O Primeiro Jogo

337 19 3
                                    

16 de abril de 2021

Abel Ferreira estava agachado na beira do campo enquanto olhava seus jogadores reiniciarem o jogo.

O Palmeiras saía atrás no placar após um erro na saída de bola que culminou no gol de Pablo. O jogo estava no início do segundo tempo e, no fundo, o português só queria que acabasse logo.

E acabou.

Palmeiras 0x1 São Paulo.

Abel vivia seu pior momento no Palmeiras. Dois vices e uma derrota em clássico, tudo em menos de uma semana. E a Libertadores já começava na próxima. Ele sabia que tinha respaldo da diretoria e confiança dos torcedores. Bem, pelo menos da maioria.

– Bom jogo. – Crespo cumprimenta o técnico alviverde após o apito final. Eles já haviam se cumprimentado antes da partida.

– Bom jogo. – Abel aperta a mão do argentino. – Parabéns. – Sorri fraco e se despede.

Não havia sido um bom jogo.

E algo em Crespo intrigava Abel.

Ele era tranquilo, muito tranquilo. E educado. Simpático, elegante, bonito... mas na época que jogava era feio. É, feio, porém craque. Agora é bonito e, aparentemente, bom treinador. Absurdo.

Essas e mais outras coisas que todos se questionavam, inclusive Abel.

O português obviamente o conhecia há muito tempo. Hernán era craque. Um dos maiores artilheiros da história da seleção da Argentina. Jogou Copa, ganhou títulos... e falando em título, - ou na perda dele - quem não se lembra da final da Champions de 2004/05? Milan x Liverpool. O time italiano fez 3x0 no primeiro tempo, com dois gols de Crespo. Depois tomaram empate. E nos pênaltis, os ingleses levaram a taça. O milagre de Istambul. No final do ano, o São Paulo conquistou o Mundial em cima deles. Abel, estudioso e amante do futebol, lembrava disso tudo. Conhecia o clube paulista e admirava o maior técnico de sua história, Telê Santana.

Abel queria conhecer mais o treinador rival e descobrir o que ele tinha que o intrigava tanto. Morar no mesmo condomínio ajuda, a qualquer momento ele poderia o encontrar e puxar assunto.

Os dois sabiam que eram vizinhos. Já tinham, inclusive, se visto por lá. Porém, se qualquer um os dissesse sobre a presença do outro no local, fingiriam surpresa. Gostar de fingir é uma das raras coisas que os treinadores tinham em comum.

O que eles não tinham percebido ainda é que ambos chamavam a atenção um do outro. Para Crespo, Palmeiras e Abel eram assuntos toda hora e em todo lugar. Para o português, era o sucesso do argentino e sua equipe que não saíam de pauta. Para eles, tudo era sobre o outro. E os caras sequer tinham trocado uma palavra até o clássico daquela sexta-feira.

A verdade é que uma boa noite batendo papo e tomando um vinho já era realidade, e o tempo seria o encarregado de fazer isso acontecer no momento certo.

Mas naquele momento, nenhum dos dois estava com tempo pra pensar em rival. Principalmente Abel, que só queria descansar pois teria muito trabalho pela frente pra reviver o atual dono da América.

E mais do que tudo: precisava afastar toda e qualquer chance de demissão. Ainda mais agora que encontrou alguém que pode o ajudar a esvaziar a garrafa de vinho que ele tem guardada.

Entre Rivais - Hernán Crespo & Abel Ferreira Onde histórias criam vida. Descubra agora