Tragédia e tédio

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O começo do fim do mundo foi um caos. Foi um medo maior do que os outros medos que já conhecíamos. E esse caos era barulhento, era impossível de não se notar. Mas agora as coisas estão mais quietas. E nós só esperamos que esse possa ser um sinal para o final do fim do mundo.

Aqui é quieto. Tudo em janeiro é quieto. Os alardes são poucos, e as euforias também. Mas o caos ainda existe, e é silencioso e traiçoeiro. As lágrimas que caem em janeiro são mais melancólicas, elas caem em silêncio tal qual a garoa que não para em São Paulo. E ninguém repara. E quando alguém chega; e quando alguém vai embora: ninguém viu.

Tragédia e tédio. Os sorrisos estão guardados para os histéricos do outro lado. Aqui só se sente coisas amenas, mesmo que não tão animadoras, são tristezas que caem à conta-gotas se comparadas aos maremotos de outrora. Mas os maremotos de outrora ainda nos deixam um grande estrago.

É. Do passado tudo se sabe. Isso é fácil, apreender horas e detalhes de tudo o que já foi. Todo mundo sabe do que já foi. O difícil é conviver todos os dias com o mistério do minuto seguinte. O difícil é pensar sempre na própria fortuna ou na falta dela. O que passou é horrível. Sempre será. Sempre lembrarmos. Mas como iremos nos lembrar do que ainda não foi? Não tem como saber...

É preciso saber esperar agora, como nunca se esperou antes. E ao mesmo tempo, é preciso não esperar muito das coisas, das pessoas, e das chuvas. E por mais que eu peça por misericórdia, e como eu peço, eu fico aqui: no vento, na lama, no tédio, tentando não pensar no que vem depois, só me preocupando em encaixar as palavras certas depois da vírgula, para que eu possa, por fim, salvar minha cabeça.

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Créditos da foto: Nirav Patel

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