Capítulo 3.

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Apesar do frio habitual da Escócia o sol despontava atrás das montanhas, fiquei contente por ter acordado tão cedo, afinal de contas queria explorar o máximo que pudesse das Terras Altas.

Observei Jamie enquanto ele dirigia, aproveitando sua distração com a estrada à nossa frente. Seus cílios eram enormes com uma tonalidade ruiva nas pontas que curiosamente mudava para um louro claro próximo às raízes, observei a cabeleira cacheada de um ruivo intenso e me perguntei de quem ele havia herdado, iria questionar quando houvesse oportunidade. O seu maxilar era marcado lhe dando um ar de masculinidade forte... isso me lembrou um soldado que uma vez atendi no hospital.

Hospital… quantas vezes permaneci naquele local em busca de ajudar todos que precisassem, mas hoje, estando tão longe de casa, eu ainda não conseguia sentir saudades.

- Uma moeda por seus pensamentos?

Sorri culpado ao encontrar seu olhar curioso em minha direção.

- Estava me lembrando do hospital onde trabalho.

- Ahh então você é médica sassenach?

- Ainda não, sou enfermeira. No início da carreira pensei em cursar medicina, mas de certa forma não era o que eu queria.

Jamie me encarou de maneira avaliativa,  incentivando-me a continuar.

- Meu sonho sempre foi unir minhas duas paixões: botânica e ajudar as pessoas. Mas com o tempo acabei focando na enfermagem e deixando o restante de lado, às vezes ainda faço algumas anotações em meu diário de plantas, mas nada profissional.

Ele parecia concentrado em algum pensamento e levei um susto quando ouvi sua voz carregada de empolgação:

- Mas porque você não começa aos poucos criando medicamentos naturais? Seria interessante, hoje em dia as pessoas ignoram o poder da natureza.

Fechei minha janela por conta do vento da estrada e observei a paisagem afora, meus pensamentos passando rapidamente.

-  Além de buscar respostas sobre meu tio, vim para essa viagem na tentativa de me encontrar. Sinto que preciso de um recomeço, sabe Jamie? Eu pedi um afastamento temporário do hospital, estou aqui sem data marcada para voltar. Preciso rever minha vida e decidir o que é melhor para mim, sempre tive medo de investir nos meus sonhos mas com a morte do Tio Lamb ficou um grande vazio, quero ter um objetivo na vida, uma motivação maior, algo que me traga paixão. É claro que eu não queria perder o tempo que investi…
mas isso não me parece tão importante agora.

- Pense que nada se perde, tudo se transforma, sassenach.

- Essa é uma lei da termodinâmica - respondi.

Seu olhos azuis intensos me fitaram e com um sorriso de canto respondeu:

- Acima de tudo, é fé.

Realmente parecia fazer sentido.

Viramos em uma rua sem asfalto e me lembrei que séculos antes alguns highlanders devem ter passado por ali, com seus cavalos e kilts esvoaçantes.

- Surpreendente não é? A história está em constante evolução, antes o que era comum, hoje não é mais. Temos a mania de limitar nossos sonhos e ambições Claire.

- Concordo, você me parece um rapaz audacioso, não parece ter medo de nada.

Tirei um cacho de meus olhos e Jamie estacionou o carro.

- Eu tento não ter medo sassenach, a vida é curta demais para não ser aproveitada.

Iniciamos uma trilha que parecia levar ao topo de uma colina. Meu acompanhante era sagaz e andava com facilidade sem perder o fôlego, não podíamos dizer o mesmo de mim.  Precisei de algumas paradas para recuperar a respiração e após o que acredito ser uns 20 minutos chegamos ao topo.

Uma carta inesperadaOnde histórias criam vida. Descubra agora