Capitulo 1

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Kaira - "Pura"

510 anos atrás, 1ª Guerra contra Hybern

Deusas do campo de batalha, era assim que eram chamadas. Algumas das guerreiras mais temidas que já conheci, agora estavam espalhadas pelo chão, completamente sem vida.
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Ando pela guerra à procura de alguém, meu corpo não aguenta o peso das asas e eu caio, respiro fundo, meus ferimentos estão doloridos, me ajoelho no chão de sangue e olho ao meu redor.
Que estrago penso.

Haviam Serafins e Ilyrianos feridos por todos os lados, junto de curandeiras tentando amenizar o estrago, o cheiro metálico impregnava em minhas narinas, abaixo minha cabeça e choro enquanto caminho mancando entre os corpos, deixo as lágrimas caírem por cada irmã perdida, cada valquíria que foi morta.

Sabia que a morte delas não era culpa minha, eu precisava liderar o meu exército, mas se eu estivesse com elas talvez seria diferente.

Nem o silenciamento mental mais avançado que acalmaria meus pensamentos, precisava achar algum companheiro vivo. Com lágrimas nos olhos grito por nomes perdidos, olho por todos os lados e fiscalizo todos os corpos possíveis.

Estava tão esgotada e absorta aos meus pensamentos que não reparei no farfalhar de asas na proximidade.

Sinto braços fortes me segurando, me assusto e preparo uma reação, mas um cheiro familiar preenche minhas narinas.

— KAIRA - Rhys me sacode para me tirar do transe — Pela Mãe, você está viva, estávamos te procurando por todo lado! Venha seu pai e seu irmão estão esperando você no acampamento.

Saio de seu abraço e olho para ele, seus olhos azul-violeta estavam marejados. Ele apresentava um grande corte na testa e no lábio, seu couro estava rasgado na parte abdominal, porém, a pele abaixo estava lisa, provavelmente já tinha se curado. Não vi nenhum sinal de armas, provavelmente saiu na hora do desespero pra me procurar e acabou esquecendo. Bastardo distraído, penso.

— Certo... — digo paralisada

Agradeço ao caldeirão por um momento. Meu pai e meu irmão estavam bem. Isso era o que mais importava.

Seguro sua mão, ele nos atravessou ao acampamento improvisado.

Barracas estavam espalhadas em uma clareira não tão longe do campo de batalha. Era óbvia a insalubridade do local, mas nada com que não estávamos acostumados em períodos de guerra.

Sou recebida por um abraço forte de Cass, resmungo pelos meus ferimentos não curados. Ele solta uma de suas gargalhadas rotineiras.

— Pare de reclamar Kai, pelo menos está viva.

Ele me acompanha até uma cabana menor, a magia presente no local me preenche, o interior dela era extremamente aconchegante, entrando em contraste com o seu exterior. A iluminação por velas, os tapetes muito bem escolhidos e organizados, móveis dignos de um castelo. Solto uma leve risada, essa extravagância com certeza era obra do meu pai.

Parado na mesa central estava Edgar, meu irmão gêmeo. Seus cabelos tão claros quanto os meus estavam grudados na testa devido ao suor, sangue e poeira, sua armadura de escamas, antes prateada, agora possuía um tom amarronzado. Apesar da sujeira, suas asas estavam intactas, brancas como uma nuvem. Ele estava tão concentrado analisando um mapa de Prythian que não reparou minha chegada.

— Ed..

Ele levanta sua cabeça de supetão ao escutar minha voz e me encara como se eu fosse um fantasma. Lágrimas começam a escorrer por seu rosto, deixando rastros entre a poeira presente nas suas bochechas.

Edgar é o mais novo, mas fomos criados como uma unidade. Apesar de ser a herdeira do trono do Grão Rei, meu irmão tem muita influência nas minhas decisões políticas. Eu e ele somos opostos, eu sou o cérebro, ele o coração, apesar das brigas por nossas divergências, nós nos completamos. Isso nos faz ótimos líderes na hora da guerra.

Ele se aproxima devagar e me envolve em seus braços, tão delicadamente, como se eu fosse quebrar.

— Como você está?

— Eu estou bem - minto com um sorriso amarelo

Me afasto dele e sento na mesa redonda.

— O que aconteceu com as Valquírias, Kai? - Cassian pergunta sentando em minha frente.

— Estão mortas Cass, acredito que todas estão, eu ainda não consigo entender como tudo isso aconteceu. Tanwyn estava na linha de frente, não tem como elas todas terem sido massacradas como elas foram na liderança dela. — Ele assente com a cabeça, sei que sentiu a perda de Tanwyn. Eles estavam tendo um caso, aparentemente estavam começando a se apaixonar. A partir deste momento eu já conseguia sentir as lágrimas escorrerem mais uma vez — O que mais me magoa, é que eu não estava lá, não tive nem a oportunidade de me despedir de nenhuma delas. Não imagino o desespero que elas sentiram na hora do ataque, para mim não faz sentido, não dá para aceitar que as guerreiras mais fortes que eu conheci estão estiradas no chão, todas sem vida.

Com certeza foi uma perda enorme, uma desvantagem em batalha causada por algum erro ou imprevisto, isso nós nunca saberemos.

Sinto mais uma presença adentrando no local, uma presença escura e serena. As sombras brincam com meus fios de cabelo soltos, e correm pelo meu corpo. Sempre achei engraçado essa atração que elas tem por mim. Olho para trás e vejo Az. Corro para seus braços, ele me segura firme.

— Como você está? Fiquei preocupado com você. - pergunta colocando uma mecha de cabelo rebelde atrás de minha orelha e secando o resto de choro que ainda tinha em meu rosto. Azriel sempre foi meu melhor amigo, e minha paixão secreta...

— Estou bem, só preciso respirar um pouco e descansar — dou um sorriso, ele retribui — E você ?

— Bem também, quase perdi minha cabeça algumas vezes, mas nada demais — Ele responde rindo, seu rosto se fecha aos poucos  — Fiquei sabendo sobre suas companheiras, sinto muito.

Ele deposita um beijo em minha cabeça enquanto eu a apoio em seu peito sentindo seu cheiro. As sombras continuam brincando com meus fios. Eu não tinha mais tempo para lamentações, era quase uma rainha, não tinha o direito do luto.

— Então — Cass aproxima-se nos interrompendo— O que faremos?

— Eu não sei vocês, mas eu e Kaira precisamos encontrar nosso pai para saber o que foi decidido na reunião dos Grãos Senhores. — Reviro meus olhos, não estava afim de ter contato com aqueles machos hoje.

— Acho que querem independência das cortes, Ed— digo — Não querem mais a influência de um Grão-Rei.— Meu pai era o Grão Rei de Prythian e outros territórios, já havia um tempo que estava planejando a independência pacífica de Prythian.

— Não sei Kaira. Se ele aprovar essa independência significa que não teremos mais tanto apoio para próximas possíveis guerras, nosso exército pode até ser bom mas é Alfheim que garantiu nossa vitória. Sem contar que as cortes ficariam desunidas. Isso me preocupa. — Az diz receoso, e Cassian concorda.

— Eu entendo sua preocupação, mas meu pai ama esta terra, mesmo com a independência ele não abandonaria o povo daqui. E, se algum dia eu assumir o trono de meu reino, também não vou deixar vocês.

Antes que Az responda Rhys entra na cabana.

—Kaira, Ed, seu pai os aguarda.

Corte de Sol e NoiteOnde histórias criam vida. Descubra agora