Order of Nine Angles - ONA

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O Pânico Satânico descrito no capítulo anterior, não desapareceu sem antes realizar algumas 
mudanças importantes no movimento satânico

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O Pânico Satânico descrito no capítulo anterior, não desapareceu sem antes realizar algumas
mudanças importantes no movimento satânico. Foi nesta época complicada que algumas
pessoas aproveitaram a má fama do Satanismo para ganharem um pouco de destaque.
Pastores, Psicólogos, Policiais... todos queriam aproveitar a febre do momento para ganhar
um pouco de notoriedade. Todos, incluindo os próprios Satanistas. Como já se tornara uma
fórmula dentro do Satanismo o estigma causador de medo não foi negado mas relido sob
uma nova perspectiva. Quando a febre do Ritual de Abuso Satânico ganhou fama
internacional, e numa época em que o Satanismo mais causava medo, veio a tona na
Inglaterra o Satanismo agressivo da ―Order of Nine Angles‖, ―Ordem dos Nove Ângulos‖ ou
ONA como também é conhecida.
Uma das principais diferenças entre a ONA e o Satanismo anterior é a ênfase na auto-
superação seja ela física, mental ou oculta. Em contrapartida ao Satanismo puramente
hedônico que existia na América, a ONA inglesa defendia que não existe vitória sem luta e
que em busca de se tornar alguém superior o prazer momentâneo deve ser muitas vezes
trocado por experiências longas, desgastantes e trabalhosas. Isso não chega realmente a ir
contra o Satanismo proposto por LaVey, pois é uma releitura de Epicuro, mas servia de
alerta para que o próprio satanismo não se tornasse um antro de compulsão hedônico e
acomodada.
Apesar da antiguidade sugerida pelo grupo não existem registros de tais práticas anteriores
ao final do século XX. Ao contrário é possivel traçar a transformação do grupo de bruxaria
tradicional em uma ordem satânica por meio do trabalho de seus protagonistas durante a
década de 70. A gênese do grupo se deu quando três grupos (Camlad, Noctulius e Temple of
Black Sun) se uniram com o propósito de praticar certas tradições ocultas. Neste momento o enfoque do grupo era a bruxaria tradicional e esta fusão foi liderada por uma mulher da qual
sabemos pouco a respeito. Quando Thorold West (Anton Long), então um viajante
endinheirado, conheceu esta mulher e foi apresentado por ela a estas tradições ele
primeiramente as uniu com o que conhecia de Tantra e Vamachara e iniciou o
desenvolvimento do que viria a ser o Caminho Setenário e publicou o "Livro Negro de
Satan". A sacerdotisa mudou-se então para a Austrália e Anton Long passou a cuidar do
grupo. Nesta época o grupo não chegava a vinte membros e todo material era datilografado
e enviado pelo correio ou entregue pessoalmente.
É difícil afirmar exatamente quando o grupo passou a se considerar satanista mas podemos
especular algumas coisas uma vez que existem fontes do início dos anos 70 usando o termo
"Satanismo Tradicional". Possivelmente o termo foi cunhado por Anton Long em
contraposição ao Satanismo de Lavey que era mais conhecido e como referência a Bruxaria
Tradicional que deu origem ao Caminho Setenário. Alguns anos depois David Myatt entra no
grupo e usando vários pseudônimos (inclusive Anton Long!) para dar continuidade ao
trabalho dando muito mais robustes a tradição. David deu mais forma ao grupo e criou a
base de toda sua doutrina. Muitos rituais, cânticos, os Insight Roles, o Opfer, os trabalhos
secretos, a hierarquia dos graus, o Star Game e as pesquisas do Acausal e dos Deuses
vieram a tona graças a ele.
Foi graças a este trabalho de dabid que nos anos 80 o grupo conheceu uma grande expansão
criativa e numérica crescendo por meio de em várias células, chamadas Nexions,
espalhadas pela Europa e houve uma grande renovação quando o zine FENRIR passou a ser
escrito e distribuído. O famoso ―NAOS – Um Guia prático para a Magia Moderna‖ foi
publicado em uma das edições deste zine que entre outras coisas também trouxe o tarot da
ordem, ilustrado por Richard Moult (Christos Beest). Beest encabeçou a divulgaçãi da ordem
com sua arte e foi o responsável pela "relações públicas" do grupo nesta época. Ele Também
publicou neste tempo o intrigante "Diário de um Adepto Interno", relatando os anos que ele
morou numa cabana com o Meat e outros membros. Sua permanência dura até 1996 quando
deixa a divulgação da Ordem na mão do "Thernn" - mais conhecido hoje como Michael W.
Ford, que permanece até o ano 2000 e então se retira para fundar a Order of Phosphorus.
Assim surgiu essa literatura instigante que logo ganhou adeptos e que é distinguível pela
complexidade de sua cosmologia, pela afirmação da sua ancestralidade e por saber tirar
proveito de uma imagem sinistra numa época em que o medo pairava no ar. Entretanto o
importante não e se a ONA é realmente um grupo milenar como alega ou se foi criado hoje
de manhã. O fato é que muito de sua visão de mundo é indiscutivelmente um resgate de
raízes e heranças que são encontradas em momentos bem distintos da história como o
paganismo europeu pré-cristão e o Reich Alemão. O Templo de Set já se utilizara deste
recurso ao identificar o culto do antigo deus egípcio com os princípios do Satanismo, mas a ONA levou esta ideia ao extremo ao estabelecer para os Satanistas não apenas um vislumbre
do passado mas toda uma nova forma de se entender a história.
Alektryon Christophoros, mostra muito bem este aspecto do grupo em seu artigo Satanismo
Tradicional, Nacional-Socialismo, e o Aeon Faustiano, onde escreve:
“Uma das crenças básicas do Satanismo Tradicional baseia-se no facto de que a sociedade
ocidental foi „envenenada‟ ou empobrecida com valores judaico-cristãos que apenas vieram
atrasar a evolução da Humanidade, e a inauguração do Aeon Faustiano: a Nova Ordem
Mundial de natureza Elitista e Satânica, em que o poder será entregue à „Raça Superior‟, a
Raça Satânica constituída pelos melhores e mais fortes. Neste aspecto podemos ver uma
flagrante correspondência com o Nacional-Socialismo, que em muitos aspectos pode ser
visto com uma Religião do Sol, do Führer, do Líder e do Forte. Esta é a Lei Absolutista, a Lei
contra o Cristianismo de que Friedrich Nietzsche tão apaixonadamente falou no seu
fantástico livro „O Anticristo‟.”
Estas idéias caíram como uma bomba entre os Satanistas da época que, estimulados com as
drásticas mudanças sociais dos anos 60 e 70 e incomodados com o a atitude reacionária da
época, queriam novamente ver a chama de Satã arder e transformar o mundo.
O Satanismo torna-se então algo mais grandioso, a preparação para o próximo estágio
da humanidade no qual somente uma raça dominará. De todas as etnias, a Raça Satânica se
formará e abrirá os portais do Inferno. Segundo tradução de Prmtn Kali & Prmtn Fobus,
Anton Long escreve em Uma Introdução ao Satanismo Tradicional: “Para nós, Satanismo é
a criação de indivíduos orgulhosos, fortes, de caráter pleno, compreensivos - indivíduos que
foram além da maioria e que representam assim, um tipo mais elevado. Os grupos Satânicos
verdadeiros, não procuram seguidores servis, decadentes, fracos. Procuram criar uma elite
real - quase uma raça nova de seres. Naturalmente, isto não é fácil - é realmente perigoso.
Freqüentemente, novos Iniciados falham por causa da dificuldade ou porque falta-lhes o
desejo essencial para ser bem-sucedido. Mas é como a evolução trabalha - os fortes
superam desafios e evoluem; os outros permanecem onde estão, caem, ou são destruídos.”
A Escatologia proposta pelo grupo é tão questionável quanto a de qualquer outra religião,
mas ao contrário de muitas outras ela se traduz em algo extremamente prático. Para a
Church of Satan, a Era Satânica já era um fato consumado mas para a ONA, esse Novo
Mundo não chegaria numa bandeja, devia ser conquistado. Isso faz os satanistas deixam de
ser expectadores passivos para se tornam agentes ativos que do campo político ao
artístico, das relações pessoais às práticas rituais se preocupam em transformar a terra por
meio da invocação das forças por eles chamadas de Deuses Obscuros.

Assim como Anton LaVey, os Satanistas da ONA e todos os Satanistas posteriores por eles
influenciados viam nas mudanças sociais sintomas de uma ―Nova Era Satânica‖. Contudo ao
contrário da Church of Satan, a ONA dizia que podíamos e devíamos invocar estas forças
transformadoras para acelerar a destruição das coisas antigas e transformar
definitivamente as civilizações de nosso planeta. Existe aqui uma certa semelhança com as
visões de H.P. Lovecraft, mas também diferenças importantes. Seja como for ambos
concordam com uma coisa: Não basta que as estrelas estejam alinhadas, é preciso abrir o
portal.
De modo a impulsionar esta missão o grupo desenvolveu um sistema conhecido como a
Tradição Septenária organizada numa espécie de Cabala Satânica que levava não só o
individuo, mas todo o planeta para o estabelecimento da super-humanidade. Este é outra
grande diferença entre as organizações satânicas posteriores. Enquanto que na Church of
Satan não havia qualquer preocupação em estabelecer um caminho iniciático no qual o
Satanista pudesse se desenvolver e o Templo de Set ainda fornecia apenas uma organização
hierarquizada e fechada aos seus membros, a ONA ofereceu abertamente toda uma forte
tradição ritualística com a função clara de “guiar seus membros ao longo do caminho difícil e
perigoso do desenvolvimento interior com o objetivo de criar um indivíduo totalmente novo”,
usando aqui as palavras exatas de alguns documentos da própria ordem.
Isso é feito em primeiro lugar pela ―Árvore de Wyrd‖ que pode ser vista como um mapa da
consciência tanto individual como do universo, com chaves a serem ligadas e desligadas,
obstáculos a serem vencidos e metas a serem cumpridas para que o domínio satânico possa
ser adquirido. Cantos foram revelados, um Tarot sinistro passou a ser usado e toda uma
vasta tradição começou a aparecer como apoio a cada um dos sete graus propostos pela
organização. No mesmo texto acima citado Anton Long escreve:
“Cada estágio deste caminho tem associado a ele determinadas tarefas,
determinadas experiências, que o indivíduo deve empreender por ele mesmo. Isto é,
ele sozinho traz a introspecção, o domínio, a compreensão e a habilidade – todos ocultos e
pessoais”.
Que contraste foi esse em relação ao Sacerdócio da Church of Satan pelo qual qualquer
pessoa podia pagar para ganhar o título de Reverendo! O problema da vulgarizarão
do Satanismo pela quantidade de adeptos enfrentado por LaVey foi solucionado pela ONA
com a implementação dos Nexus e uma tradição em graus com testes e provações tão duros
que simplesmente não podem ser alcançados por qualquer pessoa. Hoje a ONA não é apenas
um grupo mas muitos grupos organizados separadamente e mesmo indivíduos isolados que
perpetuam a tradição. Como Malachi Azi Dahaka bem colocou em seu artigo "Ordem dos 9
Ângulos I – Origens e Ideais": "Apesar do nome, a ONA não é uma ordem, oficialmente falando. Ela é um método, um
caminho, aplicado por grupos de tribos. Para ser da ONA, basta realizar as práticas e
filosofias, mesmo que de forma solitária. Não há líderes, ninguém pra te dizer o que fazer,
não há organização oficial, em hipótese alguma existem cobranças sexuais, monetárias ou
ingresso de menores de idade (tendo em vista que só se pode exercer o caminho septnário a
partir da maturidade). Não há também nenhum “conteúdo ultra secreto” relacionado, não há
atividade “oculta na internet ou deepweb” ou algo do tipo. Todo material é aberto aos
adeptos que desejarem ter acesso."
Isso não significa que o satanismo tradicional irá substituir o satanismo moderno. Mas a
importância da Order of Nine Angles não pode ser negada. Embora por muito tempo tenha
sido identificada com o Pânico Satânico de quem é contemporânea e assim criticada por
alguns satanistas como um desvio, trata-se apenas de uma outra escola, com seu próprio
valor. É difícil não fazer uma comparação com a história do rock: a América trouxe Elvis e
LaVey ao mundo e a Inglaterra revidou com Beatles e Satanismo Tradicional. A invasão
inglesa no Satanismo é sem igual não porque os Deuses Obscuros existam como seres
sencientes, nem porque o grupo resgatou tradições antigas e nem mesmo porque estão
abrindo os ―antigos portais‖. Mas por um fato muito mais simples: Pela primeira vez o
Satanismo deixou de ser uma visão individual e passou a ser um projeto de mundo.

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