5. As certezas

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[...] E uma das condições necessárias para se pensar certo, é não estarmos demasiado certos de nossas certezas."

— Paulo Freire
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Quinta feira, 10:15 a.m.
                
                   
Cafeterias de bairro deixavam Brittany com um gosto amargo na boca.

O cheiro áspero do café nacional combinado com o falatório das mesas repletas de clientes eram, em dias normais, situações sequer cogitada junto aos itens tediosos da realidade da loira; mas naquela manhã, acompanhada por uma morena falante e um copo descartável de tamanho médio, a escapatória parecia inexistente.

Hande: Eu pensei em alguma galeria menor, sem muitos exageros ... — comentou, desbloqueando o celular enquanto digitava algo rapidamente. — Olhe, essa aqui parece parece ser bem legal.

A afirmação veio acompanhada de algumas fotos internas do local. A Carl Hammer art Gallery — ou apenas Hammer, para pequena classe artística — ocupava o pavimento térreo de um antigo prédio no centro de Chicago. Tinha um aspecto clássico; as paredes eram pintadas um tom de bege amarelado e o piso de tacos brilhava com a resina recém encerada.

A morena sorriu, animada, estendendo o telefone roxo para que a loira pudesse passear pelas imagens por alguns instantes.

Brittany: Legal? Tem certeza? — Questionou, o tom irônico totalmente presente em suas palavras rasas. — Quer dizer, parece ser meio pequena ... além de muito velha. — Ressaltou.

Hande: Aí, não fale assim! — Ralhou. — Não é velha, é antiga ... e esse é justamente o ponto. As telas são todas coloridas, super contemporâneas ... quero que a exposição seja em um lugar que transmita uma ideia contrária!

Brittany: E esse lugar não poderia ser, sei lá ... uns duzentos mil anos mais novo? — Contrapôs.

Hande: Quer saber? Cale essa boca! — Exclamou, recolhendo o celular antes de revirar os olhos escuros. — É uma ótima ideia, pare de querer infernizar minha vida.

Diferente do irmão — Que reinava soberano com seus olhos verdes, fitar duro e expressões impassíveis —, Hande Herrera tinha olhos castanhos intensos, assim como os cabelos que caiam longos e lisos por suas costas magras. Era divertida; dona de sorrisos largos — que pareciam não ser capazes de deixar seu rosto —, de uma beleza exótica descomunal, de uma personalidade carismática e de valores incrivelmente livres.

Livres o suficiente para fazê-la se tornar o que sempre sonhara ser;

Uma artista plástica de alma brilhante.

E, de certa forma, o contraponto impiedoso de tal liberdade em relação a vida regrada do irmão — que crescera com um futuro que lhe fora planejado, com a liderança de uma empresa em seus ombros e um amor um tanto quanto premeditado em seu peito — talvez fosse o ponto principal para a proximidade latente que os unia com uma força descomunal.

Na mesa, a loira seguiu por observar a cunhada, não contendo o riso baixo que escapou de seus labios com a expressão insatisfeita que se instaurou ali.

Era incrível como Hande, apesar de todos os pesares, se parecia absurdamente ao irmão quando era contrariada.

Brittany: Tudo bem, a ideia é até boa ... — Cedeu. — mas o lugar continua sendo meio pequeno.

Hande: Nada que não se resolva cortando alguns convidados da lista! — rebateu, voltando a sorrir quando Brittany lhe contestou com uma careta. — Vamos, não seja implicante! Já disse que este evento vai ser bem menor do que os outros! Tenho certeza que você vai acabar gostando.

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⏰ Última atualização: Mar 08, 2022 ⏰

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