Capítulo 4

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Uma madrugada conturbada, eu diria... Acordei algumas vezes e voltei a dormir várias delas, em outras eu apenas ficava parada, sem fazer nada a não ser... pensar.
Ficar sozinha, acordada, no escuro com meus pensamentos à milhão. Era um pesadelo real, vivo, e isso me assustava.

Não consegui me levantar pela manhã pelo cansaço tardio de ter pensado demais, procurar respostas para o que ocorreu ao longo desses meses era como cavar o próprio túmulo, e muitas das vezes você mesmo acabaria se enterrando. É isso. Certas coisas devem ser mantidas enterradas...

Talvez seja por isso que eu nunca contei para ninguém sobre como foi pra mim encontrar o Josh no banheiro, sozinho, dentro da banheira com seus pulsos cortados, com o olhar vazio, sem nada a não ser sangue ao redor de seu corpo morto.
Nunca temos um aviso prévio pra esses acontecimentos, entramos em choque e apenas esperamos a ficha cair.

E quando ela cai, tudo desmorona.

Meu telefone toca e eu vejo que é Jackie me ligando, tento ao menos me recompor para falar naturalmente assim que atendesse, e assim fiz.

—Por que caralhos tu não foi pra aula hoje, hein, mocinha?

—Bom dia pra você também.

—Vou passar na sua casa pra levar as tarefas que passaram hoje, tudo bem?

—Claro...Estarei esperando...

Ela desliga, sua voz parecia um pouco ofegante, provavelmente teria acabado de chegar da escola. Jackie passou a ser uma grande ajuda quando se tratava das minhas notas, e ela sempre fazia questão de mostrar minhas conquistas como forma de levantar meu astral. Só que... o que ela não sabia era que isso não funcionava.

Eu não funcionava.

Fiquei deitada por mais uma hora, sem fazer nada, até a garota de cabelo curto com cachos bagunçados, delineado colorido e agitada chegar à porta do meu quarto com a mochila pesada de tantos livros. Ela parecia animada.

—Foi mal a demora, minha tia precisava de ajuda com o almoço.

—Sem problemas, senta aí.

—Perguntaram por você hoje...

Ela jogou a mochila no chão e sentou-se na beirada da cama e enquanto conversava comigo, ia tirando suas botas escuras, ficando apenas com uma meia preta com listras roxas em seus pés. O estilo de Jackie às vezes era difícil de decifrar, afinal, ela estava sempre mudando, alternando, inovando.

—Quem perguntou? — Levantei uma das sobrancelhas com um ar questionador

—O Vítor, da natação. Lembra-se dele? Vocês se beijaram no início do ensino médio...

—Como poderia esquecer? Maldito jogo da garrafa...

—Uma das garotas da equipe fraturou o braço, e no sábado vai ter uma pequena competição contra outra turma de uma escola vizinha. E ele queria que eu te perguntasse, se...

Já sabia aonde isso iria dar, interrompi Jackie no momento que ela me faria a seguinte pergunta.

—Ele quer que eu nade?

—É só uma vez, Spencer, se a equipe não estiver completa, nossa escola não entraria para as regionais.

—Jackeline, você sabe há quanto tempo eu não nado?!

—Só...pense em como isso beneficiaria a nossa escola, você já foi a melhor da equipe, eu me lembro disso e você também se lembra! E vai saber se isso não te faria bem...

Ficamos em silêncio, não conseguiria entrar em uma discussão tão "cedo" assim. Balancei a cabeça em negação e a garota tirou o material necessário para estudarmos hoje de dentro da mochila, e foi assim que passamos a tarde.

Seria má ideia tentar de novo?... E mesmo que não fosse, como eu faria isso?

Estou perdida.

E assim foi minha estranha quinta-feira. 

"Todas as coisas que eu não te contei"Onde histórias criam vida. Descubra agora