Cap 17 - não era tão ruim

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O banquete se estendeu até altas horas. Durante todo o tempo, Qi Rong não deixou a taça de Lang Qianqiu esvaziar. No final da noite, ele já estava completamente bêbado e incapaz de voltar para casa no reino mortal, então eles decidiram pernoitar no palácio Tai Hua. Qi Rong se preparou para descer a avenida principal, apoiando um Lang Qianqiu semi-conciente, que estava mais adormecido que acordado, em seu ombro.  

"Eu não achei que você se sairia tão bem, quais dos feitiços você usou?" Hua Cheng o seguiu. 

"Nenhum, meu charme natural foi o suficiente." Ele se gabou, parando em seus passos para responder Hua Cheng. "Aliás, eu vou devolver seus livros em breve. Fora 'harmonia conjugal' eu nem cheguei a folhear os outros." 

"Parece que o 'senhor charmoso' é realmente cheio de truques! É uma pena que você não tenha usado esse seu talento antes, imagine o que você poderia ter conseguido." Hua Cheng zombou. 

"Tsk! Que tipo de homem se sentiria orgulhoso em se vender para os outros?!" Qi Rong clicou a língua. "Eu não estaria fazendo isso se tivesse outras opções." 

"Ora ora! Quem diria que esses dois se tornariam tão amigáveis um dia." Mu Qing se juntou ao pequeno grupo. "Eu pensei que seus ressentimentos nunca poderiam ser superados nesta vida." 

"O que está no passado, ficou no passado." Hua Cheng respondeu sem sinceridade. "Afinal, ele ainda é o cunhado mais novo."

"Você está falando sobre Chuva de Sangue ou sobre A-Qiu?" Qi Rong estava confuso. Ele tinha ressentimentos insuperáveis com muitas pessoas. Mu Qing sorriu com desdém, mas não respondeu. Em vez disso, ele comentou, "A última vez que eu os vi, vocês ainda estavam tentando matar um ao outro, mas agora parece que Sua Alteza Tai Hua e Qi Rong se tornaram realmente muito íntimos. Eu ainda estou em choque."

"Ah, então realmente é verdade que esses dois estão juntos?" Feng Xin também se aproximou deles. "É o fim dos tempos!"

"Vá se ferrar! Por que vocês não cuidam de suas próprias vidas?!" Qi Rong se sentiu irritado ao enfrentar tantas caras conhecidas ao mesmo tempo. Ele estava prestes a continuar xingando, mas Xie Lian chegou com Guzi o acompanhando e o grupo se dispersou. 

Eles ficaram num pátio isolado no palácio Tai Hua, reservado com alguns quartos especialmente para o descanso do Mestre. Qi Rong jogou Lang Qianqiu em um deles antes de ir colocar Guzi para dormir. Quando ele retornou, a cama estava vazia. Ele não se voltou quando sentiu a aproximaçao sorrateira por trás, apenas esperando os braços fortes daquela pessoa se enrolarem ao redor de seu corpo. 

"Peguei você!"

Qi Rong fechou os olhos ao sentir o hálito quente com cheiro de álcool soprar em seu pescoço. Porque havia muito fengshui no Reino Celestial, se eles fizessem ali, os resultados seriam ainda melhores. Com medo de que Lang Qianqiu não concordasse e com vergonha de pedir por isso diretamente, Qi Rong planejou embebedá-lo aquela noite e seduzi-lo. Se ele queria se livrar logo daquela situação, ele precisava se esforçar. Ele repetiu aquilo mil vezes em seu coração, tentando se convencer, mas sentindo a boca quente do homem deslizando por sua nuca e o corpo maciço lhe precionando, sua forte convicção desvaneceu por completo.

Lang Qianqiu o virou para si e o beijou na boca. Nenhum dos dois tinha muita habilidade, seus dentes bateram uns nos outros e rasparam seus lábios. Preso no abraço forte, Qi Rong foi empurrado para a cama. Eles esbarraram nos móveis pelo caminho antes de caírem juntos sobre as cobertas. 

Selvagem. Se havia alguma palavra pra definir o que Lang Qianqiu se tornava assim que entrava debaixo dos lençóis era precisamente esta: Selvagem. Ele tirava sua máscara de cavalheiro, abandonava seus maneirismos gentis e se tornava uma besta. Uma fera. 

Ele ocupou Qi Rong por mais da metade da noite, o preenchendo até o fundo com seu vigor rígido e assustador. Quando Qi Rong acordou na manhã seguinte, já não havia ninguém ao seu lado. Ele sentou. A vantagem de ser um fantasma era que quase não havia dor residual e mesmo as marcas de amor espalhadas por seu corpo só durariam mais algumas horas. Ele levantou, tomou banho e comeu alguns lanches que encontrou sobre a mesa antes de deixar o quarto. 

Lang Qianqiu estava no pátio lá fora, alimentando A-Bao com grandes porções de carne fresca. Qi Rong não pôde deixar de se perguntar do que era aquela carne e um arrepio lhe subiu a espinha. "Oh, você acordou?" Lang Qianqiu sorriu ao lhe notar. 

"Onde está Zi-er?" Qi Rong perguntou. 

"Eu o mandei na frente com Yuan Ying." Lang Qianqiu respondeu enquanto subia nas costas do tigre, ele então estendeu a mão e convidou. "Venha, vamos dar um passeio!" 

Qi Rong não aceitou, em vez disso, ele deu um passo atrás e fez uma careta. "Nem pensar! Eu não vou subir nesse bicho!" 

Lang Qianqiu riu alto e, em um impulso, o tigre saltou na direção de Qi Rong. Lang Qianqiu se inclinou e o capturou na curva de seu braço em um movimento, o puxando para cima de A-Bao com facilidade. Foi rápido demais para que Qi Rong pudesse reagir e quando ele deu por si, eles já corriam a toda velocidade em direção as montanhas. 

Havia, sim, algumas montanhas nos Céus que não se erguiam das nuvens como o resto das coisas. Na verdade, elas pertenciam ao mundo mortal, seus cumes imponentes atravessavam a névoa que dividia os reinos e servia de ponte entre eles. 

A-Bao cavalgou na neve, atravessando a camada de nuvens. O terreno íngreme e inseguro transformava-se em planícies sob a agilidade de seus pés. Não havia onde se segurar além de sua pelagem curta. Qi Rong sentia o vento forte chicotear seu rosto e uivar em seus ouvidos. Ele era forçado para trás, sendo obrigado a se reclinar sobre o peito de Lang Qianqiu. 

Eles correram, descendo meia montanha, até que Lang Qianqiu desse seu comando para A-Bao diminuir a velocidade. Eles pararam na beira de um precipício altíssimo. Dali era possível ver o cume de outras montanhas mais baixas e pequenos vestígios humanos do tamanho de formigueiros aqui e ali entre o denso tapete vermelho-alaranjado, pintado com as cores do outono, que cobria toda extensão até os limites do horizonte. 

"Eu gosto de vir por aqui sempre que subo para o Reino Celestial. Antigamente..." Lang Qianqiu apontou uma grande cidade ao longe. "Haviam muito menos deles." 

Qi Rong não disse nada, apenas admirou em silêncio aquela paisagem. Ele passou os últimos séculos se escondendo em buracos no chão como um rato. Como um sapo dentro de um poço, o pedaço de céu que ele conseguia ver era sempre tão pequeno. Mas nem mesmo na sua juventude, quando ele subia a montanha com seu primo, ele podia apreciar uma vista como aquela. Ele sempre foi muito pequeno. Sempre houve muitas costas na sua frente, bloqueando sua visão.

Ele sentiu um par de braços se fechando ao seu redor e com eles um sentimento caloroso o fazendo pensar, até... até que não era tão ruim.

...

The devil's love - QiuRongOnde histórias criam vida. Descubra agora