Lembranças ou Sonhos?

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Somos da mesma matéria

Da qual são feitos os sonhos.

A Tempestade — Ato IV - Cena I

William Shakespeare


Angus

Quando cheguei à propriedade, a porta principal não estava trancada, ninguém tinha o hábito de trancar as portas naquela região.

Entrei, vaguei pela casa vazia, caminhei pelo escritório, pela sala, fui até a cozinha e constatei que a pia estava limpa, nem um copo fora do lugar. Os vizinhos naquela região eram extremamente amáveis, devem ter amparado a sobrinha de Brian e tia Rhonna, mas onde ela estava?

Subi as escadas até o piso superior, onde ficava os quartos. Conhecia bem aquela casa, vivi parte da minha infância ali. Todas as férias, passava lá, entre nadar no lago no fundo da propriedade, cavalgar pelos campos até meu corpo se sentir extenuado, participava das festas e dos festivais. Aquele sempre fora meu lugar favorito no mundo, minha terra.

E agora, infelizmente eu estava de volta por um motivo nada festivo. Ainda conseguia sentir a presença, o cheiro da minha tia, ouvir sua voz suave e melíflua dizendo "Angus, querido desça, o jantar está pronto", "Angus, venha. Fiz torta de morango".

À noite, quando me colocava para dormir e contava mitos e folclores celtas e me chamava de "Pequeno Cisne", o carinho e o cuidado que ela tinha comigo era tão devotado, que muitas vezes era motivo de rusgas entre minha mãe e ela que dizia: "Orla, querida, ele é meu único sobrinho, me deixe cuidar dele, mimá-lo, não seja tão possessiva!"

E agora eu não tinha mais nenhuma e nem outra, ambas morreram. Perdi minha mãe aos 22 anos, meu pai eu mal consigo me lembrar dele, morreu quando  tinha apenas 7 anos.

Minhas mais doces recordações eram de minha tia Rhonna e tio Brian, e agora ela partiu. Eu não sabia o que fazer, estava me sentindo perdido na imensidão da casa vazia,

Onde será que estava a garota, a sobrinha deles?

Eu sei, era tarde da noite não iria procurá-la, porém na manhã seguinte precisaríamos conversar, quais seriam os planos dela para a Eala Loch?

Fui até o meu antigo quarto e tomei um revigorante banho.

As noites ainda eram frias, nem parecia que já havia começado a primavera. Tinha me esquecido que nas Highlands, a primavera chegava em passos lentos.

Deitei-me na cama e adormeci, não soube por quantas horas. Mais uma vez o sonho com a mulher de longos cabelos negros como o véu noturno, a mulher de pele clara, no entanto, para minha surpresa, pela primeira vez a mulher se dirigiu a mim, parecia feliz e dizia:

Você me achou! Finalmente, seremos um novamente. Nunca mais vamos separar sou sua e você é meu cisne, para sempre!

Acordei atordoado, a mente confusa.

Será que um dia encontraria a jovem do sonho?

Olhei no relógio eram três da manhã. Levantei-me da cama na intenção de ir à cozinha fazer um chá. Deixei o quarto e já no corredor, notei uma porta entreaberta e ouvi uma voz.

Entre!

Parecia a voz da minha tia.

Uma saudade me invadiu e não consegui evitar a tristeza que me acometeu e a dor tomou conta do meu peito. Dei as costas e seguia pelo corredor, porém novamente ouvi a voz dizer:

BeltaneOnde histórias criam vida. Descubra agora