Enchendo ate a tampa

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Fecho meus olhos, respiro fundo. Por um momento sou acometida por um estado total de paz. Até que o telefone da minha mesa toca.

- Planejadora Clínica, Elizabeth. - Meu tom de voz era monótono, até minha saudação já estava entediada de falar.

- Eu preciso da planilha do mês de agosto do ano passado, Liza! - Fecho meus olhos, massageio minhas têmporas. Pela voz do Marco no telefone, tem uma coisa de muito errada acontecendo.

- Olá pra você também. - Ele bufa no telefone. Murmurando um pequeno, quase minúsculo, bom dia. - Já está arquivada Marco. Está dentro da pasta de auditoria e o mês correspondente, compartilhada com você e comigo. - Falo calma e pausadamente.

- Ah, claro! - Tenho a imensa impressão de que limpa a garganta e respira fundo. - Obrigada!

- Por nada chefe. - Sorrio com a sua falta de paciência. - E a propósito, ótimo fim de manhã pra você também. - tento brincar um pouco para aliviar o clima.

- Ah Liza, o que eu vou fazer quando você se formar hein? - Essa é uma coisa em que eu tenho pensado e muito também. Minha vida por sete anos, foi esse hospital. Saí daqui será como tirar um pedaço de mim. Mas eu sei, se continuar aqui, minha vida seria para trabalhar. Jamais posso negligenciar minha família desse jeito.

- Já disse Marco, colocar Stella no meu lugar. - Tentei reprimir a tristeza repentina que esse assunto sempre me traz, taxei um sorriso no rosto , engoli seco. - Ela está mais do que qualificada para o cargo. Vai fazer tudo do meu jeito...

- Você já pensou nos plantões? - Ele me interrompe. - Seria ótimo para o seu consultório se você pudesse dar plantões aqui, todos os partos seriam conveniados do hospital. - A alegria em sua voz era contagiante. Pela primeira vez eu me permitir pensar no assunto, secretamente claro.

- Não Marco, minha vida está uma bagunça. Não tenho tempo nem para pensar no meu próprio casamento. Plantões depois que eu me formar não será meu assunto predileto por um longo tempo. - Marco tem me importunando quase que diariamente para eu aceitar dar plantões no hospital. Não me importo com isso. Pelo contrário, quero e muito ter alguma experiência com o P.A. Muita gente deve me achar uma louca, sempre me afastei de toda desgraça que minha profissão poderia trazer, e agora me vejo ansiando para plantões. A questão aqui, é que plantonista aqui no hospital tem que estar com pelo menos um fim de semana livre, por conta do hospital, atendimento três vezes na semana, e duas noites por semana ficar com aplicativo no celular para casos de emergência, ativo. Somando tudo, com a minha clínica, eu não poderei ter vida social nenhuma. Quando comecei medicina, eu sabia que era corrido e tumultuado. Porém, sempre visei atendimentos, e acompanhamentos em pré-natal. Uma carreira mais calma e nomeada.

- Falando nisso. Já decidiu a data? Eu e Cal precisamos de um terno. E o Vitor, aquele menino não se aguenta para entrar com a bendita aliança Liza. - Marco sabia perfeitamente diferenciar o trabalho da nossa relação de amizade. Quando tinha que xingar e puxar a orelha, queria ter o poder de sumir e ir para Marte. Mas ao final do dia, eu era tratada como uma amiga muito próxima, como se nada tivesse acontecido no trabalho. Gostava disso. Esse poder que ele tinha de não estragar a nossa relação com coisas profissionais.

- Não fala Marco, Andrew que já não se aguenta. Mas você sabe como é, papai quer tudo perfeito. Sempre colocando defeitos aqui e ali. E Laís? O que dizer daquela barriguda? Quase parindo meu sobrinho, não se contenta em deixar a obra como está. - Minha família eram todos uma peça rara. Estavam pensando em arranjar o casamento do ano, todos preocupados. Laís se recusava a olhar qualquer vestido, na cabeça dela teria que ficar com seu corpo "normal" antes da cerimônia, para estar lá no altar como testemunha. Giovana, mais uma vez, pensava que o casamento era dela. Quase todo mês ia para fazenda ver como anda tudo, eu não ia lá desde o carnaval. Acho que ela errou de profissão, deveria ser organizadora de eventos, isso esta no sangue dela. Mamãe a todo momento me implicava para escolher tecidos para vestido, véu, grinalda. Se eu queria tudo inteiro, o véu pendendo da cabeça e formando a cauda, ou se seria o véu um pouco mais modesto, e a cauda completamente escandalosa. Eu... Eu estava completamente perdida entre revista e mais revista de noivas, salgadinhos e afins, porém, não tinha olhado nada. Claro que Andrew nem desconfiava disso. Para ele eu já estava com tudo na ponta do dedo, era só acabar a obra da capela, e arruma-la para casarmos. Previa uma grande briga no fim dessa obra, eu não tinha nem ideia de por onde começar, quanto mais tudo pronto.

Não Vá embora (COMPLETA ATÉ 05/08)Onde histórias criam vida. Descubra agora