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Susan:

Acabei de tirar tudo o que pude de casa, não seria certo deixar que Emily retornasse ao seu lar e ver tantas coisas estranhas lá. Sei que seus irmãos conseguirão explicar sobre as reformas todos os dias mas como explicar que ela não é mais uma adolescente e sim uma mulher casada?

Ela pode não reagir bem a isso na maioria dos dias e eu preciso evitar toda essa situação o máximo possível. Sei que Emily não tem culpa de nada e muito menos  tem intenção de me machucar um dia.

Só que hoje ela não sabe que eu existo e amanhã também não irá se lembrar. Para ser sincera já nem sei se esse plano bobo de conquistar a minha amada todos os dias é uma coisa boa.

Como vou ficar nos dias em que ela não me quiser? E se ela não me quiser nenhuma vez? Eu queria que tudo isso fosse mais fácil. Tudo bem não se lembrar de mim hoje mas não se lembrar de mim dia nenhum?

Nessas horas até me arrependo de ter passado tanto tempo com meus pais ao invés de ir mais vezes na cidade com meus irmãos. Quem sabe se eu gostasse de café naquela época ou se eu costumasse me enturmar durante o intervalo. Se eu fosse só um pouquinho diferente, tenho certeza de que Emily me conheceria e agora eu não estaria passando por isso.

Mas eu não fui assim e preciso me conformar com a situação e é por isso que resolvo voltar para o lar em que cresci. Meus pais falaram que posso ficar pelo tempo que eu precisar... talvez eu fique para sempre.

Os médicos me alertaram para seguir em frente e arrumar um novo amor, um novo alguém para partilhar meus dias mas outro alguém não é a minha Emi. Como posso olhar para outra mulher sabendo que Emily está lá no mesmo lugar de sempre? Simplesmente não consigo.

Meu coração pertence a ela e somente a ela. Não existe outra pessoa no mundo para mim. Não existe outra amiga, poeta, namorada, esposa e amante. Não existe outra Emily. Deus, como essa angústia dói.

Sinto as lágrimas escorrendo e nada posso fazer para impedir. Como irei dormir hoje? Como irei  dormir nas próximas noites? Eu mal pregava os olhos enquanto ela esteve hospitalizado mas pelo menos lá eu sabia que ela estava cercada de pessoas especializadas, já em casa não tem ninguém. Vinnie se dispôs a ficar com ela pelo tempo necessário, mesmo que o necessário sejam longos anos. Lavinia se culpa pelo acidente — e com certa razão —. O que me preocupa não é Vinnie estar lá mas sim o fato de que eu não estou.

Emily não sabe como dormir sozinha. Ela tem medo do escuro e por isso dormia cercada por bichos de pelúcia, quando fomos morar juntas ela trocou os bichinhos pelo meu corpo. Dormíamos agarradas todas as noites, e agora? Como irei dormir sem Emily nas minhas costelas?

Tenho muitas perguntas e nenhuma resposta. O silêncio do meu quarto é avassalador, ainda mais porque choro em silêncio. Não quero preocupar meus pais mais do que já estão.

Eles me convenceram a fazer acompanhamento psicológico para me ajudar a lidar melhor com a "perda", como se Emily tivesse morrido. Só que ela está viva, só não se lembra quem eu sou ou tudo o que vivemos.

Talvez eu realmente deva desistir desse plano bobo de conquistar minha Emily, afinal ela não se lembrará dos meus esforços no dia seguinte. Mas se ela não se lembrar de mim será como um tiro certeiro no meu peito.

Preciso sair dessa fossa, preciso colocar meu plano em prática. Talvez se eu refizer tudo o que nós vivemos... nem que eu grave um vídeo e precise mostrá-la todos os dias, ainda assim o faria. Se eu puder fazer ela rir já serei a mulher mais sortuda do mundo por arrancar um sorrido tão lindo de seus lábios.

Corro para a mini biblioteca da casa e pego um caderno e uma caneta, passo na cozinha e pego uma garrafa d'água, alguns salgadinhos e subo correndo para o quarto. Tranco a porta e rapidamente organizo todo o meu material para a noite, tenho certeza de que será uma noite longa.

Como se fosse a primeira vez - EmisueOnde histórias criam vida. Descubra agora