Trauma

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Após 2 semanas que chegou em sua casa na Mansão Addams, Wandinha pôs-se pensativa, ao escutar na rádio uma música irritante que a recordou de Enid.

Em sua mente passava o flash da conversa que teve com ela, dias atrás, quando a menina loba disse que sentiria falta dos olhos vazios de Wandinha a fitando todo dia quando a mesma acordava.

Ela nem sempre foi fria, de poucos amigos. Já foi sim, alegre, aberta a tudo que se podia imaginar, e até capaz de chorar. Mas obviamente, seu coração sempre pertenceu a obscuridade. Uma coisa não anula a outra.

Ela lembrou da outra conversa que teve com Enid, a qual foi a única a saber o motivo do bloqueio emocional da gótica de tranças morenas, semblante vazio e coração frio como o gelo.

Era 1º de Novembro, faltando apenas 1 dia para a data comemorativa do Dia de Los Muertos, (celebrada pela parte da família que mora no México), a pequena Addams, de apenas 6 anos de idade, saltitando, levava seu bichinho de estimação, Nero o escorpião, para passear. Todo mundo sempre estranhava qualquer saída de qualquer membro da família ao sair na rua, e levando em conta o pré-conceito que as pessoas tem em relação ao que é diferente é óbvio que um ou outro acabava pensando em alguma maldade a fazê-los. Mas, naquele dia, no meio do passeio, um grupo de 4 crianças, andando de bicicleta, decidiram cometer uma atrocidade que marcaria a vida de Wandinha para sempre: 2 dos moleques seguraram-na para que ela pudesse assistir de camarote os outros 2 moleques dilacerarem o seu tão precioso animalzinho.

Ela gritou, esperneou, mas nenhum dos seus gritos fez efeito, eles já tinham passado com as rodas das bicicletas feito rolos compressores, esmagando-o brutalmente.

Wandinha decidiu que seria apropriado o funeral acontecer no dia seguinte. Com o que restava de Nero, fez uma cerimônia que ela julgou como ele sendo merecedor. Em sua lápide estava escrito a famosa frase de luto, “Descanse em paz”.
Enterrou ele com ternura e olhos chorosos e nariz escorrendo, seu pobre coração sombrio se partiu naquele dia. Mas ela sabia que aquilo não adiantaria de nada se não a aborrecer e destruir ainda mais. Daquele dia em diante tinha decidido: Ela iria se fechar para tudo e todo mundo. Já não iria mais chorar, não iria mais se permitir pensar em ter amizades ou sequer se apaixonar, não iria dar abertura nem mesmo para seus familiares. Decidiu tornar os bullys que naquele dia ela encontrou, mas com seu irmão. Passou a fazer todo tipo de crueldade com o caçula, desde tentativas de guilhotiná-lo até tentar fazê-lo beber cloro o enganando falando que era um drink especial - que ela ofereceu ao mesmo falando para não contar aos vossos pais porque “supostamente” era bebida -

Quando criança, o trauma favoreceu para que ela se tornasse uma garota casca grossa que se recusava a acreditar, confiar e demonstrar o mínimo de afeto possível para qualquer pessoa que seja. Quando pré-adolescente, isso teve um pouco o dedo dos hormônios que alteram as pessoas nessa fase da vida. Quando já adolescente, os hormônios contribuíram, e também, seus problemas de raiva sequelas do trauma sofrido, se tornaram piores. Somando tudo isso, o resultado foi fatal:

Só conseguiu fazer amizades reais agora que tinha 16 anos. E ainda assim não se abriu totalmente para essas coisas novas. Tinha medo. Medo da rejeição. Tanto medo que ela preferia rejeitar as pessoas primeiro.

Nisso, ela lembrou do melhor amigo que fez no colégio, Eugene. O menino, mais novo que Wandinha, sabia que a mesma o considerava de forma especial. O problema não era esse. Ela se sentia culpada por não ter dado a abertura necessária para que seus sentimentos viessem à tona e ela pudesse mostrar mais abertamente sua afeição pelo seu melhor amigo, o qual ela até considerava mais seu irmão mais novo do que ela considerava o Feioso (seu irmão mais novo biológico).

Pensando com seus botões, ela acabou lembrando que… Enid acabou despertando nela sentimentos que nunca antes tinha sentido: o calor do amor. Não, não amor de amizade. Não amor de família. Um amor, como… Como duas (ou mais) pessoas que se amam e querem cuidar uma da outra, construir uma vida, evoluir como pessoas e envelhecer juntas.

Minha namorada é uma gótica (Wenclair)Onde histórias criam vida. Descubra agora