Capítulo 6 - Milene e sua Parte da História

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    Milene respirou profundamente e sentou-se em uma das camas. Todos olharam para ela.

    - Quando todos ficaram sabendo de você, seu pai estava em uma missão, a qual não retornou. Seu nome era Taciano Nogekst. - contou ela - O seu pai de criação, Scott Masguines era um grande amigo de sua mãe que se ofereceu para assumir você como filha e criá-la.

    - Meu pai está morto? - perguntei, abalada.

    - Jennifer... - falou ela, com um olhar de pena.

    - Continue. - pedi eu, tentando esconder uma pontada de tristeza na voz.

    - Somos Nephilins, Caçadores de Sombras. Há muito tempo, um homem conhecido como Jonathan Caçador de Sombras invocou o Anjo Raziel e, pediu a ele uma forma de combater os demônios que a muito ameaçavam os humanos. O Anjo colocou seu sangue junto com o sangue humano em um cálice, o Cálice Mortal, e deu para Jonathan o beber. Foi assim que se criou a raça dos Caçadores de Sombras. As Runas, são essas marcas - falou, apontando algumas das mesmas marcas negras que estavam também em Peter, Jaqueline e Levi - elas nos protegem, nos dão força, nos curam. Após utilizadas, desbotam e o que fica são pequenas marcas brancas e finas. - e apontou para algumas cicatrizes - Elas são feitas em nós por uma estela, um instrumento essencial a qualquer Caçador de Sombras.

    - Meu coração é marcado por uma dessas runas, como isso é possível?

    Ela balançou a cabeça.

    - Ninguém nunca soube.

    Silêncio.

    - A última.

    - Última?

    - A última pergunta. - insisti - Se eu sou uma Nephilim, por que vivi como mundana até hoje?

    Ela engoliu em seco.

    - Assim que sua mãe ficou sabendo que algo havia dado errado na sua cerimônia, implorou à Clave que a deixasse viver como mundana, longe do alcance dos demônios e criaturas do submundo, pelo menos até uma determinada idade. Todos entendiam a gravidade do problema, mas não aceitaram muito bem a proposta. Muitas visitas dos nossos Irmãos do Silêncio e de feiticeiros experientes foram realizadas, mas assim mesmo não havia pista alguma. Concordaram então em lhe deixar como mundana até, no máximo, atingir 12 anos.

    "Mas sempre que tentávamos entrar em contato, havia uma interferência grave. Coisas ruins aconteciam. Esperamos, pois sabíamos que sua mãe lhe contaria verdade e que você viria até nós. Mas ela não contou."

    Milene parou de falar. Sabia que era o fim da explicação, mas sabia também que estava ocultando mais alguma coisa.

    - Minha mãe... O que aconteceu? - perguntei, olhando para minha mãe.

    Pude ver a resposta em seus olhos antes mesmo de ela abrir a boca para responder. Mas ela não respondeu. Não precisava. Eu já sabia.

    Minhas lágrimas queimaram como ácido em meus olhos, e saí correndo de lá. Corri pelo nada naquele lugar que eu mal conhecia. Subi escadas de dois em dois degraus. Quando acabei de subir, me deparei com uma brisa leve e gelada, e um céu escuro e brilhante. Senti o aroma salgado do mar junto ao vento. Desabei no chão e enterrei a cabeça no meu braço direito por um tempo.

    Ouvi o som de passos. Eu não queria ver ninguém, não queria falar com ninguém. Levantei lentamente o rosto, e percebi que a manga do meu casaco estava molhada por conta das lágrimas. Olhei para o escuro a minha frente. Com o canto dos olhos, vi uma figura indo na minha direção. Sentou-se ao meu lado, silencioso, com os olhos cinza brilhando no meio do preto da noite. Peter não falou nada, somente permaneceu em silêncio.

    Lembrei-me que quando minha mãe desmaiou, Peter ficou tenso quase instantaneamente. Ele sabia.

    Senti gosto de sangue na minha boca, mas meu coração não doeu de novo. Não daquele jeito. Se doesse, desejaria que me consumisse logo, que a dor me levasse de vez.

    Lembrei da imagem sorridente da minha mãe. Uma imagem que agora se tornaria somente uma lembrança, que um dia eu também esqueceria.

    "Pétalas brancas e suaves caiam lentamente. No centro, havia uma flor branca, e seu interior possuía uma Runa dourada gravada nele. A Runa de luto."

    Quando acordei, piscando para acostumar-me a pouca luminosidade, eu estava em quarto pequeno e com móveis de madeira. Ele estava completamente vazio, somente com a cama no meio daquele espaço. Como eu havia parado ali? Lembrava-me de estar no telhado, mas não de ter descido.     Então eu ainda estava no Instituto.

    Me levantei em um pulo e ignorei a tontura, indo para a porta. A abri e me encaminhei por um corredor com janelas de um lado, onde o sol o iluminava, e quartos do outro. Segui por ele. Havia detalhes no teto e nas paredes, e fiquei os admirando enquanto andava. Mal percebi quando alguém veio até mim. O Sol deixava os cabelos de Levi ainda mais claros, quase dourados. Os olhos porém, pareciam ficar mais escuros.

    - Jennifer... Como se sente? Melhor?

    Assenti.

    - Onde está Milene? - perguntei.

    - Não. Melhor evitar mais uma dose depressiva de notícias. - respondeu ele - Hum... Vem comigo, tem uma coisa que acho que irá achar interessante.

    - Interessante como? - perguntei, hesitando.

    Ele sorriu.

    - Calma, não vou te dar nenhum remédio para dor nem lhe fazer um iratize - ele pareceu considerar a hipótese - Se bem que poderíamos tentar... Tudo bem, venha.

    Eu o segui. Entramos em alguns corredores e chegamos a uma sala. Ele foi até uma mesa, onde estavam dispostos cinco do que pareciam varas transparentes.

    - Um demônio estava seguindo você, pelo que me contaram. Isso deve te ajudar. Claro, você ainda não teve o treinamento, mas até lá... Bem, só por precação. Isto é uma lâmina de Serafim, uma lâmina do Anjo. Serve para matar demônios. Para invocá-la, você só precisa lhe dar um nome. Um nome de um Anjo.

    - Raphael. - falei.

    - Raphael. - concordou Levi - Tente. - falou, se afastando.

    Segurei a vara, esticando o braço.

    - Raphael. - invoquei, e uma lâmina que parecia mais pura que gelo se ergueu. Era igual à de Peter, na vez que o conheci.

    - Ela mal chegou e você já a armou? - perguntou uma voz feminina vindo da porta.

    Era Jaqueline.

Coração MarcadoOnde histórias criam vida. Descubra agora