"You searched the world for something else
To make you feel like what we had
And in the end, in Wonderland
We both went mad, oohh"- Wonderland - Taylor Swift (1989)
Quando Alycia se dispersa olhando para a janela e as gotas de chuva que batem ali, fica tentando não pensar no sufocamento que sente em seu peito. Ignorando o filme já visto outras 100 vezes, mas que agora via com a sua melhor amiga, fica olhando para a paisagem lá fora que agora estava borrada pelo estado temporal.
A garota ao mesmo tempo que se ressentia por ficar ali presa sem poder nem ir até o outro quarteirão onde sua melhor amiga morava, estava aliviada e grata por todos que amava e se importava estarem vivos, não bem, mas vivos. Na atual situação mundial não teria como ninguém estar bem, e acreditava que não ficariam por mais alguns anos. O fato de o natal já estar quase batendo a porta era surreal para Alycia imaginar.
Se fechasse os olhos poderia jurar que ainda era o começo de fevereiro e ela estava começando o ensino médio, conhecendo novas pessoas e fazendo novos amigos. Era para ser o ano que ela teria mais liberdade para finalmente sair em rolês e passeios, na verdade ela vinha ansiando por isso.
Até que depois do carnaval o Brasil e o resto do mundo resolveram se juntar e destruir seus planos para aproveitar a pré adolescência. Não era justo, e ela levava como uma afronta pessoal o fato de todo o mundo colapsar ao mesmo tempo com um vírus de carga mortal que até o presente momento não tinha cura.
Injustiça que ela se visse no auge dos seus 15 anos, trancada em casa, tendo que inventar ideias e hobbies para passar o tempo. Isso sem falar que se via obrigada a estudar em home office por conta do colégio, e ela realmente não estava aprendendo nada nesse meio tempo. As aulas eram chatas, ela não conseguia focar em olhar para a tela do computador e prestar atenção no professor passando o conteúdo, isso sem falar que seus professores não sabiam usar as ferramentas online, então toda aula algum deles pagava algum mico com o microfone ligado, ou câmera ligada etc etc.
Todos os seus hobbies até o momento já tinham enjoado. Filmes da marvel tinha maratonado, crochê realmente não levava jeito, e mesmo que levasse não ia ter futuro pois achava coisa para velho, já tinha lido dezenas de livros que estavam começando a bombar no tiktok, mas a maioria parecia que o autor tinha pego dinheiro com o agiota, e tinha escrito qualquer merda para render dinheiro e poder quitar a dívida. A onda agora era algo com fadas bombadas e viciadas em sexo.
- Você não está prestando atenção. - sua melhor amiga disso do outro lado da tela do computador. - Remus e Sirius acabaram de se reencontrar e você não disse o quanto eles são gays e nem repetiu todas as falas.
- A esse ponto eu já sei esse filme de cor e salteado. - ela finalmente desvia o olhar da janela e volta para o computador, onde o filme O Prisioneiro de Azkaban continua a passar, seu olhar se centra na cena de Harry apontando a varinha para os wolfstar. Adorava aquele shipp. - Sei lá, tô meio entediada.
- Bem, aí você tem duas opções: você pode pular a janela do quarto e ir escondida pra festa que os meninos da turma vão. Disseram que vai ter bebida. - Beatriz diz quando parou o filme que nenhuma das duas prestava atenção. - Ou você pode finalmente me dar ouvidos e tentar aquele lance de DR que eu falei semana passada. Algumas meninas do grupo que eu tô no facebook conseguiram, e toda noite interagem com o Draco.
- Eu não vou furar a quarentena, tô entediada mas não sou irresponsável, não quero prejudicar a minha família. - Franze o cenho ao olhar para a outra. - E esse lance de DR é loucura, eu vi no tiktok, um monte de menina já doida da cabeça que sonha com o mundo literário mas jura que pé junto que é esse lance.
Quando a amiga ia replicar sua fala, Alycia ouve sua mãe a chamar e despede rápido da outra, aproveitando a desculpa para desligar a chamada e ir jantar.
Naquela mesma noite antes de dormir, após empacar em mais um capítulo de O Príncipe Cruel por achar a história chata, ela suspira e decide matar a curiosidade sobre o tema abordado mais cedo por sua amiga.
Alycia sempre achou que esse lance de DR era um pezinho na esquizofrenia causada pela pandemia que forçava as pessoas a não saírem de casa. E suas ideias não mudaram tanto enquanto via os vídeos de garotas brancas explicando como se fazia um roteiro para viver no universo escolhido. O que em sua concepção não fazia sentido, qual a graça de viver algo que você já sabia o que ia acontecer? Também não se sentia bem manipulando as emoções e ações de outras pessoas, mesmo que fossem ficcionais.
Com um suspiro, ela esfregou os olhos com uma mão enquanto deixava as coisas de lado com outra. Aquilo era delírio coletivo por conta da quarentena, e tinha pena de Beatriz por acreditar nessa babaquice.
Mas mesmo assim tinha feito um esboço de roteiro para viver no universo de Harry Potter e na época da Primeira Guerra Bruxa junto com os Marotos. Era sua época favorita da saga. Beatriz amava o Trio de Ouro, mas desde o primeiro momento que Alycia tinha lido o terceiro livro da saga e leu os nomes Sirius e Remus pela primeira vez, foi como amor à primeira vista. Mais tarde naquele dia, sua melhor amiga tinha caçoado dela dizendo que era óbvio que gostasse mais dos Marotos, porque a garota tinha predisposição para gostar de bandas e pessoas mortas.
Sorrindo com o humor quebrado da amiga, Alycia deixou suas anotações de lado e se deitou na cama a fim de dormir logo, pois já estava ficando com dor de cabeça.
Mal ela sabia que assistir aqueles vídeos de tutoriais de DR e a própria escrita do roteiro, eram só portas de entradas para a loucura que iria se tornar a sua vida, mas ela logo iria descobrir.
A raposa a esperava.
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Wonderland - E Se O Seu País das Maravilhas Fosse Em Outra Realidade?
FanficSe houvesse uma chance de mudar o futuro dos seus personagens favoritos, você mudaria? Essa é a indagação que ronda Alycia desde que sonhou com uma raposa que nunca viu que prometeu lhe levar para Hogwarts. Acontece que aparentemente a garota é peça...