MADDEN, manjiro sano

04. Não consigo parar de pensar nele.

Não consegui dormir direito ontem à noite.

Os lábios fantasmas de Mikey insistiram em ficar comigo, o sabor da pequena euforia não me deixou em paz. Grudou, como uma praga silenciosa. Desde quando eu faço uma coisa tão imprudente como essa? O encontro com ele girou uma pequena chave dentro da minha cabeça. Eu gostei. Com apenas alguns sorrisos, uma moto e um beijo, ele foi capaz de parasitar na minha mente. Essa sensação... Porém tanto faz..., não o verei mais.

Hoje é outro dia.

As garotas que foram comigo para kabukicho interrogaram o meu sumiço repentino. Expliquei que a culpa era só minha, já que me perdi sozinha na multidão. Apesar disso, não contei sobre minha aventura imprudente com dois delinquentes. Parando para pensar mais atentamente agora, aqueles dois não eram estranhos. Se eu fosse uma garota da vida noturna — como minhas colegas —, com certeza saberia mais a respeito. Haruka, Sasa e Akame devem dominar o assunto muito melhor do que eu, pois os delinquentes são a atração principal de shibuya.

Estamos no intervalo. Estou sentada com elas enquanto como um sanduíche natural que fiz hoje pela manhã. As três conversam animadamente, falam sobre a matéria de japonês, festas em shibuya e garotos.

— Vamos para Roppongi hoje? — pergunta Haruka, animada.

— Fazer o quê? — responde Akame, com outra pergunta.

— Eu quero ver os irmãos Haitani!

Não faço a mínima ideia de quem são, porém julgo serem subcelebridades ou delinquentes. Tem muitos desse tipo em Tokyo.

— Você vem, Inoue? — pergunta Sayu.

— Acho que já me meti em encrenca demais ontem. Não quero causar mais problemas.

Haruka deixa a caixinha de leite de lado para olhar para mim.

— Mas eu quero chegar no bairro com uma garota bonita do lado!

— Você é bonita, Haruka.

— Não como você.

Como eu? Ah, é verdade. As pessoas sempre estão me dizendo isso. Estranhos, colegas, senhorinhas, garotos. Só que Haruka é uma garota bonita, os olhos castanhos e o cabelo laranja certamente se destacam das demais. Akame é ruiva e convicta, Sasa é loira e fofa. A minha aparência se torna frívola ao lado delas — cabelos negros como carvão e olhos azuis. Será que  essas características são exatamente o que me tornam tão bonita?

— Todos os garotos te querem, porque você tem um rosto lindo e pernas longas. Não faria mal algum você andar mais com a gente, sabe. Pode fazer esse favor? — Haruka pressiona as duas palmas e faz um biquinho.

— Eu- —Quando estou prestes a responder, ouço gritos vindos do pátio.

Nós quatro olhamos pela janela, mas a comoção parece vir do outro lado do colégio, na entrada.

— O que é isso? — Sasa pergunta, aflita, quando vemos pessoas de outras salas correndo pelo corredor em direção à saída do bloco.

Ficamos ainda alguns segundos olhando para a porta da sala, tentando entender o que está acontecendo, mas percebemos que algo não está certo quando, de repente, os garotos e garotas começam a ir para fora do recinto também.

Vamos para corredor quando Haruka toma a frente para conseguir descobrir o que está havendo. Os garotos segundanistas e terceiranistas estão trotando em direção ao pátio, todos com caras nada boas. Algumas garotas também correm atrás, outras até esbarram em mim e em Sasa, apressadas, parecem desesperadas para ver algo. Alguns alunos estão agitados, murmurando preocupados, e algumas meninas estão vibrando entre si.