Sou um homem de palavra e é por isso que em plena sexta feira às sete e cinquenta e nove da noite estou parado em frente a um portão azul e em bairro da periferia de Curitiba tocando a campainha. Momentos depois escuto barulhos de chaves e a maçaneta sendo girada e então ela parece no meu campo de visão.
– cheguei a pensar que você não viria, espero que você me leve a um lugar bem chique porque há anos eu não uso esse vestido e eu estou fabulosa. – ela fala se virando para fechar o portão por onde passou a pouco e depois me encara empinando o corpo.
– Realmente você está fabulosa, deslumbrante para ser justo.
Ela usa um vestido em tom de rosé ele é justo no corpo deixando em evidência suas curvas e seu bumbum empinado, o vestido tem alguma textura que provavelmente as mulheres sabem o nome porém eu não faço ideia do que seja, mas deixa a peça mais elegante, na altura dos joelhos o vestido é mais aberto e fluido fazendo um leve movimento quando ela caminha sobre seus saltos finos. Quando a conheci seu cabelo estava bem curto, mas agora está bem maior, creio eu que ela esteja usando uma aplique ou peruca, o cabelo longo cai bem nela os cachos emolduram seu rosto que está adornado por uma maquiagem leve mas batom vermelho o que deixa seus lábios carnudos em evidência.
Abro a porta do carro para que ela entre e ela murmura que sou um cavaleiro, mas seu sorriso com uma pitada de sarcasmo não me deixa levar as palavras a sério. Dirijo pelas ruas de Curitiba o GPS me guiando já que eu não conheço bem a idade.
– Me conta como é morar tanto tempo fora do país – ela fala com sua voz rouca ao meu lado, tenho curiosidade em saber se a voz dela é assim naturalmente ou se é uma consequência do tratamento contra o câncer.
– eu amo morar em Seattle, a cidade está sempre envolta em uma fina garoa chove muitos dias do ano o que eu adoro, muita gente reclama da chuva, mas eu sempre gostei, me traz certa paz e tranquilidade. Faz tanto tempo que moro lá que me sinto quase um nativo – sorrio um pouco – tenho amigos por lá, a casa que eu tanto amo fica lá é meu lar no fim. Me desculpe, eu falei demais para monopolizar a conversa.
–não tem problema, eu que perguntei e é bom escutar alguém falar com tanta paixão do lugar onde mora, me deixou com vontade de conhecer
– posso te levar lá um dia.
– não somos íntimos o bastante para viajarmos juntos senhor Mendonça. Mas quem sabe depois do jantar.
Gosto do senso de humor dela, como ela é divertida e sagaz para dar respostas rápidas, conversamos o caminho todo sobre lugares no mundo que nós dois queremos visitar, por falta de tempo e ela por falta de recursos. Me sinto envergonhado por ter tanto poder e mesmo assim não curtir a minha vida enquanto ela tem toda a disposição e sonhos, mas não tem o dinheiro necessário.
O que me leva a questão do quanto somos diferentes, me diz em qual situação estaríamos saindo para jantar? Não sou hipócrita e sei da minha posição no mundo, eu só convivo com pessoas do mesmo nível social que eu. Errado? Sim, mas infelizmente eu não sei ser diferente. Aliás eu nunca tinha nem parado para pensar nisso, mas estar aqui com ela dentro desse espaço fechado me faz pensar nessas questões éticas e morais e mais que isso me faz querer realizar todos os sonhos dela como esse de visitar a holanda que ela está me falando quando paro o carro na porta do restaurante.
– Reserva no nome de Arlindo Mendonça – falo com a recepcionista que verifica no tablet e logo fomos encaminhados a nossa mesa.
O restaurante tem um ar moderno e sei que o chefe tema três estrelas michelin, tudo aqui grita sofisticação e Liana olha tudo admirada, nossa mesa fica em uma espécie de sacada com vista para um bonito parque, puxo a cadeira pra que ela possa se acomodar e dessa vez quando me chama de cavalheiro tem um brilho de admiração no olhar e por algum motivo meu peito se inflama com orgulho.
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NOSSO RECOMEÇO
Short StoryLiana viveu uma vida de privação e abuso, depois de passar e vencer uma doença séria ela está pronta para recomeçar sua vida e encontrar seu lugar no mundo. Arlindo sempre viveu uma vida de privilégio, mas isso não impediu que a dor e a tragédia s...