Contos de Serys

Camus

Então, você chegou.

Ainda estou tentando recuperar o equilíbrio quando essa voz, poderosa e desconhecida, invade meus pensamentos, me deixando ainda mais confuso do que já estava. Não entendo o que aconteceu - há um minuto eu estava em meu quarto, deitado tranquilamente, e agora estou aqui, em pé em um lugar que nunca vi antes.

Olho ao meu redor, tentando assimilar o que estou vendo. Me encontro na ponta de um penhasco, com nada além de vazio aos meus lados e à minha frente. Tento ver o fundo, mas as nuvens passam quilômetros abaixo, e sinto vertigem ao notar a distância enorme que me separa do solo. Recuo lentamente, com as pernas ainda bambas, mas uma presença gigantesca que sinto às minhas costas me faz parar. Me viro com cuidado, com certo medo de encarar o que quer que seja que se posta atrás de mim.

O que vejo me faz cair ao chão, petrificado. Meu coração acelera e cada músculo do meu corpo me diz para sair correndo, mas não há para onde ir. O corpo gigantesco daquele ser ocupa o único caminho viável.

É como um lagarto, porém maior do que jamais imaginei que existisse. Suas escamas, de um amarelo vivo, cobrem a maior parte de seu corpo, como uma grande armadura natural. Suas asas, dobradas em suas costas, são enormes e perfeitamente capazes de erguer um corpo como aquele. As garras, cada uma tão grande quanto meu corpo, me deixam completamente consciente da minha insignificância perante à criatura. Mas são seus olhos, dourados e cruéis, focados em mim, que me deixam completamente paralisado.

Parte de mim, a parte mais racional, tenta se convencer de que estou sonhando. Porém as sensações são muito reais para ser um sonho. Sinto o chão sólido abaixo de mim; o frio cortante do vento em meu rosto; e o terror, o absoluto terror que percorre as minhas veias.

Você é forte. A maioria daqueles que eu trago à minha presença não suportam o terror e seus corações param de bater. Talvez você sobreviva, então. Será interessante de assistir.

A voz retorna. Com horror, percebo que vem daquele ser que me observa atentamente.

"Quem..." minha voz sai fraca, inaudível. Limpo a garganta, tentando ultrapassar o pânico que sinto . "Quem é você?"

Aquele que trouxe você até aqui. Se sobreviver o bastante, talvez descubra meu nome. Por hora, você é apenas um experimento, uma cobaia insignificante para meus planos.

"P-Planos? Você tem planos pra mim?" Engulo em seco, tentando imaginar o que alguém como ele poderia querer com alguém como eu. "O que você iria querer com alguém como eu?"

Nada que você poderia imaginar. Você não é um agente que irá executar algo que sou incapaz. É apenas um brinquedo, um entretenimento em minha vida monótona. Removi você de sua realidade para acompanhá-lo aqui, em meu mundo, e ver como se sairá - o grande lagarto então se levantou, abrindo as asas, os grandes olhos sempre fixos em mim - Agora vá, e me divirta. Talvez assim não o elimine rapidamente, como alguns dos outros.

Ao terminar de falar, fui atingido por uma forte lufada de vento, que continuou de forma ininterrupta, me empurrando cada vez mais para a borda do penhasco. O pânico que eu sentia aumentou, e comecei a tentar me agarrar a qualquer coisa a meu redor, mas a superfície lisa da pedra abaixo de mim não possuía uma única ranhura a qual eu pudesse me prender. Em segundos estava no limite da superfície, a risada cruel e maléfica daquela criatura ressoando em minha mente e ossos.

E por fim, eu caí, como um anjo jogado para fora do céu.