Fazia exatamente 1 semana desde que se mudara de forma repentina para aquele apartamento. Novo endereço, novo prédio, vida nova. Era isso que pensava. Era isso que no fundo, desejava, mas nem tudo sai como montamos em nossas mentes, um cenário perfeito que não passava de mera ficção. Uma forma deveras "saudável" de escapar um pouco da realidade confusa e estranha.
Ainda assim, nem tudo estava perdido. Quase 1 mês sem aqueles pesadelos tão vívidos e nítidos que a deixavam noites sem pregar os olhos. Com medo das seguintes cenas, ou pior, continuação daquele horror interrompido. Ademais, 1 mês em que resolvera baixar a guarda, seguir o que seu terapeuta dizia e tentar ser menos paranoica. Estava se esforçando, tentando de verdade, mesmo sendo um grande obstáculo. Todos os dias eram desafiadores.
Essa noite em específico estava sendo deveras complicada. Não saberia dizer se a culpa recairia sobre os remédios que tomava, o fato de ter misturado eles com álcool ou ser tão estúpida e descuidada consigo mesma ao cometer tal ato mesmo sendo consciente que isso não era uma boa ideia. Na hora, não raciocinou direito, somente o fez.
Passava da 00:00 e seguia desperta, lúcida, em estado de vigília e alerta. Sem um pingo de sono. Encolhida no sofá da sala, buscava prestar atenção no noticiário da madrugada que soava na TV, mas aquela irritante inquietação pairava sobre si, como uma nuvem negra de uma grande tormenta prestes a vir. Mesmo que tentasse silenciar os pensamentos automáticos, pressentia mais e mais a sensação de ameaça e pânico se instalando e buscando apoderamento aos poucos.
Era verdade que, por mais que fazia pouco tempo desde que se mudara, estranhava o fato de sequer ter visto ou tido contato com algum vizinho ou morador daquele prédio. Somente com o zelador mas o mesmo fora tão frívolo e cortante que no primeiro e último contato a repelira de buscar travar relações e tentar causar uma boa impressão de si nos outros.
Ademais desse fato isolado, outra coisa curiosa era que as únicas movimentações que ouvia ou vez ou outra sentia em seu andar se davam pela madrugada. Pensar nisso sempre a deixava um pouco tensa e inquieta e, aquela sensação, de estar sendo vigiada ou observada aparecia.
Não. Não podia deixar esses pensamentos voltarem e a consumirem, assombrando ainda mais sua vida. Tratou de cobrir os ouvidos e aumentar o volume da TV. Mesmo se esforçando em mudar o foco, sentia que perdia mais e mais o controle sobre sua mente. Fechou os olhos e encolheu-se mais. Não conseguiria mais aguentar. Deixaria tudo desabar. Não queria perder essa guerra e permitir que aqueles pesadelos voltassem a predominar. Tinha que lutar e resistir mais...
E assim foi quando ouviu o som do elevador parando no andar que vivia, como um sinal, tirando-a totalmente daquele transe momentâneo que encontrava-se e recém voltando a sentir que recuperava aos poucos o controle de seus pensamentos.
A nuvem obscura que a sondara, agora lentamente afastava-se. Se concentrou em permanecer prestando atenção nos seguintes ruídos.
A porta do elevador se abriu de modo brusco, assim como das outras vezes, porém dessa em específico, chamou-lhe atenção um detalhe diferente que das outras vezes. Não conseguira captar os passos pesados e lentos, muito menos o barulho das chaves ficando cada vez mais fraco, até as aberturas das portas e fechamento violento das mesmas.
Aquilo não estava certo, tinha algo errado. Saia do normal, da rotina que estava acostumada a ouvir. Isso começara a causar uma certa angústia e aquela nuvem passageira, parava de se afastar e voltava a aproximar-se. Não devia. Queria ser forte, porém na realidade era uma fraca. Cedendo aos impulsos, rapidamente fora invadida por um aleatório instinto de sobrevivência, agarrando ligeiro o controle, mutou o som do noticiário.
Recém nesse momento, ouviu a porta do elevador sendo aberta da mesma forma de sempre, seguida dos passos lentos e pesados. Isso a fez levantar, como se acabara de receber um choque e descarga de adrenalina. Tratou de caminhar cuidadosamente rumo à porta de entrada.
Silenciosa, inconscientemente firmando o aperto dos dedos ao redor do controle da TV.
Os passos de fora, em vez de ficarem mais distantes, pareciam aproximar-se mais. Notou que prendia a respiração quando parou em frente à entrada. Os passos haviam cessado. Relaxou o aperto no controle e respirando fundo, puxou todo o ar que conseguira aguentar como forma de acalmar-se. Apoiou as mãos na madeira branca e lisa, em seguida, aproximou o rosto e espiou pelo olho mágico.Um grito alto e desesperado ficara preso em sua garganta ao observar uma figura alta e aparentemente mascarada, com boa parte do rosto oculto, em frente à sua porta encarando-a também. Nesse instante, o trinco começou a ser forçado, mexendo de forma bruta, numa tentativa agressiva de abrir.
Recuou rápido, soltando o controle que de encontro ao chão causou mais barulhos, fazendo-a perder o equilíbrio e cair sentada no chão. Sua voz não saia. Estava paralisada. O pânico se sobressaiu acima do instinto de sobrevivência.
Silêncio. O trinco havia parado de ser forçado.
Ia ficar tudo bem. Precisava respirar, recuperar um pouco da calma para raciocinar, poder mexer-se e correr em direção ao celular. Ligaria ou buscaria alguma ajuda, nem que precisasse gritar até sentir suas cordas vocais arderem. Esse era seu plano, até tenta-lo por em prática e sentir que o nó em sua garganta aumentava mais.
De forma inesperada, captou o som de chaves e em seguida, o encaixe das mesmas na fechadura. Recuou e se arrastou até sentir as costas baterem com força na parede. Com um "click" a porta havia cedido e sido destrancada. Seus olhos e pupilas já dilatadas e evidenciando o pânico que a consumia puderam captar a porta de maneira violenta e abrupta se abrindo.
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【Insomnia】(ブパ可)
Short Story" Escrevendo para aliviar o peso de palavras, sentimentos e coisas não ditas. Transformando ideias e pensamentos intrusivos em arte. Achando uma jeito de mostrar que existe uma forma rara de beleza no caos das ideias guardadas e algumas noites de in...