Bola de neve

502 51 47
                                    


Depois do fiasco que foi o final da noite do jantar, as coisas em casa não podiam ficar mais estranhas e desconfortáveis. Naquela manhã de sábado, o dia não estava ensolarado, os passarinhos não cantavam nas árvores e a casa estava tão silenciosa quanto um velório.

Eu acordei muito cedo, passei a noite acordado sentindo a ardência da mão pesada do meu pai sobre o meu rosto, e eu sentia vontade de chorar sempre que lembrava. Era como se meu pai tivesse desaparecido e um cara completamente idiota tivesse sido posto em seu lugar.

Quando eu desci as escadas e dei de cara com ele, debaixo de uma coberta verde claro e fina, ele parecia tão miserável quanto um mendigo na rua. Eu senti raiva ao lembrar do tapa, e mais raiva ainda ao lembrar o motivo.

Fui pisando discretamente para não acorda-lo, e consegui chegar até a cozinha sem muito esforço, fiz o que eu tinha levantado para fazer, que era beber água. Mas quando dei meia volta para voltar para o meu quarto ele estava lá, parado na minha frente com os braços cruzados e de pijama, os cabelos desgrenhados, os olhos fundos e uma cara nada amigável, mas que não parecia irritada. Era mais como se estivesse indiferente e não ligasse realmente para o que tinha acontecido.

— Vamos conversar, filho. — Ele disse.

Meu peito apertou e eu senti novamente vontade de chorar, mas apenas fiz menção de passar por ele e subir para o meu quarto. — Podemos conversar outra hora? Pai. Está muito cedo, eu queria dormir mais um pouco.

Mas antes que eu continuasse a caminhar, ele segurou o meu braço dizendo: — Continua com o mal costume de falar sem olhar nos olhos das pessoas. Nós precisamos resolver o que aconteceu.

Eu pensei em evitá-lo, se ele não tivesse me parado ali eu realmente não iria falar com ele, e de fato, eu não tinha coragem para encarar os olhos das pessoas, eles me assustavam, me deixavam tonto. Foi quando lembrei das palavras de Sunoo, me chamando de covarde. Bem... Ele estava certo, afinal. Eu realmente era um covarde.

Era confortável, então porque eu deveria enfrentar as pessoas, ou as coisas? Porque eu deveria mudar? Porque eu deveria me tornar alguém mais consciente sobre o mundo, quando coisas assim acontecem com as pessoas que as fazem? O que eu ganhei por enfrentar meu pai foi uma bofetada no rosto. O que Sunoo ganhou protestando contra a derrubada daquela árvore? Nada. Fizeram chacota dele. Todos na escola o chamaram de esquisito, de estúpido.



"Você é um covarde, Sunghoon"



Eu sabia que eu era, eu sempre soube. E eu estava bem com isso. Porque eu deveria mudar agora? Eu esperava que algo de especial acontecesse se eu resolvesse me tornar alguém diferente?

Pensei nas pessoas próximas a mim. Heeseung Hyung era como Sunoo, Jake era como meu pai. Talvez eu fosse como minha mãe. Mas será que eu teria a coragem de chamar os Kim's para jantar mesmo depois de anos de desprezo, depois de tudo que eu fiz e falei sobre Sunoo e sua família? Não. Definitivamente não. Minha mãe era corajosa. Não era como eu.

Então eu me vi nele. Eu era como ele. Eu tinha aprendido com ele. Com meu pai.

— Não me arrependo do que eu disse. — Foi o que eu falei. Antes de soltar o meu braço do seu aperto com certa brutalidade. Subindo correndo pelas escadas e me trancando dentro do quarto.

Eu não queria conversar com ele, eu não estava disposto a perdoa-lo naquele momento. E eu não o faria.

Eu sou patético, sei disso muito bem. Eu sou influenciável e acomodado. Deixo que os outros me usem e me moldem. Faço somente o que os outros querem e esperam de mim. Eu tinha medo de não ser aceito pelos outros? Porque mesmo eu queria tanto não ser diferente?

FLIPPEDOnde histórias criam vida. Descubra agora