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Uraraka sentia-se inquieta. Há poucos dias seu melhor amigo voltara a falar. Pensou que Deku-kun teria muito a dizer a ela, mas ele permanecia estranhamente calado. Era angustiante vê-lo assim, principalmente, porque agora seu silêncio era voluntário. Não combinava nem um pouco com ele, Deku-kun era alegre, entusiasmado e extremamente falante. Queria seu amigo de volta. Estava preocupada, ele não se abria mais com ela. Sabia tratar-se de problemas amorosos, apenas isso. Desejava tanto poder ajudá-lo. Dar conselhos, porém não conseguia com tão pouca informação.

No momento dividiam o banco do ônibus da escola. Ela tentou por diversas vezes puxar assunto, mas sem sucesso. Izuku permanecia encolhido num canto, monossilábico e deprimido. Acabou desistindo de mexer com ele, optando por deixá-lo quieto.

Estava praticamente pendurada no braço do assento, conversando animadamente com Tsu, que se sentava do lado oposto ao deles. Honestamente, não participava tão ativamente, assim, do diálogo. Limitava-se a balançar dinamicamente a cabeça, sorrindo e murmurando "Hã-hans", sempre que Tsu parecia dizer algo interessante. Sua amiga reclamava sobre o atraso dos jogos da liga regional de baseball, devido a uma reforma no estádio de Musufatu.

Não era culpa dela, Uraraka queria mesmo prestar atenção, só que não conseguia. Todos os seus sentidos pareciam querer focar apenas no garoto ao seu lado. Estava prestes a soltar o décimo "Hã-han" do dia, quando um barulho alto explodiu em seus ouvidos. Não sabia o que estava acontecendo, e impotente, sentiu o corpo ser bruscamente arremessado para frente. Girou no ar, chocando-se com força contra o teto do veículo. Teve sorte. Logo após receber o impacto, notou a ponta de seus dedos tocando na superfície fria, por reflexo ativou sua individualidade. Não percebeu a dor de imediato. Assumiu o controle do ônibus fazendo-o flutuar no ar. Em seguida, o pôs gentilmente no chão, evitando maiores danos a si mesma, e aos seus colegas.

Deitada, permaneceu encarando, o que um dia fora o teto do veículo, agora repleto de bancos e objetos pendurados. Notou a sua bolsa cor de rosa enroscada ali, também. Sentia-se tonta, sua visão estava duplicada, e ela não escutava nada além de um zumbido agudo, baixo e constante.

Ainda meio inerte, mexeu o pescoço, virando a cabeça para o lado esquerdo, seus olhos, enfim, focando. Demorou um tempo para processar a imagem de Ojiro, inconsciente, ao seu lado. Um filete espesso de sangue escorria pela boca do garoto. Uraraka sentiu o coração disparar, a adrenalina fluindo a milhão. Precisava levantar. Agora.

Izuku esfregou sua cabeça dolorida ao se levantar, ainda se sentindo meio zonzo. " Ugh. O que aconteceu?" Num minuto estava contemplando sua fossa, no seguinte, lutava para não se chocar contra o parabrisa do ônibus. Ele, de alguma forma, voou por cima dos assentos e acabou preso entre o banco do motorista e o volante, batendo a testa no painel de controle.

Sentiu seus olhos voltarem a focar, e lançou um olhar panorâmico apressado para os colegas, tentando compreender a situação. O ônibus estava de ponta-cabeça, havia cacos de vidro e fuligem espalhados por todos os lugares, um cheiro forte de gasolina impregnava nas narinas. Dos amigos que conseguiu avistar, a maioria possuía apenas ferimentos leves; todos conscientes. Suspirou sentindo-se aliviado.

Não durou muito.

Izuku entrou em pânico ao dar-se conta... onde estava o...? "Kacchan!" Procurou por ele sentindo a angústia esmagar seu peito. Não conseguia respirar mais. Ofegante, examinou o local novamente, prestando atenção em cada rosto. Era difícil por conta da fumaça negra espessa, que adentrava pelas janelas quebradas. Sentia o coração disparado, as pernas tremiam congeladas no lugar. Foram segundos aterradores.

Quis gritar. Quase o fez, mas não conseguiu. O mundo inteiro parou, quando seu olhar cruzou com os olhos cor de carmim, pela primeira vez em dias. Eles estavam bem ali, no fundo do ônibus, brilhando num vermelho-sangue intenso, realçados pela cortina preta que envolvia tudo. "Kacchan" de pé, analisava a situação também, estava ofegante, Izuku conseguia ver seu peito musculoso subir e descer rapidamente, a cada inspiração, sob o uniforme. Parecia estar tão desesperado quanto ele. Katsuki estava coberto de poeira escura, mas não possuía um ferimento sequer. "Ainda bem." Pensou o garoto, soltando todo o ar que prendia dentro de si, finalmente relaxando.

I love you, idiot.Onde histórias criam vida. Descubra agora