Capítulo 2 | Propostas

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   "Tudo parte de uma proposta o segredo é saber dizer sim corretamente, o sim dito errado faz qualquer proposta virar um tiro no pé."
- Manual dos recrutados.

*

     
      Nyran e Vênus tinham uma história a qual a ladra não gostava de relembrar. O filho do comandante já havia morado no orfanato assim como ela e Peter, não porque era órfão, mas sim porque seu pai era ocupado demais comandando o exército. Clay não ligava do filho frequentar o orfanato, mas quando o jovem criou idade para o recrutamento, o comandante passou a não deixar mais, com medo dele preferir ficar nas paredes em ruínas do que ter sua companhia horrível.

    A ladra sentia um vazio no peito como se aquela parte de sua vida nunca mais fosse voltar, era saudades de alguém que não existia mais. Ele não era mais aquele garotinho que virava um lobo quando falavam que ela era órfã, não passava nem perto de ser ele, a versão "filhinho de comandante" que ousou criar iria contra tudo que o jovem pregava quando criança. Vênus sentia saudades daquele menino que a colocava para dormir no canto de sua cama para protege-la do frio intenso. 

  Todos mudavam o modo de pensar quando iam para Zona, ignoravam suas raízes e criavam novas personalidades e olhando para as roupas que o jovem recrutado usava era notório sua diferença.

     Era couro, couro legítimo, Nyran vestia um colete de couro preto com vários cintos nos bolsos da peça, sua calça da mesma cor escondiam várias adagas prendidas na perna e em seus pés uma bota pesada, ele estava uma versão meia boca de seu pai, o Nyran de antigamente odiaria aquelas roupas, odiaria as botas apertando seus pés e o peso do couro sobre sua pele.

     — Olá Vênus. — Os olhos lilás reluziram ao falar o nome da ex amiga.

    Tão magra, olhando-a de longe ele não tinha percebido o quão pele e ossos ela estava, mas de perto pode perceber os ossos de suas costelas ameaçando aparecer na sua roupa manchada, o que haviam feito com ela? Algum castigo talvez? Se estivessem deixando ela com fome como forma de punição ele os matariam.

O jovem contraiu o maxilar marcado.

    — Oi.

Vênus respondeu baixo, não sabia onde tinha enfiado sua voz.

      Ela encarou aquele rostinho angelical, nenhuma cicatriz ou mancha, um bolo se formou em sua garganta, não iria chorar ali na frente de todos. A tensão consumiu o ambiente e as pessoas ao redor encaravam os dois esperando qualquer tipo de briga.

    Nyran abriu a boca para falar mais alguma coisa, mas desistiu no caminho. Era estranho para ladra vê-lo depois de tanto tempo, seus cabelos escuros estavam baixo e a barba brotando em seu rosto.

Era um homem. 

     Ela deu uma ultima olhada para o ex amigo e não suportando mais aquela tensão no ar, subiu para o quarto com o coração acelerado, não queria ter que olhar mais para o antigo companheiro. De todas as mágoas que ela cultivava, Nyran era o responsável por parte, ele era o seu melhor amigo e ela achava que ele seria para sempre.

     No corredor do quarto o chão rangia debaixo de seus pés, o andar de cima do orfanato estava tão terrível quanto o de baixo, a porta do quarto era tão velha que as traças e cupins não tinham piedade em consumi-la aos poucos.

    — Merda!

   Praguejou ao tropeçar em uma das bonecas jogadas no chão do quarto, tudo estava uma bagunça, haviam roupas espalhadas pra todo canto e as meninas competiam para olhar no pequeno espelho embaçado. Aquele não era exatamente um quarto, era uma ala da biblioteca que como não usavam, as irmãs elementares improvisaram outro quarto já que não haviam mais lugares disponíveis para enfiarem mais crianças.

A Verdade de VênusOnde histórias criam vida. Descubra agora