1. Noite neon

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Respire

Xichen se esforçava para lembrar das coisas mais simples quando estava ao lado dele. Não que tivesse uma memória ruim, é só que era inacreditavelmente fácil se esquecer de tudo quando via-o sorrir. Como alguém poderia estar tão estupidamente apaixonado assim?

Tomou um gole longo do suco à frente, segurando o copo entre as mãos na mesa de losangos dourados da festa. Sentia a umidade do objeto com os dedos suados, e por Deus, ele se sentia quente.

Jiang Cheng demonstrava sua comumente irritação causada pelo irmão em suspiros audíveis, mas de alguma forma, era como se o canto de seus lábios quisessem mostrar que algo além da raiva estava ali. Xichen já havia aceitado que achava simplesmente adorável ver as sobrancelhas franzidas e o semblante desgostoso do Jiang, mas como negar o quão balançado ficava ao vê-lo sorrindo?

Sem se dar conta, um dos cotovelos buscou apoio na mesa e o queixo encostou na palma da mão. Estava encantado. Na verdade, muitos outros adjetivos caberiam para definir a forma idiota com a qual fitava o rosto alheio, como maravilhado, seduzido, deslumbrado ou fisgado. Será mesmo que Cheng não notava?

A camisa social roxa tinha alguns botões abertos, mostrando a curva do pescoço, salientando o pomo de adão e dando uma deslumbrante visão da clavícula. Sua pele clara e lisa, aparentemente macia, tão livre... A mercê de olhos desconhecidos.

Xichen queria lambê-lo. Imaginou o quão fácil seria deslizar a língua por ali, distribuir beijos molhados e leves mordidas. Jiang se renderia ou seu corpo recusaria, caso fosse tocado naquele instante?

Ainda atento a cada movimento que seu objeto de adoração fazia, o Lan notou os dedos compridos e esguios, livres de adornos. As mangas da camisa erguidas até os antebraços que deliberadamente davam acesso as veias saltadas, e finalmente a tez corada enquanto falava animadamente de um assunto que adorava; Harry Potter.

Era no mínimo engraçado imaginar que a alguns metros deles, Wangji e Wuxian estavam praticamente se comendo na pista de dança. Acreditar que seu irmão mais novo estava na pista de dança por si só, já era algo considerável a ser debatido, mas que afinal; eles estavam numa balada, e além de finalmente ter os olhos sagazes de Jiang Cheng fixos em si, ele gesticulava muito e falava alto, animado, sobre algo que amava e queria dividir consigo... Ah, isso era verdadeiramente inacreditável.

Se aquilo era um sonho, Xichen não queria acordar tão cedo.

"Respire com calma", o lembrete ecoou em sua mente.

"Não suspire, aja naturalmente!", outro veio em seguida, praticamente um alarme.

"Não sorria tanto, ele vai te achar irritante", esse último era um pouco duro, mas se esforçaria para segui-los e não afugentar o gato perigosamente arisco que tinha na mesa consigo.

Apesar de ter visto todos os filmes, não lera todos os livros do menino que sobreviveu. Essa havia sido a deixa para que o Jiang lhe explicasse as diferenças entre os personagens, mudanças que não concordava entre os livros e os filmes, e claro, como a autora se mostrava cada vez mais detestável com comentários absurdos no twitter.

Conversaram por tanto tempo que até mesmo perderam a noção da hora. Nenhum deles consumiu álcool naquela noite. Xichen comentou que não tinha o costume de beber, ainda que o fizesse socialmente, enquanto Cheng garantiu que não beberia para o caso de Wuxian dar problema. Era interessante que usassem desculpas convenientes, quando a verdade é que estavam aproveitando muito da companhia um do outro para deixar que algo inebriasse seus sentidos.

Cheng gostava de ver seu reflexo nos olhos do Lan, era como se perto dele, isolados naquela mesa, longe de todo o caleidoscópio neon da noite, pudessem conversar sobre tudo e serem eles mesmos. Era bom, não julgar e não ser julgado, ainda mais por um cara tão bonito.

Lan Xichen era a mais pura definição da beleza. Seus gestos, reações, até mesmo suas palavras, beiravam a perfeição. Era como uma figura angelical, ainda que tão tentadora.

O Jiang suspirou, reclamando sobre a Gina Weasley dos filmes, mas mantendo os olhos na boca bem desenhada do outro, por onde vira e mexe, a língua molhada passava. Ah, tudo o que ele queria era puxar o Lan pelo colarinho da camisa branca que usava, e lamber ele mesmo. Daria tudo por uma mordida no lábio inferior do mais velho.

"Sua boca está seca? Deixa que eu te ajudo", diria, em seguida lhe daria um beijo. Claro, eram apenas fantasias. O cunhado de seu irmão era um homem sério e tratava a todos com demasiada gentileza, bem diferente de si. Não é como se tivesse algum interesse nele, não é mesmo?

Foram tirados de seus devaneios de forma abrupta quando o celular de Xichen vibrou. Depois de uma rápida olhada, ele sorriu e o colocou no bolso.

— Meu irmão avisou que saiu com o seu, e levou meu carro. — Sorriu ainda mais abertamente ao ver a reação do mais novo, que levou uma mão até a testa e massageou as têmporas. — Me dá uma carona?




//continua...

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