Com vimos no capítulo anterior, Lavey passou uma temporada de sua vida trabalhando em
casas burlescas e clubes noturnos nos arredores de Los Angeles, como tocador de órgão.
Uma noite, enquanto trabalhava no Mayan Club, conheceu uma atriz chamada Norma Jeane
que tinha conseguido trabalho como bailarina. Essa atriz logo mudaria seu nome para
Marilyn Monroe e, conta a lenda, ela e Anton tiveram um rápido caso. Apesar da relação
apenas ter durado algumas semanas deixou no jovem LaVey, que contava com 18 anos uma
marca muito forte. Anos mais tarde, uma das posses mais preciosas de LaVey seria um
calendário de Marilyn nua, com a dedicatória: "Caro Tony, Quantas vezes você já não viu
isto! Com amor, Marilyn". Após o fim da sua suposta relação com Marilyn, Anton decidiu
mudar-se para São Francisco. Lá, continuou a trabalhar como músico para vários shows de
strip-tease e outras reuniões de entretenimento adulto. Também conseguiu trabalho como
fotógrafo na Paramount Photo Sales, onde tirou fotografias a mulheres em várias fases de
stripping, conhecimento que mais tarde seria útil no emprego de fotógrafo policial.
Quando a Guerra da Coreia começou Anton ponderou sobre a possibilidade de ser arrastado
para dentro do exército. Lutar pela pátria estava longe de suas prioridades. Por isso de modo
a poder evitar este possível destino em 1949 inscreveu-se na Faculdade de São Francisco, no
curso de Criminologia, mesmo sem nunca sequer ter acabado o secundário. Como deve se
lembrar, ele havia fugido de casa para ir trabalhar no Circo, assim, mesmo sem a educação
fundamental completa, ele conseguiu entrar diretamente na faculdade. Foi mais ou menos
nesta época que conheceu sua primeira esposa, Carole Lansing, num parque de diversões
nas praias de San Francisco. Os pais de Carole de início estavam desconfiados das intensões
de Anton, mas rapidamente se habituaram a ele e deram permissão para os dois se casarem. Anton e Carole casaram-se em 1951 e um ano depois nascia a primeira filha de
LaVey, Karla Maritza LaVey.
De modo a poder sustentar sua família, LaVey decidiu usar os seus talentos de fotografia e a
sua educação em Criminologia para conseguir trabalho como fotógrafo na Polícia de São
Francisco. Um emprego que abalou profundamente e causou fortes impressões nele,
aprimorando ainda mais seu senso estético e sua visão da realidade humana. Suas fotos
registraram as mais sangrentas e grotescas cenas, fruto de um universo essencialmente
indiferente para as súplicas humanas: crianças fuziladas na calçada, motoristas que
atropelam e fogem, maridos brutalmente ciumentos, esposas vingativas, corpos boiando na
baía de São Francisco, homens mortos por seus irmãos, garotinhas estupradas e estripadas,
mães dando surras em seus bebês e filhos espancando seus pais idosos. Como poderia haver
um ―plano maior‖ para tão insensata carnificina? Como pode haver um Deus cuidando de
toda esta gente? Por que tanta dor e sofrimento? LaVey registrou em seus filmes a maior
prova de que o Deus judaico/cristão não existe: o sofrimento humano.
Ele diz: ―Não há Deus. Não há nenhuma deidade suprema todo poderosa nos céus, que se
preocupe com a vida dos seres humanos. Não há ninguém lá em cima que se importe. O ser
humano é o único Deus. O ser humano deveria ser ensinado a responder a si mesmo e aos
outros homens quanto à suas próprias ações.‖
A espetáculo do burlesco humano testemunhado no circo e o grotesco do mundo fotografada
nas ruas formaram a síntese do Satanismo que logo começaria a ganhar forma. Depois de
dois anos, graças à sua própria personalidade e interesses pessoais, foi dada a LaVey a
responsabilidade adicional de tomar conta das "Chamadas 800", que era o código para as
chamadas estranhas. Antevendo os chamados Arquivos–X em algumas décadas, ele
investigava de tudo, desde visões de OVNIs a relatos de fantasmas, casas assombradas e
todo o resto que pertencesse ao sobrenatural. Nos anos seguintes Anton ganhou uma grande
reputação como um dos primeiros "caça-fantasmas" da nação.
LaVey percebeu desde cedo que vivia em uma época de mudanças e que faltava muito pouco
para o espírito de liberdade explodir sem nenhum controle como jamais visto na história. Em
breve uma América branca, machista, protestante e conservadora assistiria ao movimento
feminista queimando soutiens, aos panteras negras ganhado as olimpíadas, à valorização da
liberdade e do hedonismo entre os jovens, uma revolução ―espiritual‖ movida a drogas
capitalizada em Woodstock e uma subseqüente fragmentação religiosa para algo cada vez
mais mutante e individual.
Com olfato apurado, LaVey sabia que havia a necessidade de dar forma e voz a todas estas
mudanças, era necessária uma oposição pública à estagnação que, em especial, o
Cristianismo havia nos trazido. LaVey não estava simplesmente no lugar certo e na hora certa, ele era também a pessoa certa. Acima de tudo ele sabia que novos tempos estavam
chegando e que se não fizesse alguma coisa neste sentido, outra pessoa o faria, e
provavelmente com muito menos talento do que ele.
Viu que deveria haver um novo arauto para a senso de justiça e liberdade que estava se
formando, alguém que entendesse as dores e prazeres do ser humano, que dividisse conosco
nossas próprias paixões e fraquezas mas que ainda assim fosse um modelo de vida, força e
sabedoria. Ele começou a perceber que a maior parte de nosso progresso, seja na ciência, na
política ou na filosofia, foi feito por aqueles que se rebelaram contra ―Deus‖, a "Igreja", as
"Autoridades" ou quem quer que ditasse o status quo de uma dada sociedade.
Era necessário um representante para este espírito revolucionário, criativo e irrepreensível,
que sempre habitou nos homens e mulheres superiores e que fervilhava como nunca nos
tempos de então. Só havia única figura que preenchia com perfeição este espaço, e isso
estava bem claro para LaVey desde o começo de sua vida, uma deidade cuja rebeldia e
natureza apaixonada havia sido descrita tanto com admiração como com medo desde o
obscuro principio de nossa história: Satã, Lúcifer, ou popularmente, o Diabo.
Por qualquer nome que tenha sido chamada, esta figura sempre assombrou a humanidade
tentando-a com as doces delicias da vida e iluminado-a com mistérios ocultos antes
destinado apenas aos deuses. O diabo sempre defendeu que o homem deveria experimentar,
e não simplesmente acreditar. Ele foi sempre aquele para quem, com segurança, podíamos
pedir poderes e que sabia vingar-se e retribuir justamente as pessoas segundo seu
merecimento. Satã nunca foi um deus etéreo do além, mas sempre uma deidade carnal e
terrena - e mais importante: presente! Ao invés de criar pecados para aumentar a culpa,
Satã sempre encorajou a indulgência. De todas as figuras mitológicas criadas pelo homem,
Lavey nos mostrou que o diabo foi à única deidade que realmente soube nos entender.