*jagi = querido (a)
Avisos: homofobia, violência doméstica, pensamentos auto depreciativos.
A água me rodeava. Eu caí no mar e afundei, contudo não afundei apenas o equivalente ao peso do meu corpo e à altura da queda. Eu continuei afundando até perder a superfície de vista e ser abraçado pelo breu. Não conseguia enxergar nada, não importava o lado para o qual eu nadasse. Decidi, então, nadar em uma única direção em busca de algo — qualquer coisa —, já que tentar nadar para cima parecia não dar muito certo. E assim eu fiz por longos minutos até cansar e parar.
Ali era frio e comecei a me desesperar, já que não havia perspectiva de que algo mudasse ou acontecesse. Dei mais uma volta, no entanto continuava vendo nada em qualquer direção, por isso voltei a nadar aflito. Eu tinha certeza que estava chorando, apesar de as lágrimas serem apenas mais algumas gotinhas insignificantes daquela imensidão salgada.
Parei novamente, mas dessa vez porque percebi um brilho dourado atrás de mim e me virei depressa nessa direção. Algo ou alguém vinha até mim e se movia muito rápido. Meu lado racional dizia que eu deveria sentir medo, todavia medo era o último sentimento que me acometia naquele momento; eu estava curioso e aliviado por sair da escuridão interminável, principalmente depois de perceber os reflexos vermelhos e verdes da figura cada vez mais próxima.
Era ele, e meu coração bateu descontrolada e dolorosamente em meu peito. Percebi que minha respiração ficou acelerada por conta da quantidade de bolhas que saíam do meu nariz e boca, e nem ao menos estranhei o fato de estar conseguindo respirar dentro d'água, ansioso como me encontrava em antecipação ao encontro.
O tritão se aproximou, diminuindo a velocidade, porém não parou como eu imaginava que fosse fazer, tampouco seguiu reto. A criatura de brilho dourado me contornou e passou a nadar em volta de mim, ora se distanciando um pouco, ora próximo demais, e eu acompanhava cada movimento atônito com tamanha beleza e graça de movimentos.
Ele me rodeou três vezes na mais bela dança já vista por mim, para enfim parar bem a minha frente. Os fios vermelhos moviam-se delicadamente com o balanço da água e os olhos cravejados de esmeraldas me encararam, um pequeno sorriso nos lábios rosados.
O tritão ergueu uma das mãos e passou a ponta dos dedos delicadamente pela minha bochecha, o que fez todos os meus poros se arrepiarem e meus olhos fecharem por conta da textura suave e da temperatura morna, se comparada ao frio que eu sentia.
— Você está com medo? — perguntou, e sua voz grave e retumbante me fez tremer, mesmo o tom sendo gentil e preocupado. No entanto, ele não me dava medo, de jeito nenhum.
— Não — sussurrei. — Não mais.
A longa cauda que estava dobrada tremulou levemente, o sorriso que eu recebi como resposta jamais poderia ser esquecido, me aqueceu instantaneamente.
— Quando se perder na escuridão, venha até mim. — Envolveu meu rosto com ambas as mãos. — Agora você já pode acordar.
Eu estreitei os olhos, pois o pedido me pareceu estranho. Ele percebeu minha confusão. Sorriu mais uma vez e se aproximou ainda mais, sussurrando em meu ouvido.
— Acorda, jagi.
E eu despertei. Um raio de sol tímido invadia o quarto pela pequena fresta entre as duas cortinas, indicando que o despertador deveria tocar em breve. Entretanto eu não esperei, estava muito quente, quase febril, apesar de me sentir extremamente bem disposto para alguém que quase morrera no dia anterior, portanto levantei e fui direto para o chuveiro, ainda com a imagem vívida do tritão de olhos esmeralda na mente.
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What the water gave me
Fiksi PenggemarA minha vida não era nada fácil, mas era ao menos satisfatória quando eu contemplava a imensidão azul. O mar parecia tão ou até mais solitário do que eu e, justamente por combinarmos nesse quesito, me sentia de certa forma acolhido. Mas apesar da cu...