CAPÍTULO 7 - MORTE POR GÊNERO

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Estamos eu e soja.militei imóveis no alto na torre, rodeadas pelas estátuas que vigiam todos os lados da paisagem florestal. Nós duas olhamos para baixo, para o único corpo que restou dentre a destruição.

Olho para tudo e vejo nada, a vegetação encharcada se borra diante da desolação que me ronda. Contraio os lábios e fecho os olhos com força, para depois reabri-los e sentir as pálpebras se desgrudando das remela.

Aperto o parapeito de pedras e tento entender o que sinto.

Mas o esforço é em vão.

Fungo e olho para Soja, que está com as mãos nos bolsos da calça preta estilo Alerrander, a música de Czarina Dada, a mulher cantora russa e estopim do movimento dadaísta e gagueira nos jovens brancos e héteros que não conseguem terminar uma frase coerente sem gaguejar.

– Miga – pergunto num muxoxo–, que que achastes?

Soja pensa enquanto eu vejo sua sombra projetada na entrada do castelo, escondendo a água violenta que arrasta o corpo de Luiz rumo à ilha que não posso ver mas sinto que existe.

– Hummm – Soja não desvia o olhar da entrada, dessa vez mais atenta ao pensar no que dizer.

– Definitivamente divertido.

Não é Soja que responde, mas uma voz rascante, como se não usada há muito tempo. No milissegundo que meu cérebro demora para entender a ameaça e reagir com reflexos de proteção, ouço as teias se sacudirem na garganta de quem respondeu e as aranhas saírem do esconderijo perturbado.

Depois que meu sistema nervoso e o de Soja reagem ao que deveriam reagir, nós nos viramos e damos de cara com a gárgula que vimos logo que chegamos no castelo. Lá de baixo, a estátua parecia um animal agachado, espectral dentre a névoa que indefinia seu contorno corporal. Aqui de lado, vejo bem o corpo da gárgula, agora não mais um animal agachado mas sim uma bela moça loira de pé. A única coisa igual é o braço estendido para cima e a mãozinha com ossos salientes e dedos curvados para baixo, apontando as longas unhas verdes para o chão. No pulso, uma fina corda pende e é sacudida pela brisa noturna.

A pele da linda e jovem mulher é de pedra, mas parece frágil. Poderia ser de porcelana, mas não sei se porcelana é pedra e também não sei se porcelana pode ser algo macabro pois a pele é manchada por veias escuras ao longo de toda a pele exposta – o que diga-se de passagem é bastante: os braços e o colo do peito estão visíveis, assim como as partes superiores dos seios esmagados pelo espartilho preto com fivelas que deixa a cintura finíssima da garota em contraste com as longas pernas finas iniciadas numa calcinha preta brilhosa e finalizadas em um salto de 15 centímetros, e também contrasta com a bunda pequena e com o cabeção.

O rosto da moça é de drogada: olhos injetados e levemente vermelhos, olheiras grandes, sete metros de testa e um pouco calva.

Soja arqueja ao meu lado.

– Crackuda? – ela exclama.

– Shhhhiiiiuuu! – Eu dou uma cotovelada em minha amiga. Sussurro para ela quase gritando: – O certo é usuária de crack!

– Não, mulher – Soja fala alto. – Ela é crackuda mesmo!

– Se fosse assim eu teria que te chamar de pirocuda, né sua ninfeta do caralho.

– MAS MULHER – Soja fala como se fosse óbvio o que segue falando: – A moça é a Queen Pedras, a cantora! Os fãns chama ela de Crackuda, e o nome do fãndom é Crackudes!

Contraio os lábios e minha pálpebras direita treme com o esforço de entender a matemática básica.

Quando eu finalmente entendo tudo, alívio percorre meus pelos depilados e eu exclamo:

O Halloween de Bruna CardashianOnde histórias criam vida. Descubra agora