*** capítulo sem correção ortográfica ***
Cindy
Olho para a enorme mansão onde vivo na esquina da Rua Amor Perfeito com a Rua Camélia, uma das obras de Oscar Niemeyer, desenhada pelas mãos habilidosos do arquiteto como presente de aniversário para seu grande amigo, meu avô.
A mansão já foi capa de muitas revistas de arte e decoração, suas plantas já foram estudada em aulas de arquitetura, e como tal, foi admirada, desejada, aclamada. Nela já se passaram, por décadas, grandes nomes da moda, artistas, cantores, modelos...
Cresci em uma casa cheia de pessoas, glamour, poder, dinheiro, o paraíso de quem sonhava em ser descoberto, ter sucesso, fama. O berço da beleza, desde a sua criação, de traços elegantes e imponentes, mas que carrega em suas paredes, o vazio que uma casa sem amor.
A casa de número 48 da Rua Amor Perfeito é uma ironia, porque tudo nela é perfeito, menos o amor.
Aperto a pasta em minhas mãos, sentindo o peso das palavras escritas nas folhas dentro dela machucarem meus dedos, respiro fundo imaginando que talvez agora o ar modifique algo dentro de mim. Mas nada muda, absolutamente nada.
Obrigo minhas pernas a se moverem, percorro o resto do caminho que me leva até a porta e entro.
Estou sozinha.
Completamente sozinha.
Em uma casa que custa milhões, desejada, admirada e frequentada por centenas de celebridades e mesmo assim nunca me senti mais sozinha e perdida em toda a minha vida.
Caminho por entre os cômodos, a pasta em uma mão, as pontas dos dedos roçando nas paredes frias e cheias de histórias, marcas de vidas, lembranças em sua grande maioria, dolorosas demais para resgatar, entro na sala de teve e me sento no enorme e antigo sofá, me aconchego entre as almofadas e fecho meus olhos, ainda abraçada a pasta, enquanto inalo o cheiro praticamente inexistente na almofada e me recordo da última vez em que estivemos aqui.
Ainda posso ouvir Dirty Dancing passando na tevê, o joguinho sensual entre a garota rica e mimada e o rapaz pobre, minha história favorita da vida, a sua história favorita, a nossa história.
Ainda posso sentir seus dedos em meus cabelos, acariciando as mexas enquanto repetimos as falas quase em conjunto, eu amava quando dizíamos as mesmas falas, eu amava quando ela estava aqui, quando era só minha, de calça de ginástica e regata, com os cabelos desalinhados e os óculos na ponta do nariz, era quando ela estava mais linda, quando era só minha, de mais ninguém.
Apoio o rosto na almofada, ignoro a dor da pasta forçando minha costela, me concentro em sua voz doce, bonita, o leve sotaque francês de quem passou a vida falando o segundo idioma, enquanto dizia o quanto amava a forma como a garota do filme não teve medo de lutar por seus sonhos.
Medo... ele me consome, me domina, meu companheiro nas noites solitárias e silenciosas. Dono de mim.
Quem vê a garota ousada e bonita, cercada de amigos, de festas, de luxo, não imaginam que na verdade ela é feita de medo, medo e dor.
Em algum momento adormeço, ainda abraçada a pasta, ainda relembrando as falas e cenas, a sensação de não estar só, de ser amada, querida, importante para alguém.
Acordo assustada com o som de um telefone tocando, preciso de um momento para compreender que é meu celular, e que ele ainda está dentro da bolsa, jogado em algum lugar entre a porta de entrada e a sala de tevê.
Levanto correndo, o medo da ligação cair antes que eu chegue até ela me faz escorregar no chão limpo e escorregadio quando alcanço o aparelho e atendo, estou ofegante e tremendo.
— Pronto?
Sento no chão apoiando minhas costas na parede enquanto aguardo por sua voz.
— Mon Petit, o que houve?
Fecho os olhos e sorrio, ainda é a mesma voz bonita, elegante, com o sotaque acentuado, e me surpreendo com o quanto senti sua falta.
— Oi mamãe, eu só corri para atender, estava dormindo um pouco.
— O doutor Fraga me ligou, disse que esteve com você hoje.
Ela é direta, uma das características de Marie Fontanelle é que ela não perde tempo com bobagens, ele é precioso demais, Marie é direta e essa ligação é puramente profissional. Garantir que mais um pedacinho do laço que nos une se desmanchou essa tarde.
Hoje, aos dezessete anos, sou proprietária de uma das mansões mais conhecidas do país, a herança do meu avô, o lugar onde eu deveria trazer meus filhos no futuro, para passar o Natal e todas as festas, o ninho da nossa família, o lugar que eu deveria chamar de lar.
Ainda com os olhos fechados, me sentindo pequenininha, quase invisível, insignificante, aperto o punho em meu estômago enquanto me obrigo a responder.
— Sim mamãe, estive.
A minha voz sua tranquila, suave, delicada, como a voz de uma Fontanelle deve ser.
— Graças a Deus, eu estava tão ansiosa.
Ela diz parecendo aliviada por finalmente se livrar desse estorvo. Só não sei de qual deles.
Nenhum como você está? Estou com saudades, está se alimentando?
Nada.
— Deus tudo certo, já estou com toda a documentação.
— Quero que guarde no cofre que fica no meu escritório, você se lembra da senha?
— Sim mamãe.
— Parfait!
Ouço vozes ao fundo, como se ela estivesse saindo do lugar privado onde esteve conversando comigo e voltando para sua vida real.
— Mon Petit, preciso desligar, mês que vem estarei aí e sairemos para comemorar, pode ser o restaurante que você escolher.
— Claro mamãe, como quiser.
As vozes aumentam, levando-a para longe de mim.
— Estou com saudades. — Sussurro.
Ela já não está me ouve mais.***
A música alta explode nas caixas de som, a batida frenética, com uma letra alegre que fala de uma garota triste em busca de companhia.
Poderia ser eu.
Olho em volta ainda sentindo minha garganta ferida arranhar e meu estomago vazio protestar, a grande maioria das pessoas aqui não me conhecem, nem poderia, o Refúgio dos Sonhos é exatamente o lugar para ir onde se quer ser esquecido.
Assim como eu.
Assim como o garoto esquisito, solitário e observador do outro lado do pátio, é fácil perde-lo de vista, por baixo dos seus cabelos desgrenhados, de suas tatuagens e piercings, só a ponta do baseado iluminando a grande e Sombria figura que é Dominic Calazans.
Nossos olhos se encontram por um segundo antes de desviar, não quero conversar, muito embora tenho certeza de que ele também não quer, estou aqui para outra coisa, estou aqui para esquecer quem sou, para ser a garota que todos conhecem, fácil, destemido, suja, imoral...
Estou aqui para comemorar minha solidão.
Arrumo o top e olho em volta, estou a procura de um alvo, algo que possa me fazer esquecer tudo por algumas horas, que me deixe leve, zonza, feliz, mesmo que seja uma felicidade industrializada, que na manhã seguinte vai cobrar um preço alto, uma que me machuque, me diminua, que me faça sentir exatamente como sou.
Um nada.
Passo entre um grupo de garotos altos e fortes, sinto o cheiro de perfume popular, de feno e grama, provavelmente trabalhadores das fazendas vizinhas, filhos pobres de Monte Mancante, que vem aqui para se divertir, beber até esquecer que são eles que abastecem o luxo da cidade.
O que eles não sabem, é que sou tão invisível quanto eles.
Esbarro em um deles, o mais alto, ele diz algo, enquanto sua mão escorrega por minha cintura, fecho os olhos ignorando a primeira reação ao toque de um desconhecido, aguardo até que meu coração se acalma, sorrio quando sinto sua boca em meu pescoço e olho para seu amigo, seus olhos brilham em expectativa quando o encorajo a se aproximar de nós meio tímido, um caipira que nunca tocou uma garota tão rica, sem saber que provavelmente nunca tocou alguém tão suja.
O grandão faz a proposta, ele é ousado e gosto disso, seu amigo vai precisar de alguém que o encoraje. Sinto suas mãos grandes e calejadas em meu corpo enquanto minha boca se aproxima da boca do seu amigo.
E nesse momento ele surge em meus pensamentos, ameaçando minha noite com sua doçura e seus olhos da cor do céu cansados, me observando, horrorizado, magoado, triste...
Me pergunto como pode alguém tão bom se apaixonar por algo tão feio?
E como em um sonho, a medida que os rapazes se soltam, me tocando e falando coisas imundas, ele se afasta de mim, uma lembrança real de que não importa o quanto ele tente se aproximar, eu nunca poderei ser digna dele.
Não eu, a garota que ninguém quis, a descartada, a suja, a pervertida, usada.
E meu coração dói.
Ainda estamos no pátio, cercados por pessoas de todos os lados, uma garota devassa, quebrada , sendo beijada por dois rapazes, ainda posso sentir o peso de um par de olhos sombrios que me observa nas sombras da noite, mas não me importo, ele não vai me julgar porque cada um de nós dois sabe a forma perfeita para se machucar e eu sei, que antes do dia nascer, estaremos os dois, de volta a nossa bolha perfeita, usados, machucados, sangrando na pele e na alma, fingindo ser aquilo que a sociedade espera de nós.***********************************
Ahhhh minha menina... minha pobre menina rica.
A cada capítulo um pedaço de Cindy se abre para nós, nos mostrando todas as suas feridas.
E eu só quero cuidar dela, dizer que ela não está sozinha, que nesse momento tem um montão de gente que a ama, assim como o bondoso garoto dos olhos da cor do céu.Então vamos deixar muito amor para Cindy e mostrar a ela que ela é sim importante.
Comentem muito para a gente se ver quarta feira.
Bjos!
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IVAN (capa provisória)
RomanceCabelos perfeitos, roupas de grife, festas, música, dinheiro, poder... É fácil esconder quem você é de verdade, basta colocar um sorriso no rosto e fingir que está tudo bem, ninguém quer saber o que existe atrás de um belo sorriso, ao menos não a m...