I - Cabelos brancos

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- Não acredito. Sério? - Arregalou os olhos sem sequer tirar seus dedos do teclado barulhento.

- Claro! Minhas fontes são confiáveis.

- E ele é tao feio né... - Retorceu o nariz, desprezando a imagem que havia surgido em sua mente.

- E te digo mais! Ela só fugiu com ele por dinheiro. - Balançou a cabeça em confirmação, confiante.

- Se bem que por essa eu já esperava, sempre soube que ela era meio cobra. Bom, sem querer julgar né, vai que no fim eles se amam mesmo... - O som de seu chiclete sendo mascado já era uma sinfonia conhecida no escritório.

- Mas ela deixou o filho! - Seu sussurro foi alto.

- Ah, não! Para! Agora eu fiquei besta mesmo. - Finalmente parou de digitar e olhou para a contadora de histórias ao seu lado. - Ouviu essa, So? - Virou-se bruscamente para a moça do seu outro lado, sedenta pela reação de sua colega ao ouvir o que tinha a contar.

- Hã? - Ela ergueu os olhos, suas olheiras estavam bem encobertas com maquiagem.

- A cobra da Karen fugiu com o Vitão, o da Luísa! Eu disse que isso ia acontecer e tá ai o resultado, largou até os filhos pra trás. - Seu rosto, enrugado pelo cansaço porém perfeitamente coberto por maquiagem, esbanjava uma confiança totalmente falsa.

- Ah, que loucura, Nataly. - Ás vezes Sophie não se importava em demonstrar pouco interesse, talvez fosse por isso que apenas a dupla de fofoqueiras sequer se dava ao trabalho de lhe dirigir a palavra, principalmente porque eram ignoradas com frequência.

A maior parte dos funcionários recusava a aproximação da dupla, justamente por medo de suas falácias mal intencionadas, mas Sophie não sofria do mesmo problema, na verdade não seria errado dizer que era imúne a este. Era chata, desinteressante. Sua vida era comum. Comum o suficiente para que nem mesmo as fofoqueiras mais podres da corporação quisessem falar sobre tal.

Ao contrário da maioria das histórias, Sophie não perdeu o emprego, ou a família, ou o namorado, tampouco era mal afortunada ou tinha problemas para se encaixar dentre as pessoas. Na verdade a garota tinha um bom trabalho, morava em um bairro residencial de classe média-alta e passava desapercebida. Em suma, ela era apenas mais uma engrenagem bem posicionada na máquina humana do planeta Terra.

6h57pm

Ela olhou o relógio na tela de seu computador. Estava chegando o fim do expediente, e, com ele, um pouco de paz. Sophie não era incomodada com frequência em seu posto, e a mulher não via problema quando isso acontecia, porém não negava que estar sozinha lhe deixava confortável.

- O Marcus organizou um Happy Hour no Pub da Rua Yesler, e eu pensei que pelo menos dessa vez você pudesse... - Sophie sentiu um toque de pena na voz de sua colega, nada que já não estivesse acostumada.

Deslizou seu assento para longe da mesa, apenas alguns centímetros, olhou para a mulher que a questionava e sorriu, interrompendo-a.

- Nataly, eu sei que você sempre me convida sem o pessoal saber. E tudo bem, eu sei que não sou uma presença marcante. - E, de fato, nunca a convidavam para as celebrações do setor, e não por desgostarem de sua presença, seus colegas apenas... A esqueciam, genuinamente.

Sua colega torceu o lábio, desconfortável, e respirou fundo, cruzando os braços.

- Tudo bem, So... Se mudar de ideia, sabe onde o Pub fica. - Ela sabia que Sophie não mudaria de ideia, e nem fazia muita questão de tentar convencê-la.

- Aham. Obrigada, de qualquer forma, Naty. - A mulher sorriu para sua colega e voltou a se aproximar do computador enquanto ouvia o som do salto fino de Nataly contra o carpete cinza escuro.

Seres de mente única. - A Rick Sanchez Fanfiction.Onde histórias criam vida. Descubra agora