Crônicas Tempestuosas

2 - Príncipe das Correntes

Inohuro e Ihoruky eram os príncipes gêmeos da Segunda Casa, que servia como um segundo plano caso a Primeira Casa perdesse seu herdeiro, o atual príncipe. Embora fossem potenciais sucessores ao trono, não permaneciam em estadia no Castelo de Edlen, mas seriam os convidados desta noite. Foi o que Azak descobriu quando obteve acesso às bibliotecas do castelo, ouviu a notícia de um grande jantar e, durante seu café da manhã, descobriu os nomes dos convidados por cochichos de outros enquanto estava na cozinha. Isso logo depois de ser arrastado por um guarda assim que amanhecera. Não estava ali para desfrutar dos prazeres de se viver em um grande castelo, estava ali para servir.

Por isso lhe foi concedido acesso às bibliotecas e através de um livro sobre as linhagens reais, descobriu o que tinha para descobrir sobre os gêmeos. Estava nervoso, havia um único homem lhe fazendo companhia na sala, não um guarda, um homem velho e estudioso, a quem era encarregado de cuidar dos livros mais importantes para que outros como Azak nem chegassem a vê-los. Mas não era isso que causava o nervosismo, não entendia como conseguiria sustentar a mentira por tanto tempo até encontrar uma brecha que possibilitasse a sua fuga.

O homem do outro lado da sala notou os olhares assustados do jovem garoto, sempre interrompendo a leitura para lhe encarar. Azak mudou a direção do foco assim que soube dessa informação, mas já era tarde. Agora o homem velho caminhava até ele, em uma velocidade um tanto quanto questionável para um idoso. Coçou A garganta quando parou a sua frente, Azak custou a prestar atenção. Atrás do velho de pé, tinham algumas prateleiras empoeiradas e livros que ninguém lia há um bom tempo. Pigarreou uma segunda vez e agora Azak não teve mais desculpas para não o olhar.

— Há algo de errado? - Perguntou calmo o jovem.

— Meu conhecimento sobre o Sangue Mágico não é tão vasto quanto meus anos podem aparentar, mas tenho certeza que nenhum livro sobre as raizes de Unvelchia lhe ensinará o Conjuro das Curas – Então já estava a par de tudo, concluiu Azak. Fechou o livro aberto na página sobre os gêmeos.

— Eu... queria saber onde estava, antes de me preparar – Não era uma mentira, mas não era uma verdade completa também. Enrugou a testa, o homem velho.

— Quando começou a ter contato com estudo de seu clã, meu jovem? – Já desconfiava, quando resolveu acrescentar mais ao interrogatório.

— Muito cedo, por isso me escapam algumas memórias – Respondeu rápido, graças ao seu nervosismo. Mais que depressa desviou o olhar outra vez. O velho afastou-se e caminhou por entre as prateleiras velhas procurando por algo, deu uma volta por uma, retornou para conferir se tinha deixado passar algo e logo voltou ao encontro do jovem com um livro robusto em mãos, também tinha bastante força, notou. O som do livro esparramado sob a mesa o fez ressaltar o quão mais pesado era do que parecia quando o velho carregava.

— Aí está, um pergaminho para suas lembranças – Sangue Herdeiro, dizia o título da capa esverdeada, quase perdendo o tom pela poeira e os tempos que passara intocada. Com a presença do homem velho, passou a folheá-lo, mas foi só quando o mais velho deixou seu espaço privado que prestou mais atenção. Dúvidas surgiam, mas sempre acompanhadas de respostas ligeiras, seu raciocínio era bem rápido, talvez devido a magia presente em seu corpo, ou a herança de sangue humano, uma vez que havia miscigenação no seu clã, mas isso não lhe era a questão mais preocupante. Sangue Herdeiro tinha o que se podia imaginar sobre todos os já extintos clãs, desde segredos a formas de conjuros que só o mais alto escalão conseguiu dominar, Azak não era um. Já se convencia. Com o olhar derrotado, encarou o velho mais uma vez, este que também prendia a visão no jovem. Parecia saber de algo ou melhor: parecia saber de tudo, era como se pudesse ler os pensamentos, mais que isso, previa seu futuro e aparentava já saber o que planejava. Não podia subestimá-lo.