Velhos hábitos, novos mistérios

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"E quando o frio beijar minha face não te assombre,

E quando a folha perdida no chão voar, não se iluda.

O frio é o toque sutil daqueles que se foram,

E do fundo do peito agora minha dor é muda."

Trinity Church Cemetery – Manhattan, dia 29 de Outubro

O vento frio de Outubro começava a varrer as folhas esquecidas no chão pelo coveiro, um erro provavelmente não visto pelo homem já que Trinity era um Cemitério muito bem cuidado, por mais belo que aquele lugar fosse com seus carvalhos imponentes, olmos com grandes troncos, galhos dançantes e grandes mausoléus antigos ainda sim, Sarah podia sentir o peso que cada lápide transmitia ali. O inverno estava se aproximando, e com ele o Natal e suas lembranças de um tempo bom, de um tempo em que sua vida podia ser considerada normal. Claro que nem sempre pode considerar sua vida como "normal" mais era isso o que vivia nos últimos 10 anos. Pela primeira vez em tanto tempo se sentiu sozinha de verdade, não que a partida de sua mãe para viver uma vida de aventuras não tenha doido, mais ao menos ela sabia que Rachel estava viva em algum lugar de Las Vegas sendo dançarina em uma boate ou talvez uma prostituta, isso ela não saberia dizer. Enxugou as lágrimas acumuladas nos cantos dos olhos, lagrimas que estavam caindo á muito tempo, mais de uma semana na verdade, isso a estava matando, mas ela rezou tanto por um milagre que agora parecia totalmente sem chão ou sem motivos para continuar.

"-O senhor é meu pastor e nada me faltará!" - Essas foram as primeiras palavras do Padre, o senhor Wilson, um homem bom, mas que com toda a certeza não estava sendo muito convincente ali, porque muito havia se perdido e tudo parecia faltar.

-Vai ficar tudo bem Sarah, eu sei que tudo será resolvido, não se sinta mal. – As palavras de Jane deveriam servir de consolo, mas quando Sarah olhou mais uma vez o caixão prestes a ser colocado naquela cova escura sentiu raiva daquela piedade toda, Jane era sua melhor amiga, as duas haviam feito muitos planos para o último ano escolar que estava por vir e agora tudo parecia distante e idiota comparado com seu pai morto.

-Foi só um acidente, o cara do caminhão também não teve culpa, o freio apenas falhou. - Annie não queria que a amiga desperta-se o ódio dentro de si, ela era cheia de pensamentos zen e coisas hippies e tinha medo que aquela aura de raiva e rancor destruísse os chakras da jovem, mais Sarah entendia isso, entendia que o ódio só iria afundar a si mesma, no entanto ela não conseguia tirar a ideia de esfaquear o homem responsável por tudo aquilo.

-Obrigada meninas, vocês estão sendo muito importantes para mim, mas eu preciso muito ficar sozinha. - Sarah viu os amigos do pai ajudarem a descer o caixão com o auxílio de cordas, por fim, tudo parecia acabado, ela andou lentamente até chegar o mais próximo que pode, ela não chorava mais, já tinha derramado lagrimas suficientes na última semana acompanhando todo o trabalho dos médicos para trazer seu pai de volta do coma. Traumatismo craniano, na opinião dela, coisas de filme, numa imaginou que aquilo podia acontecer com ele, mas ela estava ali, de pé, ao lado da lápide.

-Adeus. – Ela não queria se despedir, ela não queria fazer nada daquilo, mais não tinha escolha, nos próximos dias haveria uma grande confusão sobre bens, casas, a sociedade de seu pai com o escritório no Queens, tudo iria ser resolvido por John Miller, o melhor amigo de seu pai e a segunda pessoa em quem mais confiava, sabia que podia contar com ele de verdade, mas agora precisava ficar sozinha. Em um canto do lado Oeste ela viu uma criança usando um vestido branco de batizado, por um segundo ela se sentiu tonta e cansada, e no momento seguinte não havia ninguém lá. Está acontecendo novamente, pensou, aquilo a perseguia desde sua infância, era obvio que agora com sua resistência tão baixa e sua energia tão fraca que as visões voltassem com força, talvez fosse necessário procurar seu médico para uma nova onda de calmantes e antidepressivos.

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