Garota do Bosque

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Capitulo 1 - De: Carlan Para: Amy


Querida Amy, e se eu te contar uma grande novidade? Tenho certeza de que ficarás surpresa com o que fiz. Vou contar todos os detalhes, do jeito que sei que você adora (e eu também).

Este dia começou de forma tumultuada, com o eco de um pesadelo persistente que me assombrou. Sua realidade ilusória me envolveu em arrepios, despertando-me em lágrimas. Novamente, revivi a visão sombria de meus pais, suas feições obscurecidas, cenários em chamas, e o caos ensurdecedor de pessoas em fuga. Incapaz de discernir entre o sonho e a vigília, a agonia dilacerava minha mente. Após essa noite inquieta, renunciei ao sono e dei início ao dia antes mesmo do sol tingir o horizonte. No entanto, mesmo nas profundezas do norte gelado da Corte Invernal, onde a luz do sol é um luxo fugaz, persisto em registrar cada detalhe. Essa prática me resguarda da monotonia de nossos dias, onde minha única companhia é a caçada solitária e o silêncio sereno da neve caindo.

Então, vamos lá.

Após o impacto da experiência, decidi preparar água para um banho reconfortante. Enquanto o fogo a lenha crepitava, segui com minha rotina de higiene bucal, uma prática que meu avô humano insistia ser fundamental, especialmente para uma "criatura da realeza" como eu. Até hoje, não compreendo completamente o que ele quis dizer com isso, mas sei que irritava profundamente minha avó. Os costumes humanos sempre foram um ponto de discórdia para ela; afinal, os seres feéricos não enxergam valor em atividades que poderiam ser resolvidas facilmente com magia.

Pondero sobre o uso da magia, mas as lições de meu avô me ensinaram a viver sem ela. Mesmo ao prender meus cabelos, alguns fios escapam, como se tivessem vontade própria. Enchi a banheira, despi-me lentamente e mergulhei, buscando alívio do terrível pesadelo. Anseio por pistas, mas, como sempre, elas me escapam, deixando-me perdida em um mar de incertezas.

Saí da banheira assim que a água começou a esfriar, tornando-se desconfortável. Naveguei pelo corredor até meu quarto, mas antes de chegar, parei diante da porta dos quartos dos meus avós. Um impulso irresistível me fez desejar espiar lá dentro, na esperança de encontrá-los ainda na cama, aguardando meu chamado para o café da manhã, como faziam todos os dias desde que assumi os cuidados da casa. Cada vez que giro a maçaneta, sou inundada por memórias de sua presença calorosa, mas também é uma dolorosa lembrança de que não estão mais aqui comigo, assim como meus pais.

Fechei a porta do quarto com certa relutância, como sempre. Meu coração parece se despedaçar a cada vez que saio daquele lugar; a dor da ausência deles ainda é aguda, Amy. É evidente que não me permito esquecer as mágoas, mas aprendi a conviver com elas, a ignorá-las. Deixei para trás as lembranças dolorosas e segui para o meu próprio quarto para me vestir. O mau humor habitual me envolveu, como costuma acontecer após um retorno aos cantos sombrios do passado. Mesmo assim, persisti, como sempre faço. Depois de preparar meu café da manhã, cuidei das tarefas domésticas e utilizei magia para secar as roupas - uma prática comum na Corte onde resido. Sei que o vovô não se importaria. Com todas as obrigações domésticas cumpridas e a primeira refeição do dia tomada, parti em busca do almoço. Não esperava encontrar muito, mas acabei sendo surpreendida. E você ficará feliz em saber que nossos dias prometem se tornar bem movimentados.

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Calço minhas velhas botas, já reparadas inúmeras vezes na tentativa de economizar. Antes de partir para a cidade, providencio pães e mantimentos de longa durabilidade. Dessa forma, evito viagens frequentes, otimizando meu tempo e dedicando um dia inteiro às tarefas que se acumulam

Contos de uma Grã FeericaOnde histórias criam vida. Descubra agora