Segundo passo: (Des)rejeitar um gesto

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“Chato” era a única palavra que Luffy usaria para descrever aquele momento, aquele momento terrivelmente tedioso. Detestava aulas, principalmente as aulas de reforço; já eram horríveis normalmente, ficar depois delas para ter mais era dez vezes pior, principalmente se considerar que sua situação de notas e faltas estava tão feia que precisava ir para a escola com o punho esquerdo e o tornozelo direito enfaixados com órtese e bota ortopédica e ainda doloridos apenas para recuperar o tempo perdido e ver se conseguia melhorar sua condição precária no milagre de algumas semanas.

Mas, claro, a culpa era toda sua. Sabia que em breve teria a semana de provas finais e estava procrastinando as – chatas – obrigações e gastando seu tempo para ficar de bobeira com os amigos, mesmo com seu boletim pintado de vermelho. Agora que havia chamado a atenção do seu avô por se machucar “fazendo estripulias” ao invés de estar em casa estudando, era lidar com a obrigação de ficar na escola no período da tarde.

— Hmm... Que chato... – Um murmúrio frustrado deixou frouxamente seus lábios enquanto deslizava na cadeira como se estivesse derretendo.

O tique-taque do relógio era irritante, as palavras no quadro eram praticamente ilegíveis para si e aquele assunto sobre as palavras “mitose” e “meiose" soava tão feio que nem queria saber o resto.

Ao menos havia ele ali. O representante do grêmio estudantil, único aluno que tinha capacidade e, por um milagre, disponibilidade para substituir o professor Marco – Abacaxi para Luffy –, de Biologia, em sua ausência por um imprevisto naquela tarde de quinta-feira.

Era fato que não havia prestado atenção em quase nada até o presente momento por seu imenso desinteresse com os estudos, porém, uma grande parcela da sua distração era também motivada pelo seu pseudo professor particular temporário.

Adorava ficar observando como era perceptível a maneira que ele havia mudado desde quando era criança, tanto na aparência, quanto no jeito de agir. Quando o reviu, apenas o reconheceu pelo icônico chapéu felpudo, mas assim que seus olhos recaíram sobre ele surpreendeu-se em não ver mais o mesmo garotinho tímido de sempre, se escondendo entre seu moletom e grande chapéu, e sim um jovem mais velho e seguro de si, com tatuagens legais e uma personalidade notória e distinta das demais – apesar de considerada estranha –, que sabia se impor.

Ele lhe pareceu um cara legal, chamando sua atenção de imediato. Saber mais sobre o jeito reservado e cauteloso, mas ao mesmo tempo um tanto atrevido e estressado; que compartilhava alguns gostos parecidos consigo, apesar da personalidade quase oposta a sua; e dele ser uma pessoa boa e prestativa, por mais insensível e frio que transparecesse ser, foi o que o deixou ainda mais interessado por ele. E ainda havia a beleza que, conquanto não ligasse de fato para questões de aparência, era, e muito, afetado pela beleza surreal dele.

— Mugiwara-ya... – O apelido que ele lhe dera ainda crianças foi a única coisa que captou das suas palavras ao se remexer na cadeira, tendo um lapso de consciência momentâneo.

Entretanto, era bem mais interessante mirar a boca dele enquanto coisas chatas passavam por ela e sentia suas bochechas esquentarem com a ideia e vontade que surgia de tocá-la, com a sua, assim como nos filmes que tinha que assistir quando perdia no jokenpô para a Nami; o que ainda lhe era estranho, visto que nunca havia sentido sensações ou desejo de estar próximo de alguém daquele jeito antes. Ainda havia o coração palpitando rápido, assustando-o, o nervosismo que o fazia travar em vários momentos e o frio na barriga sempre que o via ou falava com ele, aumentando seu desejo de querer estar ao seu lado.

— Mugiwara-ya! – A voz rouca tão forte a sua frente, no entanto, finalmente o tirou do seu devaneio no mundo das ideias. Logo deparou-se com a face irritada do moreno que sentava-se sobre a mesa, suspirando ao encará-lo. — Céus, isso aqui não vai dar em nada, você não prestou atenção em uma palavra sequer que eu disse!

Como (des)rejeitar alguémOnde histórias criam vida. Descubra agora