-Por favor, não corre. –a vozinha infantil ecoou sobre o espaço vazio. Todo o sangue (até mesmo o que estava empapando as faixas em seu braço) pareceram congelar. Ela desejou correr mas as pernas paralisaram. Olhou para trás. A garotinha não parecia um fantasma. Seus cabelos lisos caíam sobre o vestido branco. O rosto exibia um sorriso. Em seus braços, um pequeno urso de pelúcia marrom. O vestido branco parecia ser fino. Não aparentava ter mais que dez anos. Thereza não se moveu. Apenas sentiu parte do seu medo passar. Fitou o rosto da garotinha.
-Uma bela noite, não acha?
-Você devia estar em casa assistindo Backyardigans, moleca. –respondeu Thereza.
-Mas eu estou em casa. E aqui não passa Backyardigans. As histórias daqui são bem mais interessantes.
A garotinha deu dois passos em direção ao túmulo do “olhos cinzentos”. Fitou a base de mármore por alguns segundos e logo em seguida sentou-se, seus pequenos pés ficando fora do chão. Bateu no mármore liso ao seu lado, convidando Thereza a fazer o mesmo. Thereza ainda imóvel, olhou para o túmulo. Não sentia mais medo, aquele sorriso infantil havia dissipado seu medo. Mas precisava mandar aquela garotinha pra bem longe dali.
-Você precisa ir pra casa, moleca. Me diz onde você mora e eu te levo lá. Isso aqui não é lugar de criança. –“não de crianças vivas, pelo menos” pensou Thereza ironicamente.
-Eu já te disse que aqui é minha casa. Senta aqui, a gente tem um assunto para conversar.
-Eu não tenho nada para falar com você. O que você quer de mim?
-Eu quero o que você também quer, Thereza. –nesse momento, Thereza estacou. Como ela sabia a porra do nome dela? Isso já estava parecendo demais algum filme de terror. Mesmo assim, ela queria saber. Precisava saber. Sentia isso.
-Como você sabe meu nome?
A garotinha sorriu, ao ver a garota a sua frente puxar com força o capuz e deixar um pouco da luz refletir sobre as bochechas ainda úmidas de lágrimas quase secas. Quanta ansiedade. Mas nada de medo. Ergueu seu braço miúdo e alisou o joelho do anjo de pedra “olhos cinzentos”.
-Quantas vezes, você já parou para contar? Quantas lágrimas.... Incontáveis. –o olhar da garotinha, agora voltado para o anjo de pedra, se tornava triste. –O que eu quero de você é o mesmo que você tanto clama para a escuridão, em todas as vezes que vem aqui. Ajuda.
-E-eu.... tá. –ela não pode deixar de sorrir nesse momento. Uma risada forçada, lembrava uma tosse, ou soluço. –Então quer dizer que você sabe de todas as vezes em que vim aqui? Onde você estava que eu nunca te vi? Se escondendo?
Foi a vez da garotinha abandonar o semblante triste e sorrir.
-De certa forma, sim, estava me escondendo. Mas você é que não podia me ver.
Thereza abandonou o sorriso, e encarou a garota sem saber o que dizer. Afinal, tudo o que ela estava dizendo parecia irreal e estúpido.
-Mas eu sei de tudo. –a garotinha novamente formou em seu rosto o semblante de tristeza. –Sei do quanto você quer ser ouvida, Thereza. Sei do quanto odeia a tudo. Sei até por que corta tanto seu próprio corpo. E eu posso te ajudar. Mas você precisa me ajudar primeiro.
Nenhum músculo em seu corpo se moveu. Ela sabia. Aquela merda de garotinha sabia de tudo, foi a sensação que a invadiu no momento. Uma criança, que, apesar de falar como gente grande, não passava de uma criança. Estava oferecendo ajuda. E Thereza acreditou. Acreditou que ela poderia ser sua última esperança. Sentiu os olhos umedecerem. Por que estava se sentindo assim, de repente? Desviou os olhos da garotinha e fitou o vazio.
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A Redenção de Thereza
HorrorThereza é alguém que passa despercebida por muitas pessoas todos os dias. Uma típica adolescente de rosto fechado e olheiras profundas. Porém, em sua alma, existe uma dor que ela ainda não soube fazer desaparecer. Estranha, depressiva, todas essas e...