No portão, ela falou algumas palavras, mas eu não prestei atenção, estava admirando os detalhes, antigos e bonitos. Era uma estrutura gigantesca de madeira e pedra depois de uma estrada de cascalhos. Quando se abriu, admirei-me com o seu interior. Era como se estivesse em um sonho. Meus pensamentos ainda estavam na conversa que havia tido com Jaqueline. Tudo girava embaralhando-se na minha cabeça. Estava ainda mais confusa que antes. Aquilo não poderia ser real, tinha de estar sonhando.
Jaqueline seguiu por corredores. Eu a segui. Ela abriu uma porta e entrou, comigo logo atrás. Era uma biblioteca, a maior que eu já havia visto. Muitos e muitos livros.
- Trouxe a mundana. - falou Jaqueline.
Percebi que havia uma mulher vindo em nossa direção. Ela era loira, tinha olhos negros, e poderia ter de 35 a 40 anos, rugas de preocupação visíveis. Ela estava prestes a falar algo quando a porta se abriu novamente. Os cabelos pretos foram a primeira coisa que eu reconheci, os olhos em um tom acinzentado logo depois. Peter. Vestia a mesma roupa de quando o conhecera, mas desta vez estava com um casaco muito parecido daquele que usava naquele dia, mas não o mesmo. Ao me ver, ele pareceu surpreso. Abriu a boca para falar algo, mas foi a mulher que falou antes.
- Seu nome? - perguntou ela.
- Jennifer Masguines. - respondi após hesitar por um estante.
- Idade?
- Quinze anos, farei dezesseis daqui a algumas semanas. - normalmente eu nunca responderia a perguntas de estranhos, mas a coisa já havia se mostrado se tratar de algo sério.
- Mora com quem?
- Meus pais. - respondi - Lívia e Scott Masguines - completei ao perceber que ela se referia a informação completa.
Ela empalideceu.
- Você...
Mas foi interrompida por uma tosse frenética. Eu tossia. Coloquei a mão para cobrir a boca, e quando olhei para ela novamente, estava manchada. Manchada de sangue.
Tinha noção de estar sendo chamada, mas parecia distante. Algo doeu em mim. Percebi que estava de joelhos no chão, cabeça abaixada e com a mão na altura do coração. Era isso que doía. O meu coração. Não era uma dor figurada, era real, e não havia nada de superficial nela. Meus olhos estavam fechados com força. Então parou. De repente.
Abri os olhos e levantei a cabeça. Todos me olhavam, chocados. Aquela era a hora em que mais tive vontade de gritar. Estava cercada de estranhos. Jaqueline estava a minha frente, agachada. Quando levantei um pouco mais o olhar, percebi que a mulher loira ainda estava parada no lugar, muito pálida e de olhos arregalados. Peter estava ajoelhado ao meu lado, falando algo que eu não entendia.
Levantei-me tão rápido que senti uma tontura logo depois. Jaqueline e Peter fizeram o mesmo, mas não demonstraram qualquer sinal de tontura. Encarei firmemente a mulher.
- Você sabe o porquê de tudo isso, não sabe? - perguntei, cerrando os punhos ao perceber que tremia.
A mulher piscou e caminhou até uma mesa, a qual se apoiou.
- Não cabe a mim explicar.
- Meu coração doeu, literalmente! Eu tenho alguma doença grave? Fale logo!
A mulher respirou fundo.
- Por que não pergunta a sua mãe?
Aquilo realmente me pegou de surpresa. Afinal, se eu tinha alguma doença minha mãe deveria saber de algo. Mas por que ela nunca me falara nada?
- É isso que vou fazer. - falei, decidida - Como eu saio daqui?
- Mas ela não pode ir! - dessa vez foi Jaqueline quem falou - Havia um demônio seguindo ela!
- Eu vou com ela. - Peter argumentou.
Eu concordaria com qualquer coisa para sair de lá. Lágrimas ardiam no fundo dos meus olhos, mas eu não ousaria liberá-las. Eu tinha que ser forte, não poderia demonstrar fraqueza, principalmente na frente daquelas pessoas.
A mulher assentiu, aparentando estar cansada. E então, sem mais palavra alguma, segui Peter para fora da sala. Para fora daquele turbilhão de perguntas, que pareciam me seguir para onde quer que eu fosse.
Quando atravessei o portão para fora, quase relaxei um pouco. Era bom ver a rua pouco movimentada e familiar. Lembrei-me, com atraso que deveria ter ido avisar o pessoal na lanchonete antes de deixá-los esperando. Agora já era tarde demais para aquilo.
Comecei a andar, ciente de Peter a meu lado. Ele não tentou conversar. E eu também não falaria nada, ficaria envolta dos meus pensamentos, como um escudo para me manter o mais longe possível da realidade. Bem, isso era o que normalmente funcionaria, mas agora os pensamentos eram perturbadores demais. Quando cheguei à porta do prédio, me virei para Peter.
- Vou entrar também. - falou, antes de eu ao menos tivesse a chance de falar algo.
- Não, não vai.
- Me disseram...
- Primeiro que te falaram para vir comigo até minha casa. Pronto, já estamos aqui. Segundo que eu mal o conheço, não pode ficar se auto-convidando para a casa dos outros.
- Não ouviu o que Milene disse? - perguntou e percebi que estava se referindo a mulher loira - Terá de falar com a sua mãe se quiser respostas. Agora, se ela te escondeu algo durante tanto tempo, não acho que irá simplesmente te falar a verdade quando perguntar.
- E no que você acha que pode ajudar?
- Se isso tudo tem a ver com nós, então com certeza se eu ajudar ela vai contar tudo.
- E quem são vocês?
- Não vai adiantar de nada eu tentar explicar assim. Mas acho que deveria saber. Somos Nephilins, ou seja, Caçadores de Sombras. Matamos demônios e serem do submundo que, bem, saem da linha.
- Você tem razão, não adiantou nada.
- Aquilo que você viu na minha jaqueta antiga era sangue de demônio. E aquela espada é uma Lâmina de Serafim, uma lâmina do anjo.
- Você não espera mesmo que eu acredite nisso tudo, espera?
Dessa vez, foi ele quem respirou fundo.
- Não assim. Mesmo você tendo acabado de ver o Instituto, tudo isso ainda é muito para a sua mente mundana.
- Já disse que meu nome é Jennifer.
- Mas eu estava me referindo a sua mente. Não teria dado certo se eu tivesse falado...
- Vamos logo. - interrompi eu. Estava sendo complicado conversar com aquele garoto.
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Coração Marcado
Fanfic"Eu concordaria com qualquer coisa para sair de lá. Lágrimas ardiam no fundo dos meus olhos, mas eu não ousaria liberá-las. Eu tinha que ser forte, não poderia demonstrar fraqueza, principalmente na frente daquelas pessoas." - Coração Marcado E...