Uma dose de reencontros

Eu achei seu livro

Trajada de uma longa saia branca com suas transparências e um maiô liso da mesma cor, Lara caminhava sobre a fina areia em busca uma uma mesa de frente para o mar. Como já era noite, muitas pessoas preferiam à área interna dos restaurantes, o que lhe permitiria muitas opções, porém, naquele momento específico estava bem difícil de achar sequer uma cadeira vazia.

Precisava de um descanso, e ler um bom livro enquanto comia alguns frutos do mar e bebia um drink de laranja, sentindo a brisa praiana tocar seu rosto lhe parecia a melhor ideia que já tivera desde a sua mudança há algumas semanas.

Correu os olhos mais um pouco e finalmente encontrou o que buscava. Não conseguiria obter o silêncio, pois o espaço vazio estava ao lado de um grupo de amigos com um som bastante elevado. Não importou-se, sabia desse imprevisto antes mesmo de sair de casa. Andou alguns minutos até finalmente acomodar-se em uma cadeira e respirar o ar que vinha das ondas.

- Ufa, finalmente!

Pegou o livro na bolsa junto de seus óculos e buscou pelo marcador que havia deixado no capítulo em que tinha parado. Suspirou ao notar que estava no finalzinho. Seus olhos, imediatamente puseram-se a caminhar pelos versos da história, tirando seu foco da realidade em que estava e entrando em um novo universo.

- Boa noite, senhorita! - sua atenção fora roubada pela voz do garçom.

- Boa noite. - falou, educadamente.

- Já sabe o que vai pedir? - Teve que falar um pouco mais alto devido ao som muito alto que vinha da mesa ao lado.

- Sim! - a jovem fez seu pedido e voltou à sua leitura, agradecendo pela rapidez do atendimento, tendo em vista sua fome.

Sentia um olhar fixo vindo em sua direção, mas não sabia exatamente de quem se tratava. Um pouco mais afastado, com uma garrafa em mãos e trajado de uma barba feita e boné que já fazia parte de suas vestes diárias, Guilherme tentava recordar o motivo de achar a garota sentada com um livro em mãos tão familiar.

Podia ser apenas o efeito do álcool, pois já estava ali há algumas horas. Balançou a cabeça e tentou focar na conversa entre os amigos, mas não conseguia, mesmo que tentasse avidamente.

- Por que alguém viria para a praia ler um livro? - Pedro, notando sua atenção na garota, questionou.

- Deve ser a falta de amigos.

- Ela não parece alguém sem amigos! - sua amiga falou.

- Verdade.

- Por que você está olhando tanto pra lá, Guilherme?

- Não sei, ela parece familiar!

- Você conhece aquela garota? E tá esperando o que pra ir falar com ela?

- Eu não sei se conheço, essa é a questão.

- Na dúvida, vai lá! - Incentivaram.

- Não tenho coragem, devo estar confuso.

- Talvez, você já tomou muitas dessas. - apontou para as garrafas vazias.

Riram e logo o assunto mudou. O rapaz largou a bebida na mesa e tomou um pouco de água, por um segundo pensou em realmente levantar e ir até a garota, mas desistiu novamente. Olhou às horas no celular e decidiu que iria mais cedo pra casa.

Estava confuso com toda aquela situação. Seu coração acendeu uma fagulha que não fazia sentido no momento. Quem seria aquela moça vestida de branco? Suspirou pesado.

Com o mesmo olhar atento do início, Lara desvendava os últimos segredos da trama, logo chegando ao final. Sua comida chegou, junto de sua bebida, então colocou o livro encima da mesa e comeu vagarosamente. Pela ideia de ser sexta à noite, deveria estar acompanhada ao menos por uma amiga, mas ainda não havia feito nenhuma na cidade. Sentia saudade dos seus amigos, mas estavam longe demais para saírem juntos.

Pediu mais um drink de laranja, o cítrico de sua preferência. Começou a encarar o mar, não importava o lugar, se tivesse praia à faria sentir-se menos sozinha. Uma força maior lhe obrigou a desviar o olhar e encarar aquele rosto.

A primeira troca de olhares ocorreu e  fora como uma pontada no peito. A respiração falhou, a boca secou, mas não entendiam o motivo de tais sensações. Ficaram parados, com os olhos fixos um no outro, sem mover um fio de cabelo. 

Silêncio e desespero. Quando voltou ao normal, Lara decidiu que era hora de ir embora, não deveria ter bebido. Chamou o garçom e após o pagamento, tomou sua bolsa em mãos e saiu caminhando pela areia. Guilherme ficou estático, não sabia exatamente se ia atrás dela ou se continuaria parado. Não foi.

- Ela já foi? - Andreia perguntou.

- Sim. - respondeu seco.

- Nossa, que bicho te mordeu? - estranhou a fala do amigo.

- Nada, só estou cansado! Acho que já vou indo, amanhã tenho que resolver umas coisas. - anunciou.

- Mas, já? Não são nem 10h da noite!

- Já, estou cansado. - falou, conferindo as horas no celular. - Até mais, galera!

- Tchau, Gui!

- Tchau. - os demais falaram em coro.

O jovem levantou, pegou suas coisas e saiu de perto dos amigos. Quando estava passando pela mesa que antes fora ocupada pela jovem, notou que a mesma havia esquecido seu livro, então se aproximou sorrateiro e o pegou. Aquela poderia ser a oportunidade de descobrir quem era sua dona e o porquê dela ter mexido tanto consigo.

Saiu da areia e chegou no estacionamento. Entrou no carro e seguiu até em casa. O apartamento estava no mesmo silêncio de sempre, já não era tão estranho. Jogou-se no sofá e olhou todos os detalhes do livro. Era bem grande e pesado, digno de um espaço na estante. Citadel, esse era o título. Abiu-o, buscando alguma informação e provido de grande sorte, no marcador havia o nome e número de uma pessoa, o que supôs tratar-se da jovem da praia.

Salvou o número no seu celular e logo mandou mensagem, torcendo para ser a real dona do livro.

Guilherme
Olá, boa noite! Você esqueceu seu livro na mesa vizinha à minha, acabei trazendo comigo. Onde quer que eu te entregue?

Esperou alguns minutos até receber alguma resposta.

Lara
Olá, boa noite! Agradeço por ter guardado, acabei esquecendo. Se você quiser eu passo aí para pegar ou marcamos em algum lugar.

Ele não havia pensado nessa parte, se ela fosse pegar em sua casa, com certeza seria uma passagem rápida, porém, não seria ruim. Teriam mais privacidade para conversar, se ela estivesse de acordo, claro.

Guilherme
Vou te passar meu endereço
Quando puder vir, estarei aguardando

Lara
Posso passar aí amanhã às 10h?

Guilherme
Pode sim, estarei aguardando

Lara
Obrigada pela gentileza, até amanhã
Boa noite

Guilherme
Disponha, até amanhã
Boa noite

O nome dela era Lara, não lhe era estranho. Tentou lembrar ou ver a foto de perfil, mas não havia nenhuma. Talvez por ela não ter salvo seu contato, o que não era sua culpa, pois o mesmo acabou esquecendo de se apresentar. Faria isso no dia seguinte.

Levantou e seguiu até o banheiro, tomou um banho demorado e logo deitou na cama. Pegou no sono rapidamente, não antes de colocar um alarme para às 9h da manhã, não queria estar dormindo quando ela chegasse.