1 - Arrasta-me

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Acorrentado e de olhos vendados. Um som ensurdecedor da galopada. O vento insistindo em invadir o espaço traseiro da carruagem que o arrastava para sabe-se-lá aonde, essas eram todas as informações que Azak possuía, não tinha tantas lembranças de como viera parar ali, mas tinha quase certeza do porquê. O medo e o ódio se misturavam, dando lugar a uma nova emoção que ele não sabia descrever. Era o seu fim, imaginava, não havia motivos para que o deixassem vivo depois de amarrá-lo de todas as formas possíveis. O chacoalhar da carruagem durou por dias, ele os contou, sempre com intervá-los quando o sol estava no seu ponto mais alto, para logo em seguida continuar.

Somente quando a lua branca pairou no céu, fora que a carruagem parara definitivamente. Fraco e sem energia, ele fora arrancado de maneira turbulenta de onde estava, não tinha chance para falar e nem forças. As mãos, que ele supus pertencer aos seus raptores, não lhe permitiam ficar parado. O som dos passos mudou, ele notou, agora estavam pisando em pedras, não havia barulho, ninguém falava nada. O ambiente ao seu redor tomou novos ares, ele soube que estava em um castelo. Apenas o sangue real possuía tal arquitetura.

Após uma subida interminável, ele finalmente fora largado, ouviu a porta ser fechada e após alguns minutos, ser aberta novamente. O tecido que cobria o rosto havia sido retirado, as correntes deixadas na carruagem, embora pudesse sentir as mãos algemadas. A venda, no entanto, permanecia lá. Sentiu-se sendo despido, houve relutância de sua parte, mas não teve muito o que fazer. De repente, era água que tocava a superfície de sua pele, panos encharcados esfregavam seu corpo e alguns sussurros lhe eram capturados, vozes femininas, presumiu. Inicialmente se sentiu envergonhado, mas logo a vergonha transformou-se em preocupação, o estavam preparando para o que?

Após o banho, ele foi vestido novamente. As roupas que o tocavam eram diferentes, tinham um bom cheiro e eram calorosas. Ouviu os passos ficarem mais distantes e mais uma vez ele foi deixado sozinho. Com as mãos ainda algemadas, ele tentou puxar a venda, algo que só causou dor. Apenas desistiu, rolando pelo chão e suspirando. Demorou até que a porta fosse aberta uma segunda vez, até pensou em falar algo, mas já estava sendo levado de novo. A julgar pelo frio, enquanto passava por um lugar estreito, já era noite, um pouco depois da lua branca.

Os passos foram ficando cada vez mais altos, o eco ao redor informou que estavam em uma salão. Era agora, ele pensou. Assim que as mãos saíram de seu corpo, ele foi imediatamente ao chão, sem forças para ficar de pé.

— Tirem a venda – Uma voz jovem ecoou pelo salão quebrando o silêncio e calando os sussurros. A venda foi retirada com certa violência. Abriu os olhos lentamente, a luz, pela primeira vez em dias, finalmente lhe era filtrada. Observou o cenário, alguns homens velhos, alguns guardas, todos com cores semelhantes em alguma parte da vestimenta, e por fim, um jovem vestindo as cores da Primeira Casa. Todos o encaravam.

— O pulso, eu quero ver – Um dos guardas caminhou até ele, ergueu seu braço, afastou a manga da camisa e apontou na direção do jovem garoto, ele confirmou balançando a cabeça. Azak tinha uma cicatriz avermelhada, algo que todos os membros do seu clã ganhavam ao nascimento. Suas suspeitas se confirmaram, era por isso que estava ali de fato, mas então por que não o mataram de uma vez?

— Qual é o seu nome? – O bem vestido perguntou, tinha um ar de imponência, mas nunca parecia bravo, não era como se fosse tirar sua vida.

— Azak – Disse baixinho, o fato de não falar por dias tinha o afetado. Azak passou a língua nos lábios ressecados, visivelmente desidratado e tossiu. Todos ao redor ainda mantinham sua visão concentrada, as vestimentas nobres não tornavam sua aparência melhor, ainda estava abatido.

— Levem-no de volta ao quarto, deem comida e água, ele é nosso convidado agora – As palavras lhe soaram confusas. Azak acreditou ser a tontura causada pela sede e que tinha entendido errado, na verdade. O medo não esvaiu-se, não deixou de acreditar que ainda poderia ser morto a qualquer momento, no entanto, quando fora levado de volta ao seu quarto e recebeu sua primeira refeição em dias — já havia perdido a contagem das semanas sem comer —, respirou fundo o cheiro que encheu a boca d'água e atacou o prato a frente, sem muito se importar com a presença do guarda, o olhando sempre com olhar de desprezo.

Crônicas TempestuosasOnde histórias criam vida. Descubra agora