Capitulo 3

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         Senti o sol esquentando a minha pele, antes mesmo de abrir os olhos, antes mesmo de eu relacionar o que havia acontecido ontem à noite, o que iria acontecer hoje e, porque eu estava deitada completamente nua no meu sofá, apenas com um fino cobertor sobre meu corpo. Megan devia ter me tapado ao ir embora, já que ela não estava mais em meus braços.

Levantei num pulo e procurei por ela, mesmo sabendo que ela já fora, mesmo não sentindo o calor de seu corpo mais. E levou apenas alguns segundos para meu cérebro assimilar que hoje era o dia da colheita. E como se isso não bastasse, que faltava menos de uma hora até a primeira etapa do teste iniciar. O que significava que já passavam das nove horas da manhã e que, se eu não quisesse ser presa, ou algo pior, eu deveria correr e me arrumar.

E foi o que eu fiz, em 15 minutos tomei banho, vesti uma calça jeans e uma blusa preta, ao pegar as chaves do carro na mesa, percebi meu vestido jogado no chão, ao lado do sofá, iria ficar de presente para meus pais, já que não estavam em casa nesse e em tantos outros momentos tão decisivos. De qualquer maneira não faria diferença, não para eles, nunca fez, e não será isso o que fará, já que eles passam mais tempo em reuniões governamentais que prestando atenção na vida de suas filhas.

Atravessei a porta, sai de casa e fui em direção ao meu destino.

Havia tantas garotas e garotos, uma fila de cada para ser bem exata. Cheguei faltando alguns minutos para que os militares interrompessem a entrada e bloqueasse a passagem, entregar meus documentos foi a parte fácil, agora, eu estava na fila da parte difícil. Tudo que eu sei é que terei que tomar um líquido, e que de alguma forma, meu corpo reagirá a isso, ninguém que testou positivo teve a chance de contar como aconteceu, e eu estou aqui, para fazer a droga deste teste, e ir embora logo, para uma casa, mesmo que não haja uma família dentro.

— Você é a próxima... — disse uma mulher segurando uma planilha, vestia roupas militares e botas de cano longo — no momento que a luz ficar verde, você pode entrar — ela apontou para uma lâmpada que no momento estava vermelha, mas que em poucos segundos ficou verde — agora... vai!

Não vou mentir, senti medo, algo em mim gritava para que eu não desse mais nenhum passo, e simplesmente fugisse, corresse o mais rápido que eu pudesse e talvez, provavelmente não, mas talvez tivesse alguma chance de não precisar cumprir alguma detenção. É claro que ignorei este alerta, dei um passo em frente e abri a porta.

A sala era branca demais para os meus olhos, e incrivelmente gelada. Havia uma cadeira e um homem ao lado dela. Um belo homem, com cabelos quase brancos de tão loiros, olhos maravilhosamente verdes e lábios tão rosados que pude perceber a longa distância, o deixavam em uma batalha violenta com seu uniforme inteiramente preto. Pude notar uma rigidez em seu corpo quando seus olhos me analisaram dos pés a cabeça e fizeram um sinal em direção a cadeira.

— Sejamos rápidos — disse ele apenas, sua voz não era tão grave quanto sua aparência deixava a imaginar — sente-se.

Um comando.

Uma ordem.

Caminhei cautelosamente, com passos leves, silenciosos e lentos, sabia que ele estava me analisando, me estudando a cada movimento, me conhecendo sem ao menos eu ter dito uma palavra, eu sabia. A cadeira era igualmente fria e senti meu corpo e meus braços estremecessem, um instinto fez meus braços abraçarem meu peito.

— Meu nome é James Scott, eu irei aplicar o teste em você... — disse ele retirando uma lâmina pequena e um pequeno tubo para coleta de sangue, que reconheci, devido a minha faculdade — me dê sua mão direita.

Outra ordem.

— Ontem o general não falou nada sobre coleta de sangue — falei engolindo em seco — você ao menos sabe fazer isso? E por que não faz com uma agulha e uma seringa? Um bisturi é totalmente desnecessário.

James virou seu rosto para a palheta que estava na bancada ao lado de um copo com líquido azul. Seus olhos claramente estavam lendo o que estava escrito ali.

— Emma Theran, dezoito anos — falou James sem expressar nenhum sentimento, com a voz lívida — estudante de medicina, classe alta, família apoiadora da colheita e de boa patente — ele deu ênfase nas últimas palavras — podemos fazer isso rápido o bastante para você voltar a nadar no rio de dinheiro que você tem, e deixar que eu siga fazendo meu trabalho.

Meu sangue ferveu. Senti cada átomo de ar na sala e desejei estraçalhar os pulmões do homem na minha frente, senti meus dedos afundando no metal da minha cadeira e foi quando James respirou fundo, que percebi o que eu estava fazendo.

Não, Emma, Não.

— Pelo menos retire meu sangue com o equipamento correto — falei cruzando as mãos no meu colo — não é necessário um bisturi para isso.

— O bisturi é muito necessário para tirar seu sangue — James levantou sua outra mão e revelou um pequeno dispositivo eletrônico — é um rastreador, agora me dê logo a sua mão.

Estendi minha mão direita para ele, que a puxou grosseiramente, seu toque, no entanto, era suave, de alguma forma até gentil. Senti a lâmina me perfurando, senti meus dentes rangerem de dor e senti o corpo de James estremecer e sua mão hesitar. A dor era aguda, e senti um desconforto, como se estivesse um espinho cravado, quando James injetou o aparelho sob minha pele, recolheu algumas gotas do meu sangue e as colocou no tubo. O corte era pequeno, então não bastou mais que um pequeno curativo.

— Não fui nada mal não é, doutora? — perguntou James com um sorriso de canto.

— Ainda não sou médica — falei passando o dedo em cima do curativo.

— É, você tem razão... — disse James pegando o líquido em cima da bancada — certifique-se que no futuro os médicos sejam mais humanos.

Apenas assenti com a cabeça em concordância. Mas aquelas palavras reverberaram pela minha mente. Talvez James fosse um revolucionário, talvez fosse um militar indignado ou apenas estivesse tendo um dia temperamental, fiquei curiosa em saber qual seria a resposta correta.

Ele me entregou o copo com o líquido e o cheiro invadiu minhas narinas, talvez se eu conseguisse beber sem vomitar, já seria uma vitória.

— Beba e relaxe — disse James atravessando a sala, ficando o mais longe possível de mim — deve fazer efeito em poucos segundos.

Mesmo de longe pude perceber o corpo rígido de James e seus olhos ardendo em ansiedade. Voltei meus olhos para o líquido, respirei fundo, engoli e comecei a contar os segundos.

Um.

Dois.

Nada...

Três.

Quatro.

Um pinicão...

Cinco.

Uma ardência...

Seis.

Sete.

Talvez seja só isso, uma reação genérica.

Oito.

Voltei meu olhar para James, que agora me encarava com incredulidade.

Nove.

Meus ouvidos ouviram a voz distante de James, mas o brilho em minha pele tomou minha atenção.

Dez.

E uma explosão de vento, fogo, gotículas de água e rochas estilhaçaram a sala e destruíram tudo antes de eu pudesse avisar James. Mas ele já estava pulando sobre meu corpo e me imobilizando no chão. Senti meu coração acelerar e minha pele arder em chamas, James recuou tão rápido, e pude voltar a ver sua expressão de pânico no rosto.

— Emma, mas que merda? — James estendeu suas mãos queimadas para mim — estava te protegendo, você seria atingida por um escombro.

— O quê? — eu estava atônita, James estava certo, porque quando levantei os olhos até mesmo a cadeira de metal estava retorcida no chão e o teto inteiramente desmoronado — James... eu juro que...

— Nem perca o seu tempo... — disse ele segurando meu braço, desta vez mais cauteloso, como se eu ainda estivesse pegando fogo — vamos, rápido.

E foi então, quando deixei meu corpo ser guiado por James que eu soube. O que ele realmente era.

Devasta-meOnde histórias criam vida. Descubra agora