A exasperação, um dos sete pecados capitais, pecado este que infelizmente estendo a mão e o chamo para dançar como meu eterno par na valsa da vida. Agora que falei, nunca pensei na vida desta forma, como uma dança; passos, gestos e expressões ordenados num ritmo poético que culminam em beleza. Poético eu disse, sim poético! O que me recorda da poiesis , pois as artes são resultados da poiesis, e na dança, por ser efêmera, acaba parecendo inconveniente usá-la como comparação com a vida, talvez seja por isso que é dito a "esmo" que para entrarmos no ritmo devemos dançar conforme a música, ora, se é conforme algo, significa que um apoia-se no outro, eis aí o motivo de ser mais prudente usar a música para analogias a respeito da vida.
Muito bem, se a exasperação, isto é, a cólera é minha dança. Qual é a música que rege meu ritmo? A curiosidade? Não. A ansiedade? Não. O senso do ridículo? Sim! É isto, a mim o que mais fere, o que mais dói são os equívocos que vejo no mundo. Essa é a minha triste dominante: uma exasperação do senso do ridículo. E neste dia me deparo com a cabal demonstração prática que não podemos fugir disso, o senso do ridículo pode sufocar a caridade, cegar a razão e ensurdecer o espírito.
Esse é o tipo de coisa que leva os homens a não visitar os presos, não vestir os nus, não alimentar os famintos e não dar assistência aos doentes, e eu me incluo, sim, devido o transe que me tornou quase tão zumbi quanto todos, eu me incluo. Foi aí que a voz daquele que leva o meu sangue reverberou nos meus ouvidos até chegar ao meu espírito, ele estava doente, e eu não podia deixar de vê-lo. Na tentativa de despertar todos no recinto deste sono, eu bradei.
Como disse certo ordenado, Ele tinha a razão e tinha contra si os brados... E como os brados no Mundo podem tanto, bem é que bradem alguma vez os pregadores, bem é que gritem. Vi as lágrimas descerem dos olhos de nossa mãe e o semblante caído de meus irmãos, sim, eles acordaram. Ele estava doente por anos e somente agora estávamos o visitando.
Neste dia eu não vi Ela, aquela que tranquiliza meu coração, que agora se encontra tão pesado, aquela que um sorriso mexe com meu espírito, aquela que um abraço me faz esquecer por um breve momento qualquer tribulação.
Quero ir vê-la, não ir para casa, indo vê-la encontrarei risos, amor e carinho, em casa só me resta o bom e velho estresse de família, aquele do tipo que oscila dependendo da dança. Como sou um péssimo dançarino, caí, tropecei em meus pés nos desengonçados passos disformes e nada belos perante todo arranjo musical da vida.
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Diário de um Homem Comum
RomanceUm romance não tão comum descrevendo o dia a dia de um jovem carioca com um antigo amor de escola que está compromissada, suas reflexões, reminiscências e o conflito moral. Inspirado em Dom Casmurro de Machado de Assis e em Lições de Abismo de Gusta...