HOJE, UMA menina nova chegou ao nosso orfanato. Iremos fazer algo diferente para comemorar. Vamos fazer um pequeno piquenique, as pessoas ainda estão terminando de se arrumar. E eu estou esperando aqui no salão, sozinha.
Apenas para passar o tempo, eu vou ao banheiro dar uma checada como eu estou. Ao chegar lá, me deparo com a parede, pichada com um desenho de borboleta, me pergunto se eles irão remover, está tão bonito. Caminho até o espelho: A primeira coisa que eu sempre reparo é o meu olho esquerdo, ele é cego, eu ainda me assusto as vezes quando eu o vejo. Mas tirando minha atenção ao olho, eu arrumo meu cabelo que estava bagunçado, ele não é muito grande, acaba sendo fácil de arrumar. Ajeito minha blusa preta, e saio do banheiro em direção ao salão.
Nesse pequeno tempo que fui ao banheiro, eu vejo Agatha e seu irmão logo a frente no salão. Os cabelos ruivos de Agatha estão mais brilhosos que o de costume, enquanto o cabelo de seu pequeno irmão, que tem o cabelo da mesma tonalidade que o dela, está sujo de terra. Eu chego até ela, e pergunto:
- Onde você estava? Não te vi o dia todo.
- Ah! Oi Glory. Eu... Eu estava somente brincando com o Angel, lá fora. – Voz dela é calma, isso ajuda a quietar as crianças. Queria ter este "dom"
Angel parece bem exausto. Ofegante.
Então, ela continua:
- Nós brincamos pra valer hoje, não é lindão? – Ela olha para Angel, esperando uma resposta. Ele fica calado, olhando diretamente para mim atrás das pernas da Agatha. Ele obviamente me teme, talvez eu seja estranha demais para ele.
- Então, você vai se arrumar ainda? – Pergunto, desviando o olhar do Angel.
- Não! Eu não me sujei, estou bonita. E o Angel também. – Ela olha para ele e solta um sorriso. – E também, iremos brincar mais por lá.
- Ah... Sim... Bem. – Nós ficamos em alguns segundos no silêncio, tenho assuntos para falar, mas não com Agatha - Eu vou ir sentar lá canto.
Caminho em direção ao banco, bem ao lado de um quadro com uma pintura abstrata.
Eu espero Agatha me seguir, mas o Angel insiste em ficar longe de mim.
Eu observo Agatha conversando com seu irmão, esperando os outros chegarem. Eu percebo uma marca no ombro esquerdo de Agatha, semelhante a um arranhão. Mas prefiro não pensar sobre isso.
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O tempo se passa, e vejo algumas pessoas chegando no salão. Dentre elas, eu vejo a menina nova. No momento em que olho para ela, eu percebo que ela já estava me encarando. Viro a minha cabeça rapidamente, finjo brincar com o cabelo e começo a balançar minha perna.
No meio da barulheira, eu escuto alguns passos indo na minha direção, olho para chão para ver se enxergo a sombra dela e acabo enxergando metade de suas pernas, ela já está mais perto do que eu pensava. Ela pega o banco do meu lado, coloca na minha frente e senta de um jeito desajeitado.
Nunca havia percebido na palidez dela, nem o quão grande o seu cabelo preto é. Percebo um sorriso, um tanto perverso na cara dela, e ela me pergunta:
- Qual seu nome?
A voz dela é meio intimidadora, não sei dizer.
- Glory. – Digo com receio.
- Meu nome é Isla. Prazer em te conhecer, gostei desse teu olho. – Ela estende a mão para mim. Eu evito olhar para sua cara, mas mesmo assim aperto sua mão.
No momento em que eu aperto, ela solta um sorriso ainda maior, e sussurra enquanto observa minha mão:
- Ah... É isso então.
Eu solto a minha do aperto com velocidade, e pergunto:
- Isso o que?! – Digo, encarando-a.
- Nada não. Só deixa isso de lado. Mas então, a quanto tempo você está aqui, no orfanato?
As pessoas costumam a estar mais tristes quando chegam aqui. Ela parece estar confortável, até demais.
- Estou aqui desde nasci. Por quê?
- Ah, sei lá. Quero saber sobre você. Você me parece ser interessante.
Eu não achei que ela seria tão direta assim. Não estou mais com vergonha dela, só quero que ela cale a boca. Mas não consigo não perguntar:
- Interessante? Por causa do meu olho?
- Também. Você é a pessoa mais única que tem por aqui.
- Obrigada... Eu acho. – Me distancio um pouco dela.
- Ah! Está vendo aquele menino? – Ela aponta para Elijah, um menino preguiçoso, com grandes olheiras. Nunca falei com ele. – Ele tem muita coisa a ver com você.
- Como você sabe? Você nem me conhece. E nem ele provavelmente.
- Sabendo. – Ela cochichou. – Mas bem, você tem raiva de alguém por aqui? Quer se vingar de alguém? É daquele menino?
- Por que eu iria querer?! Eu nem converso com ele! – Digo, tentando evitar a pergunta.
- Não sei, só me parece que sim. O que aconteceu com seus pais? – A cada pergunta ela parece mais empolgada.
- Não sei ao certo. – Eu murmuro, revirando os olhos.
- Você nasceu cega?
- Sim! – Grito.
- Gosta de fazer o que? – Ela se aproxima de mim.
Eu franzo minha sobrancelha e a encaro, vejo sua cara sorridente, saciando por uma resposta.
- Ah, sei lá! Nada! Você é curiosa, né? – Me distancio ainda mais dela.
- Sim, eu sou curiosa. – "Que cara de pau" eu penso - O que você faz no dia-a-dia?
Respiro profundamente e ignoro a sua pergunta. Por sorte, a nossa professora de canto nos interrompe:
- Gente vamos. Todos parecem estar aqui, sigam-me.
Ao ser interrompida, Isla para de sorrir, olha para professora, se levanta rapidamente e começa a caminhar.
Eu já estava ficando cansada de tantas perguntas. Eu não entendi o porquê dela me perguntar se eu quero me vingar de alguém. Por que alguém faria essa pergunta há uma pessoa que você acabou de conhecer? Não é como se eu fosse responder com um "Sim, claro", com a maior naturalidade.
Eu levanto e caminho em direção da porta.
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Aos olhos pertubadores
Mystery / ThrillerGlory é uma menina órfã que crê que está enlouquecendo - Mas será mesmo? Outras pessoas começam a vivenciar as paranoias dela, e coisas... sobrenaturais começam a acontecer de uma forma repentina. Ela e Lucy, sua melhor amiga, começam a investigar u...