𝐏𝐞𝐨𝐩𝐥𝐞'𝐬 𝐌𝐞𝐝𝐢𝐜𝐢𝐧𝐞

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𝙲𝚊𝚙𝚒𝚝𝚞𝚕𝚘 𝙸
𝐄𝐥𝐢𝐳𝐚𝐛𝐞𝐭𝐡 𝐖𝐞𝐛𝐛𝐞𝐫 - 𝐍𝐚𝐬𝐜𝐞𝐫 𝐝𝐨 𝐬𝐨𝐥

Chamam-nos de covardes, porque queremos viver. No entanto, o que não vêem, esses tais seres superiores, é o nosso esforço árduo de nos manter vivos. De manter aquela essência, mesmo pequena que seja, de existir, dentro de nós. Lutamos constantemente para poder respirar durante o dia, durante a noite, mas mesmo assim chamam-nos de covardes por querer ter uma vida. Por querer viver. Então, quando este conflito terminará? Quando todos nós, seres inferiores, deixarmos a ideia de existir no passado e começarmos a acreditar que o nosso destino sempre foi outro. Sempre foi o oposto. Um destino que terminará na decadência de nós mesmos, até nos transformarmos em pessoas completamente sem princípios, sonhos e objetivos, apenas seguindo ordens de alguém impotente sentado em um trono feito de ouro. Ouro este, pago por todas as vidas das pessoas que vivem ao meu redor.

Os raios do sol embatiam no fino tecido branco que cobria as minhas janelas, deixando-os transparecer até ao meu rosto adormecido. À medida que o tempo passa, a luz que iluminava todo o ambiente começa a ser um incómodo para os meus olhos fechados, fazendo-os abrir para ver todo o meu redor, um edifício pequeno feito de madeira, com somente uma porta e algumas janelas, variadas prateleiras empoeiradas com frascos de diferentes tamanhos e dimensões, em que no seu interior continham ervas naturais e especiarias, alguns continham remédios caseiros que eu mesma fiz, um grande forno feito de argila carmim ao lado de uma cozinha improvisada, uma minúscula mesa com duas cadeiras tortas ao seu redor e, por fim, alguns baús antigos espalhados pelo recinto.

O meu corpo encontrava-se repousado em uma cama rasa e desconfortável, o que me faz suspirar de desgosto por não conseguir noites inteiras. Ergo o meu corpo e caminho em direção a um vestido preso em uma cadeira, o visto por cima da minha camisa interior. Era um vestido antigo da minha mãe, o seu tecido ríspido de cor verde escuro que não aparentava ter muitas nódoas o que me agradava, o seu saiote de uma cor mais clara sobressaia pelo meu decote em um formato semi-coração, as suas mangas largas cobriam ambos os meus braços, aqueciam o meu corpo. Era um vestido simples, nobre de uma camponesa. Era bonito aos meus olhos, para além de ser uma memória viva da mulher que me criou durante anos, até alguém tirar a sua vida. Tirar a minha mãe de mim.

Como em todas as manhãs de Ankasdre, a locomoção da vila começa a ser ouvida: As carroças com os alimentos frescos vindos da terra a passar pelas estradas de pedras da calçada, habitantes a saírem de seus lares e cumprimentarem uns aos outros, as vendedoras ambulantes gritavam o que tinham para a venda nesta manhã.

As manhãs nunca são calmas, especialmente para mim. Todas as manhãs, grupos de pessoas vêm até mim pedindo ajuda e misericórdia para as salvar de uma doença ou angústia que surgiu nestes últimos tempos em suas vidas. Costumam chamar-me de "Mulher cuja medicina sabe", alguns mais rudes atrevem-se a chamar-me de "Bruxa", mas o único facto que eu sei é que, eu consigo verdadeiramente salvar vidas de pessoas inocentes que são torturadas por doença vindo do pecado de um reino, com a mistura única de ingredientes vindos da terra, ou por um tratamento básico de um lavar de pele. A minha mãe também o sabia fazer, alegam eles que foi uma dádiva dada à minha família, todos me procuram tal como a procuravam quando estava viva.

Procuro algo para me alimentar mas nada encontrei - uma memória alcançou-me, eu havia dado tudo o que tinha a alguns membros do povo - alguns crianças que passavam fome pois suas famílias não tinham moedas suficientes para comprar completamente nada, algumas mulheres grávidas que aqui me bateram à porta pedindo água para beber e um simples pão para comer, até alguns trabalhadores da nossa vila aqui vieram suplicando para que lhes desse algo para saciar a fome horrenda que sentiam. Eu fazia o trabalho do nosso Rei, alimentava as bocas dos cidadãos e cuidava deles - eu era a mãe do povo, a salvadora como alguns diziam. A verdade é que eu não tenho comido à semanas para salvar os outros - propriamente teria um lugar, de certo, no céu.

𝐀𝐧𝐤𝐚𝐬𝐝𝐫𝐞 (𝐇𝐢𝐚𝐭𝐮𝐬)Onde histórias criam vida. Descubra agora