já não sabia meu nome ou lembrava de alguém querido. Porém não senti tristeza, pois os sentimentos também se foram. 

"Aceito de boa vontade o que os céus tem a me oferecer" eu disse.

"Cara alma que aqui jaz, após a morte mundana as almas são restauradas ao nível mais simples de existência, desprovidas de sentimentos, memórias ou consciência. São preparadas para a próxima vida que lhes será atribuída. Seria este o trajeto normal de qualquer alma humana após a morte." e continuou...

"Cara alma que aqui jaz, desviou do caminho comum das outras almas e terá o privilégio de escolher o novo destino pelo qual sua existência seguirá para uma nova vida. Apenas dois caminhos são possíveis, podendo apenas escolher um deles. Poderá seguir diretamente para o reino dos céus e descansar em paz eternamente, dando fim e descanso eterno a sua existência, de forma que nunca mais experimentará dos sofrimentos e desafios da vida humana. Ou poderá escolher um mundo de sua escolha para renascer e experimentar novamente todos os aspectos da vida, desde o nascer e o morrer."

Eu só tinha duas escolhas. Escolher entre finalmente dar descanso a minha alma ou escolher renascer, sofrer, viver e morrer novamente no mundo que eu quisesse. Passei a buscar no fundo da minha existência algo que pudesse me ajudar a decidir. Minha morte foi precoce e apesar de já estar desprovida de sentimentos eu sentia um singelo rastro em minha existência da vontade de viver. Mas onde viver? Para qual mundo eu escolheria ir? 

Fechei os olhos por um momento. A visão de um castelo na lua, visto em um desenho animado em minha infância tomou minha mente. Já não era possível lembrar o nome do lugar ou qual era o nome da princesa que lá morava. A visão do planeta Terra na imensidão do céu acima do castelo da lua foi preenchendo a minha existência.

"Posso escolher qualquer mundo? Mesmo que ele não seja real?" eu perguntei para a Morte.

"Cara alma que aqui jaz, tu possui singelo conhecimento sobre a real existência. A realidade verdadeiramente é apenas aquilo que nossa existência aceita como sendo a sua própria verdade, e consequentemente cada alma possui a sua própria realidade. Não cabe a ti explorar e desvendar sobre os domínios da existência e do divino. Cabe a ti apenas escolher o que lhe foi oferecido."

A Morte era paciente. Se eu quisesse passar a eternidade decidindo qual escolha tomar era possível, pois o tempo não existia. Não havia nenhuma pressa ou ansiedade na Morte, sua presença era pura e de certa forma bela. Subitamente a Morte deu um passo a frente.

"Cara alma que aqui jaz, vejo que a decisão já foi tomada."

"Minha cara amiga Morte, já me decidi. Escolho por renascer em um mundo de minha escolha e não encontrar o descanso eterno."

"Cara alma que aqui jaz, sua escolha está feita e não poderá ser revogada. Sua existência encontrará o renascimento. Por escolher o caminho mais árduo e coragem será agraciada pela graça divina, não podendo ser acometida por qualquer tragédia ou desespero nessa nova vida, sendo destinada a levar a luz para erradicar as trevas do mundo. Devido a perspicácia de chamar a Morte de amiga, lhe irei agraciar com as memórias deste encontro e o conhecimento sobre o mundo para onde irá presente em suas memórias da vida anterior. Agora vá! Renasça!"

A Morte esticou sua mão e tocou apenas o que supostamente seria um dedo indicador em minha existência. Me senti mergulhada em um mar profundo. Aos poucos pude sentir a vida ir me preenchendo novamente, tomando cada partícula do meu ser. 

E assim, eu renasci.