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Esquisito da rua 6, quarteirão 6, casa nº 6


— Está com soninho esquisitão? — escutou a voz grossa de um dos seus colegas num tom debochado.

Jack ainda estava confuso com como teria chegado ali, ele tinha certeza que tudo aquilo foi real demais para ter sido apenas um sonho, mas como ele chegou a escola?

— Ele mora na rua 6, deve ter vendido até a cama… — disse outro, atiçando ainda mais as gargalhadas da turma.

— Eca, Jack… — reclamou uma de suas colegas na carteira ao lado, fazendo uma expressão enojada ao ver um líquido amarelado escorrer pela carteira dele. — Isso é xixi? 

— Quando pensamos que não tem como ficar mais esquisito, esse garoto sempre dá um jeito de se superar. — mais gargalhadas foram escutadas e como sempre os professores apenas observavam e nada faziam.

Jack se levantou de imediato ainda se mostrando confuso com o que acontecia, pegou a sua mochila pela alsa e saiu correndo da sala.

Agarou a borda do gorro e puxou para baixo, cobrindo os olhos enquanto corria pelos corredores vazios, até que se trancou no banheiro.

— Por que isso está acontecendo comigo? — indagou a si mesmo escorado na porta, deslizando por ela até sentar sobre o chão. — Como isso aconteceu?

'Eu avisei que continuar só te causaria mais dor.

Perdeu completamente os movimentos do seu corpo ao escutar aquele sussuro e conseguiu apenas virar a cabeça para fitar o grande espelho que cobria toda a parede a sua frente, onde o reflexo do mesmo ser demoníaco que ele avistara no parapeito estava o encarando com desdém,  esbajando um sorriso maldoso.

Fechou os olhou de imediato e afundou o rosto nas pernas. 

— Isso não é real… É apenas minha imaginação.

'É, continue se iludido que é só imaginação.

— CALA A BOCA, VOCÊ NÃO É REAL!!!

— SR KACKSON! — Jack abriu os olhos de imediato, chocando-se ao erguer a cabeça e se deparar com a imagem do seu diretor, distanciado dele apenas pela mesa retangular com diversos documentos sobre ela e um computador. — Eu não suportarei as tuas loucuras, atente-se ao tom da tua voz.

— Diretor Velgat? — soltou automaticamente, analisando a figura do diretor.

Seu corpo gorducho coberto por um terno preto, as banhas no seu pescoço eram aquecidas pelo cachecol cinzento nele enrolado, óculos de vista com lentes retangulares estavam posicionados diante dos seus olhos negros que encaravam o Jack com desprezo e a sua falta de paciência era demonstrada pelos seus lábios contorcidos.

— Primeiro desrespeita uma professora, mija nas calças dentro da sala de aula e como se já não fosse o suficiente agora ousa me desrespeitar. — Jack tirou a sua atenção sobre o homem calvo e espantado olhou para as suas pernas, notando que agora vestia uma calça de pano azul escuro e debaixo da jaqueta escura vestia uma camisa de cor azul ciano. — Eu não sei nem por que ainda suporto a tua presença nesta instituição renomada, vocês da rua 6 deveriam permanecer por lá.

As suas palavras de desdém sequer eram escutadas por Jack, já que ele tentava entender como raios chegou àquela sala? Como trocou a roupa? Quando fez tudo aquilo?

— A-A quanto tempo estou aqui?

— Você está ao menos me escutando? — indagou com certa raiva em seu tom, curvando a cabeça após um suspiro, para então massagear as têmporas com seus dedos. — É nisso que dá acolher a escória, eu avisei para a proprietária que isso não era boa ideia mas ela nunca me ouve.

Seus olhos quase saltaram para fora do rosto ao mesmo tempo que seu coração pareceu querer arrombar o seu peito quando o desespero voltou a tomar o seu corpo fazendo a mandíbula inferior tremer freneticamente obrigando os dentes inferiores a se chocarem repetidamente contra os superiores.

'Eles são todos meus, você nunca terá descanso, garoto…

Novamente o ser demoníaco de antes surgiu. Ele colocava as mãos sobre os ombros do diretor, mas Simon parecia não sentir o toque dele, nem mesmo quando o demônio acariciou sua cabeça careca.

'Pelo menos não enquanto ainda estiver vivo.

— Eu estou suspenso? — perguntou abaixando a cabeça na tentativa de ignorar o ser, na esperança de se ver livre daquele lugar nem que seja por alguns dias.

'Por que raios eu faria isso? Não existe maior castigo para você que te manter aqui, tenho a certeza que cedo ou tarde você irá desistir de vir aqui e eu me verei livre de você.

O coração do Jack martelava desesperado em seu peito, sua respiração estava acelerada e seu corpo suava mesmo naquela temperatura baixa.

Ele não entendia como aquilo era possível, como o diretor estava repetindo exatamente as palavras ditas pelo ser?

— Ou melhor, você poderia morrer garoto! — ergueu a cabeça em choque, visualizando o sorriso de satisfação no rosto do ser que crusava os braços no topo da cabeça do diretor, dizendo as palavras que eram repetidas pelo calvo. — Isso, morre de uma vez garoto, faz isso e eu garanto que todos serão mais felizes.

'E então? O que você fará, garoto?

Jack de imediato pegou a sua mochila e saiu correndo dali, abrindo a porta abruptamente deixando com que ela se fechasse sozinha, ele corrida tão rápido que sequer escutou o som alto que a porta produziu ao se fechar.

— Eu queria poder expulsar esse garoto. — afirmou o diretor folheando a documentação do Jack. — Jack Kackson, o esquisito da rua 6, quarteirão 6, casa número 6.

•••

_ O que eu ainda estou fazendo aqui? _ Jack se questionava em pensamentos, escorado na parede da salinha escura cheia de materias de limpeza, sentado, abraçando suas próprias pernas. _ Esse lugar não é para mim.

— Ou melhor, você poderia morrer garoto! Isso, morre de uma vez garoto, faz isso e eu garanto que todos serão mais felizes.

— Talvez ele tenha razão, com certeza todos ficarão felizes sem mim. — ele já estava com um caco de vidro na mão, caco esse que ele apertava na sua mão direita, o apertando tão forte que cortou a palma da sua mão, sangrando em seguida enquanto ignorava a dor. — Será que depois disso eu terei descanso? — dobrou ainda mais o cotovelo até que a ponta do caco de vidro se chocou contra o seu pescoço, deixando um leve corte na pele negra do rapaz, por onde escorreu algum sangue. — É, certamente eu irei descansar…

Finalmente aceitou sua morte, fechou os olhos e afundou a cabeça entre as pernas, começando a empurrar lentamente o caco contra o seu próprio pescoço. 

Estava tão imerso que ignorou até o sino já sem nenhum pensamento em mente, apenas uma plena paz que ele procurava a tanto tempo.

Estava prestes a cravar o vidro no seu pescoço, mas foi interrompido no mesmo instante quando sentiu algo arranhar a sua mão.

Abriu os olhos e já jogou longe o caco de vidro junto com o rato que arranhhava a sua mão na tentativa de se apoiar nela.

— O QUE VOCÊ FEZ? — gritou com o rato, vendo o mesmo parar sobre duas patas e o encarar com curiosidade, tombando a cabeça para a direita. — Me desculpe, você nem deve ter a mínima ideia do que eu tava fazendo né!?

Enxugou as poucas lágrimas que começavam a escorrer em seu rosto, se levantou e abriu levemente a porta, permitindo que alguma luz invadisse o local, antes de então sair, deixando a porta atrás de si se fechar.

"Ainda não é tempo de você morrer, garoto.

Jack foi incapaz de escutar a voz grossa do rato que ecoou por aquela salita assim que a porta se fechou atrás dele.

JACK KACKSON: O solitário caçador de demônios - [Saga Do Destino]Onde histórias criam vida. Descubra agora