IV - casal fake

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Letícia tentou manter os olhos abertos e focados diante do mar de papéis e anotações, contudo, sua mente oscilava entre a fadiga e a necessidade de cumprir as metas acadêmicas. O calor sufocante da sala de estar em conjunto aos dedos doloridos, por tanto escrever, não dava espaço para a absorção do conteúdo.

— Não sei vocês, mas eu tomaria uma cerveja. — Jade jogou o corpo para trás, encostando nas costas do sofá macio. — Não vejo a hora de me livrar dessa matéria dos infernos.

Jana respondeu qualquer coisa que Letícia não prestou atenção. As teclas do laptop, sendo agredidas pelas unhas extremamente longas e pontudas da amiga, faziam a cabeça da trevosa latejar em dor. Um bocejo contido escapou denunciando mais uma vez o quão fodidamente cansada estava. Diferente das amigas, que não precisavam trabalhar e ainda tinham o sábado inteiro para fazer o que quisessem, a criatura precisava acordar cedo mesmo no fim de semana, sair do Brás e praticamente viajar até o Borba Gato de metrô, o que nunca foi uma tarefa fácil. Os cabelos rebeldes caíram sobre os olhos e Letícia mataria por uma cerveja.

— Minha parte está quase finalizada, só preciso ver como está a formatação no laptop de vocês — disse, enviando o arquivo no grupo.

— Sério, não sei como a Lets consegue fazer tudo pelo celular, eu sou inútil sem meu Macbook. — Jana manteve os olhos castanhos focados na tela enquanto falava. E de soslaio, a trevosa notou que a amiga buscava um pack de cerveja.

Apesar das gêmeas não se importarem em custear boa parte dos rolês por acreditarem que "quem quer dá um jeito", Letícia não sentia-se bem com a ideia de nunca poder contribuir. Pelo menos uma vez ao mês, pegava parte das economias e se dava o direito de sair para beber ou comer em algum lugar diferente. Só que nos últimos meses as coisas ficaram complicadas a ponto de precisar usar a reserva para custear coisas básicas.

— Vamos fazer uma pausa? Acredito que o gostoso do Casablanca não vai se importar se pararmos algumas horas para conversar. — A cacheada, que continuava concentrada em sua busca pela cerveja, enrolou uma mecha dos cabelos vermelhos no indicador. — Aliás, você ainda não nos contou como foi o seu encontro com ele. Se é que teve um encontro.

Jana olhou a amiga por cima da tela ampla, buscando qualquer indicação de mentiras. Letícia nunca foi uma boa mentirosa e no fundo sabia que não guardaria segredo sobre todas as saliências que aconteceram na noite anterior. Uma branda gota de suor dançou pela tez, se alojando na franja que já estava com aspecto de oleosa.

— Ele me levou para um bar alternativo de coquetéis — respondeu, sem parar de copiar os pontos importantes de sua pesquisa e involuntariamente, girou os pulsos. — E por incrível que pareça, Bernardo é bem diferente fora da sala de aula.

— Diferente como? Porque o que aquele velho tem de saboroso, tem o triplo de exigente!

— Ah, Jana — um suspiro escapou quando percebeu que copiou a parte errada. — Você diz isso por ele pegar no seu pé, mas eu também pegaria se fosse ele. Afinal, você passa mais tempo dormindo do que estudando.

O contraste entre ela e as amigas sempre foi gritante. Enquanto as gêmeas cursavam administração para trabalhar na empresa do pai, apenas para ter um diploma no currículo, Letícia escolheu o curso na ilusão do emprego fácil e bem remunerado. Precisava ralar para cacete no intuito deser a melhor da turma, não apenas por um status qualquer, mas sim por precisar manter a bolsa.

— Como você é sem graça! Estava apenas brincando, oras! — se defendeu e girou a tela para que Jade e Letícia escolhessem algo para comer. — Conta essa história direito.

Letícia puxou as pontas duplas de uma das tranças laterais, que quase desapareciam sob a franja reta.

— Não sei explicar, porque bebemos pra caralho! Só lembro de estar falando alguma coisa sobre idade e depois tive um flash e quando dei por mim, meu pé estava roçando no pau dele.

LETICIA | CRIMES QUE SEDUZEM VOL IOnde histórias criam vida. Descubra agora