Aquele sonho foi especialmente perturbador.
O campus era lindo, a avenida principal era arborizada de fora a fora com cerejeiras, que no inverno perdem todas as suas folhas dando lugar a lindas flores rosas. Enquanto Laura procurava o auditório para a sua primeira aula algumas pétalas se soltavam das árvores e dançavam ao vento dando a ela, por um segundo, a sensação de que estava em algum outro lugar, como um déjà vu ou um sonho já esquecido.
Continuou apressada, chegaria atrasada como sempre. Dormiu mais que o normal e em seus pensamentos tentava suprimir a sensação de desconforto que estar sozinho em meio a pessoas desconhecidas podia causar. Geralmente era contrária a ideia de se encaixar, de ter que caber em um lugar limitado, de se reduzir a um ser completamente agradável e facilmente compreensível e de todas as coisas cansativas que a maioria das pessoas fazem para serem um pouco mais amadas. Mas acima de tudo, odiava fazer sala e achava as etiquetas sociais entediantes. Preferia ser vulgar como os anjos, que certamente não falam sobre o tempo ou perdem tempo com conversas superficiais.
Apesar dos seus pensamentos abstratos conseguirem transformar a timidez em independência, quando entrou atrasada na sala lotada e se deparou com mais de cem pessoas que por um momento perderam a atenção ao professor e olharam para ela, essas abstrações começaram a colapsar com a crescente ansiedade social que já corroía o seu coração, que como todos os outros, tem medo da rejeição.
Levou alguns instantes para achar um lugar e depois para contrabalancear as inseguranças com um pouco de orgulho, mas por fim respirou aliviada e decidiu se concentrar no que era mais importante.A sala era uma espécie de anfiteatro com escadas que iam até uma altura considerável, inteiramente lotada por pessoas de todos os tipos, estudantes que vinham dos mais distantes lugares e se amontoavam em repúblicas. Era o primeiro dia do resto das suas vidas e tudo o que tinham feito os levaram aquele tão esperado dia. Isso causava um misto de euforia e pavor generalizado, alguns tinham medo de como tudo parecia definitivo. Sabiam que era um daqueles passos que se dá na vida que determinam todo o seu futuro e para essas pessoas pairava no ar a pergunta, "fiz a escolha certa?". Afinal nas escolhas difíceis uma alternativa não é necessariamente melhor que a outra, algumas comparações simplesmente não são exatamente quantificáveis e a matemática é inútil. Mas existem seres singulares que nunca ficam á deriva em mares de possibilidades, criam as suas próprias razões quando a razão se esgota em si mesma num lugar onde não existe certo ou errado e abraçam as suas escolhas como quem constrói a própria identidade. Essas pessoas estavam apenas gratas pela miríade de acontecimentos que as tinham trazido até ali.
Sentada no fundo ao lado de uma garota de cabelo azul e assistindo a uma exposição de uma banca de professores aparentemente simpáticos e acessíveis teve uma breve sensação de acolhimento, como se estivesse em um ambiente tão ímpar, capaz de abrigar a sua peculiar estranheza. Ficou rapidamente encantada com o vídeo de apresentação da universidade e com todas as oportunidades que poderia ter. Tinha entrado em uma das melhores faculdades do país e ainda estava perplexa com o fato de ter passado na frente de tantos candidatos. Mas era inteligente, sempre tirava as melhores notas apesar de não se esforçar muito e naquele momento se questionou se realmente havia se empenhado o suficiente para estar ali. Sentiu uma certa vergonha e considerou se conseguiria aproveitar todas aquelas oportunidades ou se se entregaria a um niilismo nocivo, que de tempos em tempos tomava conta da sua vida. Então pensou: "isso é tudo o que eu sempre quis, não posso estragar isso".A apresentação acabou e os estudantes eufóricos e ávidos por conhecer o resto do campus formaram fila para sair. Já estava perto da porta quando alguém pisou no seu pé, olhou para trás e deu um sorriso amarelo bem sem graça quando o menino pediu desculpas. Seguiu seu caminho pensando que deveria ter dado um sorriso melhor, porque o dele era lindo.
Ficou perdia entre os muitos edifícios que eram intercalados por uma infinidade de lindos gramados completamente verdes. Cada um dos mais de 20 prédios e complexos possuía exuberantes jardins internos que davam uma sensação de completude entre a natureza e o conhecimento, como uma imagem exata do que é indissociável. Por sorte um grupo de veteranos a encontrou, levaram todos os calouros dispersos para um descampado perto da reitoria. Um do veteranos começou com um discurso de recepção:
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Hera x Zeus, o Caos e a Ordem
RomancePor que Hera continua casada com Zeus apesar de todas as traições? É uma pergunta natural, sendo as respostas frequentes: status, poder e obrigação, talvez até amor. Mas por que Zeus, o rei dos deuses, que sozinho já possui poder, status e liberdade...