drivers license

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But today I drove through the suburbs
Crying 'cause you weren't around

Seguro o volante com mais força enquanto o instrutor anota algo na prancheta. Pela visão periférica não consigo deixar de encarar os cabelos pretos penteados para trás, a pele amarela e cheia de sardas deixando os olhos redondos ainda maiores e mais claros.

Estamos estacionados logo em frente a auto escola, a fachada laranja me dá calafrios e só de me imaginar voltar ali com mais um fracasso fico tonta.

Não consigo acreditar que estou tão desconcentrada na terceira tentativa de tirar a habilitação. Minhas mãos suam frio e tento não limpá-las na roupa mais uma vez e o barulho da caneta sobre a folha na prancheta de madeira fica zunindo no meu ouvido.

Carlos faz um barulho com a boca e viro a cabeça, tentando sorrir, mas só sai uma careta nervosa. Eu deveria ter treinado mais com meu pai na rua de casa, mas a história com Max me deixou mais avoada que o normal. O carro de Zac, meu irmão, parece cada vez menor enquanto os minutos passam e não consigo parar de encarar a figurinha desbotada de anime que colei no porta-luvas.

— Parabéns, senhorita Rodrigo — Ele diz mexendo no óculos quadrado e me viro, sem tirar as mãos do volante — Você conseguiu, passou.

Solto o ar com força e minha boca fica aberta, em um agradecimento que não sai, meus olhos começam a arder e ele me estende a prancheta pra que eu assine. Demora até eu conseguir enxergar e assim que termino de colocar meu nome, Carlos faz mais umas anotações, ainda em silêncio e me entrega a documentação oficial. Uma habilitação provisória.

As lágrimas começam a cair e só percebo que estou deplorável quando não consigo mais enxergar e preciso limpar o nariz. O Senhor Diaz coça a nuca, totalmente descartável e consigo notar a sua outra mão na maçaneta da porta, provavelmente esperando que eu me recupere para sair correndo dali.

— Obrigada. — Digo fungando.

Carlos fala mais alguma coisa sobre a regulamentação do documento e como eu não posso ter nenhuma multa ou infração de trânsito, mas minha cabeça está em um lugar distante. Em Max. Ele estaria me esperando, batucando na porta do carro e depois colocaria nossa música favorita. Eu só aceno e ele sai do carro, me desejando sorte.

Encosto a testa no volante com as mãos já doloridas. Nunca pensei que ficaria tão abalada com um término ou por alguém. É idiota lembrar de todos os detalhes que planejamos para quando eu pegasse a habilitação; viajaríamos até a praia mais próxima ou qualquer cidade que tivesse um ponto turístico diferente do "normal", como a maior pizza do país ou o maior lago do estado. Bato no painel do carro, a risada de Max na minha memória é doce e alta o suficiente pra fazer a ferida ficar ainda maior.

Hoje era pra ser uma lembrança feliz e tudo que eu consigo pensar é em um garoto que me deixou. Meu Deus, eu sou tão patética. O celular toca e abro o porta-luvas, meu coração acelera pensando que, talvez, ele tenha lembrado. Entretanto, é Taylor.

— E aí? Finalmente vamos poder ouvir Party in the U.S.A enquanto estamos atrasadas pro trabalho?

Sua voz alta e animada me faz grunhir de frustração por não aproveitar mais o momento.

— Claro, só falta eu comprar um carro agora.

Minha voz sai baixa e preciso limpar a garganta pra ela não falhar.

— Liv, tá tudo bem?

Balanço a cabeça mesmo que ela não me veja e fico encarando a rua. Os carros vêm e vão e o céu começa a ficar um pouco mais escuro.

AzedoOnde histórias criam vida. Descubra agora