Capítulo 3 - Os olhares

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(Esse capítulo contém cenas de violência!!!)

   NÃO FOI DIFÍCIL convencer Samuel a não falar para ninguém que nós fomos ao bosque, e em questão de alguns minutos, me deparo sozinha com Lucy no banheiro. Ela anda de um lado pro outro, falando sozinha, lembra que estou lá e me pergunta:

- O que foi AQUILO!?! - Ela berra e começa a morder os lábios, como de costume.

- Aquilo o que?? - Pergunto, já sabendo do que se trata.

- Aquilo, aquilo lá sabe?  Você ficou paralisada, e... e... Eu pude ouvi-la, mesmo calada, sabe?

- Como assim, Lucy? Isso não foi nada, eu só passei mal ao ver seu sangue - Minto, tentando fazê-la esquecer sobre tudo isso.

- Glory, eu ouvi você pela PORRA da minha mente! A minha mente Glory, eu ouvi seus pensamentos, mesmo depois do Samuel chegar - Ela parou, e virou para mim repentinamente - O que foi isso?

Eu escuto um estralo baixo do lado de fora do banheiro. Sinto um calafrio na espinha, e escuto passos em direção ao banheiro.

Vou em direção a porta devagar. A luz apaga, levo um susto, mas ainda há luz pela janela do banheiro. Lucy parece preocupada. Começo a sentir meu peito apertar, e escuto algumas vozes:

- Eu estou falando sério, a sua filha entrou no bosque junto com a Glory. A Lucy corre pe... Você sabe do...

 O som abafado faz com que seja inaudível. Chego mais perto:

- A minha filha tem uma ótima relação com ela, senhora. Ela sabe que não é permitido adentrar o bosque no nosso orfanato.

Abro o portão levemente e vejo Valente, mãe de Lucy, e nossa professora. Valente tem cabelos curtos tingido de branco, ela certamente é a mulher mais alta que já vi.

Ela nos nota de alguma forma, e rapidamente ordena:

- Lucy, vamos embora, tenho que ir ver sua irmã urgentemente. Ah, oi Glory. - Diz ela, séria até demais.

- Tá bem, mãe - Ela me encara com um ar de tristeza, sua curiosidade não foi saciada. - Tenho que ir, Glory.

Nos abraçamos, eu beijo levemente o pescoço dela e ela sorri. A vejo ir embora. Ela cheira a frutas vermelhas, mesmo suada...

Todos vão embora e me sinto sozinha, todos ainda estão lá fora brincando e eu aqui. Porém, eu gosto dessa solidão, suspiro e sussurro para mim:

- Estou sozinha de no- "PÁHH" - Pulo de susto, o estralo novamente, muito mais alto, achava que era das outras duas. Ele veio do corredor ao meu lado, ele é extenso e repleto de janelas. Há várias portas, todas fechadas menos uma, a do final. Está um breu, não vejo nada dentro daquela sala, principalmente de longe. - Mas que porra tá acon- "PÁHH" - Novamente o estralo, mas junto a isso, se abre um olho de dentro da sala. Meu coração bate alto, mais ninguém devia estar aqui, ele me encara, mas eu o encaro de volta. Começo a chorar sem perceber, minhas mãos tremem. Se abre mais um olho, bem acima da porta, sinto como se fosse morrer. Mais um, quase que no chão. Meus ouvidos apitam.

Saio correndo, e escuto sons de grito e passos, como se alguém tivesse correndo atrás de mim. Entro no banheiro, e me tranco:

- AHHHHHHHHH - Algo grita do lado de fora, não tem um som humano. Ele bate na porta, e continua gritando, eu berro também. Caio no chão de desespero, tampo meus ouvidos e choro ainda mais, grito por socorro, mas todos estão no piquenique:

- Glory? - Uma voz sai de trás da porta. Mas as batidas e gritos não param. - Glory?! - Nunca ouvi essa voz, "Que porra é essa?" penso.

De um segundo pro outro, os sons se cessam. Me levanto e quando olho para porta eu vejo Isla se aproximando.

- Glory você tá be... - Eu dou um soco em sua cara. - Caralho Glory, eu só tô tentando te ajudar!

Sento no chão e choro compulsivamente:

- Va-vai embora daqui... Isla. - Não consigo respirar direito

- Glory.

- O QUE FOI PO... - Sua mão encosta em minha testa, e minha visão escurece.

- Me desculpa, é para seu bem.

Sinto meu corpo... Leve.

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Abro meus olhos e me deparo em meu quarto, ele é bem decorado, pois a muitas crianças que divido com ele, pelúcias, desenhos e coisas do tipo. Vejo Samuel ao lado de minha cama. Minha cabeça dói, ele não notou que eu acordei ainda, eu o chamo:

- Samuel?

- Ah, oi Glory. Você está bem? - Samuel abre um leve sorriso, é difícil vê-lo sorrir. - Isla me disse que estava desmaiada no corredor.

- Eu estou com dor de cabeça, e... - Noto que não lembro de mais nada além da minha ida ao banheiro com Lucy, não lembro nem de sair de lá. - Não lembro de nada, na real.

- Humm... Te trouxe um copo de água e melancias, caso acordasse, sei que são suas favoritas. - Ele pega o copo e o prato em seu lado e espera eu sentar-me na cama. Então, eu me sento.

- Muito obrigada Sam, você é um amor, sabia? - Samuel sorri novamente, mas tenta disfarçar.

- Ah, que isso, não é nada - Diz, enquanto me entrega as melancias. - Você... Você também é um amor.

Escuto a porta abrir, atrás dela há Agatha. Ela nos observa com um sorriso fofo, está usando um vestido laranja, da cor de seus cabelos, ela me questiona:

- Glory, você está melhor? - Sua voz é serena, me conforta. - Se você quiser, posso te pegar alguns remédios.

- Não precisa Agatha.

- Tem certeza? - Ela me encara, com seus olhos angelicais, parece preocupada.

- Sério mesmo Agatha, só tenho dor de cabeça, deve ser fome. Tenho umas melancias que o Samuel me trouxe.

- Olha ele, todo galã, cuidando de sua amada! - Diz Agatha, rindo.

- Agatha, cala a boca. Você já causou demais com Angel no piquenique - É complicado dizer se Samuel está discutindo ou só brincando.

- Mas bem, qualquer coisa é só gritar meu nome. Vou pegar seus remédios, Glory. - Ela sai rapidamente.

- Eu disse que não quero, Agatha! - Ela escutou meu grito, mas não vai adiantar de nada mesmo.

Fico sozinha com Samuel novamente, que está me olhando comer, quase que tomando conta de mim. Ele me trata como filha, assim como Agatha trata as crianças como seus filhos. Um silêncio reside no quarto, mas é confortante de certo modo, mas é quebrado por Samuel:

- Olha Glory, não sei se Lucy é uma pessoa confiável - Ele cerra os lábios - Sei que gosta dela, mas ela te bota em constantes perigos e...

- Samuel, Lucy salvou minha vida, eu já te falei isso. Eu a amo, eu sei que ela meio maluca, você já me disse, agradeço a preocupação, mas eu não vou parar de falar com ela.

- Não é isso Glory, você devia parar de acreditar em tudo o que ela diz. - Ele eleva a voz

- Eu não acredito em tudo Sam, sei do que Lucy pode ser capaz, para de me tratar como se eu fosse uma criança. - Elevo o meu tom também

Ele logo se cala e suspira.

- Eu... Eu só me preocupo contigo, Glory. Você já passou demais em sua vida.

- Eu também me preocupo contigo Sam, mas não se envolva com Lucy, por favor.

- Ok...



Aos olhos pertubadoresOnde histórias criam vida. Descubra agora