4° capítulo

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      Me sento sobre o banco da praça da cidade, observo calmamente as mães passando com seus filhos e o céu nublado que já era rotina em Birmigham, levo o cigarro em meus lábios deixando a fumaça sair.

    Era reconfortante ouvir o som das folhas voando conforme o vento passava e era melhor ainda ter esses momentos a sós, sem máfia, sem vingança e sem ninguém. Apenas eu e minha consciência.

  Não era seguro ficar sozinha em ambientes públicos com uma família doida atrás de mim - ou eu que estou atrás deles - mas para mim isso valia o risco.

    A família era unida, Arthur era o mais fiel, Polly a experiente, ada a idealista e o Thomas era o chefe. O único que poderia se corromper era justamente o Michael. Ele  não é experiente, portanto cairia fácil no meu plano.

— Olha que surpresa.

     Reconheço a voz carregada de sotaque e não me viro para encará-lo.

— Surpresa? Todos tem conhecimento sobre meus péssimos hábitos, Solomons - me refiro ao cigarro, sabia que ele me via como uma mocinha certinha de muito tempo atrás, mas ela já se aposentou a muito tempo e o cigarro não foi a única mudança.

Ele ri nasalado e se senta ao meu lado tomando o cigarro das minhas mãos e levando a sua boca de forma atraente. Alfie é um homem musculoso, e tem seu charme. Ele costuma ser sincero e sabe se divertir.
     Já nos envolvemos um tempinho atrás, mas tinha nos dois tínhamos negócios para tratar e no mundo em que vivemos, os negócios são sempre prioridade.

  — Não é o cigarro Changretta - ele encara o lago na nossa frente e solta a fumaça- mas pela sua guerra com os Shelby's, não esperaria te ver em uma praça ao ar livre tendo a chance de levar uma bala na cabeça.

— Não somos diferentes então, o que você veio fazer em uma praça? Enterrar um corpo em um lugar público é meio difícil.

   Debocho e ele me olha pelo canto de olho.

— Negócios Eva, negócios....

— Já que ficou sabendo do meu assunto com os Shelby's, tem alguma opinião? - quando estávamos juntos, Alfie sempre opinava, e na maioria das vezes estava certo. Sinto saudades das nossas conversas e do sarcasmo que sempre tinha em sua voz, não tínhamos nada sério ou assumido, era sem compromisso e isso era o especial.

— Nah, o que posso dizer é que dessa vez você escolheu um adversário a altura Eva, se for pra brincar com fogo, então é melhor se queimar.

    Continuamos observando o lago e sinto seus dedos colocando meu cabelo atrás da orelha e passando levemente pela minha bochecha.

— E como você está Alfie? E a padaria? - O gângster é dono de uma destilaria ilegal de rum, que ele disfarçada de padaria, em Camden Town. Ele era respeitado de fato e eu sabia, mas queria saber sobre sua vida pessoal, sobre o alfie, só o meu alfie.

   Ele entende a pergunta por que tira a mão de mim e solta um suspiro jogando o cigarro longe.

— A mesma coisa Eva, a mesma coisa. Por que não podemos voltar a ser o que éramos?

   Ele me mandava cartas algumas vezes pra falar do seu novo cachorro ou de alguma garrafa de rum que ele achava a melhor de Londres e sempre me convidava. A resposta era sempre a mesma, não. Eu quase me apeguei a ele uma vez, e não queria que isso acontecesse, negócios, são sempre os malditos negócios.

— Alfie, não vamos voltar nisso.

— Eu sei que você também sente falta, e eu sei que você virou outra pessoa mas acredito que a Eva que eu conhecia ainda esta aí - ele aponta pra mim e logo depois mexe na barba, e céus como eu amava isso.

— Não vou discutir isso, nos tínhamos un trato, você focaria na sua destilaria e eu na máfia, foi benéfico para os dois lados e se quisesse mesmo que eu voltasse não me deixaria ir.

— Você dificulta as coisas pra caralho, sabia?

— Você sabia disso quando me conheceu - dou um sorriso irônico e ele alterna o olhar entre meus olhos e meus lábios

   Em um movimento rápido ele segura minhas bochechas com os dedos e me beija ferozmente, sinto o metal frio dos anéis entrar em contato com a minha pele quente. Sua mão se abre na minha mandíbula, controlando o beijo como já era de seu costume.

   Por falta de ar nos separamos e nossas testas continuam coladas, ele me encara com seus olhos claros e sua barba ainda roçando meu rosto.

— Pode falar mentir o quanto quiser Changretta, mas enquanto seu corpo continuar te denunciando eu ainda vou continuar insistindo.

   Ele se levanta e faz menção em ir embora.

— Te pego as 19h hoje.

    E assim ele sai, sem ao menos perguntar se eu queria ou qualquer outra coisa. Ele era autoritário, e esse era o ponto que eu mais gostava.

   Acendo outro cigarro ainda tentando digerir o que acabará de acontecer. Gostava de sair com ele por se experiente, ele me ensinou coisas que eu nunca poderia imaginar e me ensinou a ser confiante. E confiança, talvez seja a pior arma que uma pessoa pode ter.

PerdiçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora