Cesar Cohen

61 7 0
                                    


    Estava correndo. Meu peito subia e descia, buscando por ar. Não sabia exatamente do que estava fugindo, mas sempre há alguma coisa do que fugir. Minhas pernas já estavam queimando de dor. Precisava parar, mas algo não deixava. Talvez a sensação de perigo que latejava em minha mente. A floresta era escura e me engolia conforme avançava.

    Estavam atrás de mim.

    De repente, tropecei em alguma coisa no chão. Pela escuridão do lugar, talvez eu não conseguisse reconhecer o que era, mas, assim que meus olhos seguiram para o que parecia ser uma raiz de árvore, não precisava de iluminação alguma para perceber o que era. Aquele lodo nojento estava começando a se enroscar em meu pé direito e subindo pelo tornozelo. O puxei com força e me arrastei para trás. O lodo se rompeu e afastou-se com um chiado horrível. Um chiado que ainda me atormentava.

    Me levantei, limpando a terra que havia grudado em minha calça, olhei em volta e percebi as árvores com um formato estranho. Formavam espirais.

    — Não. Esse lugar maldito, não.

    Tentei me virar na direção contrária, mas era pura escuridão. Não havia pra onde voltar. Então fui na direção do caminho para aquele lugar amaldiçoado. Uma luz forte invadiu meu campo de visão e estava completamente em chamas. Conseguia ouvir os gritos de agonia preenchendo minha mente e o calor do fogo me envolver. Era uma sensação de desprezo misturada com uma dor aguda em meu peito. Um nó se formou em minha garganta e comecei dar pequenos passos para trás.

    Não conseguia parar de olhar o fogo consumindo aquela floresta. Lágrimas se formaram em meus olhos por conta da fumaça e do fato do que ficou para trás. De quem precisou ficar para trás.

    Meu irmão. Meu parceiro.

    Querendo sair dessa agonia, forcei-me a virar para voltar de onde quer que eu tenha vindo. Porém, acabei trombando em alguma coisa na minha frente e caí para trás quando levantei a cabeça para encarar o que era. Alto, forte, com os cabelos grisalhos e aquela cicatriz cobrindo metade do rosto. Ele me encarava, sério.

    — Meu filho...

    — Não é real. Não pode ser... — lágrimas já desciam com força de meus olhos. Estava sem ar e uma brisa congelante afastou os fios de cabelo do meu rosto — Você se foi. Não está aqui.

    — Não? — suas mãos grandes agarraram meus ombros e me puxaram para cima, começando a apertá-los com força. — E, mesmo que eu não fosse, você ainda me rejeitaria. Como você sempre fez.

    Fechei meus olhos e desejei que isso acabasse logo. A dor em meus ombros latejava com força. Sentia que estava sendo esmagado pelas mãos do meu pai e pela culpa. Lembrei de quando ele me jogou por aquele portão, de como ele fazia todo mundo rir à sua volta, de todas as vezes que ele tentou se desculpar. Quando ele disse que me amava e morreu.

    — Por que, Cesar? Por que você nunca disse que me amava? Nem quando eu encarei a morte de frente você disse — ele apertava com mais força a cada palavra que saia de sua boca — ME RESPONDE.

    Fechei os olhos com mais força ainda. Só conseguia chorar. Impotente, apenas deixei que aquelas verdades me cortassem e me deixassem mais quebrado.

    — Vai me ignorar de novo, né? — ele dá uma risada sarcástica profunda — Isso é culpa sua. Tudo o que aconteceu, é porque você foi um covarde. O THIAGO, A SUA MÃE, EU, JOUI, LIZ, TODOS ELES SE FORAM E A CULPA É SUA! E você sabe disso.

    Então tudo ficou escuro.

    Um estrondo seguido de um clarão irrompeu o quarto e levantei rápido, procurando encher meus pulmões de ar novamente. Estava na minha cama. Tirei o lençol de cima de mim e corri para a varanda. As gotas de chuva caiam pesadas sob minha cabeça fazendo os fios de cabelo grudarem em meu rosto.

    Estava frio.

    Passei as mãos pelo meu cabelo enquanto respirava fundo. Depois me apoiei no parapeito e abaixei a cabeça, deixando mais uma lágrima solitária descer pelo meu rosto junto com as gotas congelantes.

    — Kaiser? — a voz do Joui surgiu atrás de mim e logo a sua mão pousou em meu ombro — Vai ficar tudo bem, eu to aqui. Sai da chuva.

    Levantei a cabeça para encará-lo. Parecia cansado, mas estava com um sorriso tímido em seu rosto. Ele apoia a sua mão na minha e aperta. Um calor me preenche junto com uma calma. Ele me abraça e vai me tirando da chuva, me levando para a sala do meu apartamento. Saio do abraço e vejo que uma poça se forma em meus pés. Estou ensopado, dou uma risadinha e me viro para Joui novamente. Um trovão estourou em meus ouvidos e encaro o suéter vermelho que estou segurando com força junto a mim. Olho para os lados.

    Sozinho.

    Eu estou sozinho.

Depois da chuvaOnde histórias criam vida. Descubra agora